Desde o advento da Lei de Arbitragem, muito se tem discutido acerca da sua relação com o Direito Falimentar e Recuperacional, especialmente no tocante à possibilidade de que a empresa em falência ou em recuperação judicial se submeta à arbitragem. Essa discussão é extremamente relevante para verificar se os esforços despendidos pelas partes, quando da negociação da cláusula prevendo a arbitragem como meio de solução de conflitos decorrentes do contrato por elas celebrado, poderão vir a ser desconsiderados em razão de uma das partes se submeter, mais tarde, a um processo concursal.
Aqueles que entendem inviável a participação de empresa nessas condições em procedimento arbitral citam como impeditivo, dentre outros, o fato de predominar na arbitragem a autonomia da vontade, enquanto o concurso de credores seria regido pelo interesse coletivo, em que o devedor perde, ou vê limitado, o direito de dispor de seus bens e direitos. Devido à especificidade do tema e ao fato de a utilização em larga escala da arbitragem ser relativamente recente, ainda são poucos os precedentes jurisprudenciais sobre a questão.
Os casos paradigmáticos envolveram as empresas Interclínicas e Technosson, o primeiro decidido pelo Superior Tribunal de Justiça e o segundo pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. No caso Interclínicas, julgado monocraticamente pela Min. Nancy Andrighi, a empresa estava em liquidação extrajudicial – uma modalidade de insolvência civil – e entendeu-se ser possível a sua participação em procedimento arbitral, porque, como dela participaria o liquidante, a arbitragem não teria o condão de afetar os interesses dos credores.
Além disso, a capacidade da empresa para optar pela arbitragem e a disponibilidade do Direito transacionado, requisitos de validade da cláusula arbitral, devem ser aferidos quando da contratação (e, em tal caso, se faziam presentes). Ademais, nessa etapa de conhecimento, haveria apenas a verificação da existência, ou não, de algum direito atribuível a alegado credor, e nenhuma disposição de bens ou de direito.
Em sentido oposto está a decisão no caso Technosson, em que se entendeu pelo prosseguimento da ação junto ao Poder Judiciário, porque os requisitos de validade da cláusula arbitral deveriam ser analisados “quando suscitado o cabimento da arbitragem e não ao tempo da contratação”, já que embutiria uma implícita condição suspensiva, que, neste caso, só teria se operado quando a empresa já era falida. A doutrina brasileira, reconhecendo a importância dessa discussão e a divergência entre as Cortes, já produziu opiniões contrárias ao acórdão paulista, valendo citar Donaldo Armelin, Maíra de Melo Vieira e Raphael Nehin Corrêa. Atualmente, aguarda-se o julgamento do recurso especial interposto, cuja decisão, espera-se, será essencial para o encaminhamento de uma definição sobre o tema.