Edição Especial - Março 2015
A ordem cronológica de julgamento nos tribunais (artigo 12 do NCPC)
De acordo com o artigo 12 do NCPC, os juízes e os tribunais deverão obedecer à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. O parágrafo primeiro do referido dispositivo legal determina, ainda, que a lista de processos aptos a julgamento deverá estar permanentemente à disposição para consulta pública em cartório e na rede mundial de computadores, em atendimento ao princípio da publicidade e da isonomia processual.
A despeito da preocupação do legislador com a isonomia processual, o paragráfo segundo do artigo tratado traz uma série de exceções à regra. Os julgadores não precisarão obedecer a ordem cronológica de julgamento nas hipóteses de (i) sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do pedido; (ii) julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos; (iii) julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas; (iv) decisões sem julgamento do mérito e de não conhecimento de recursos inadmissíveis e de não provimento de recursos contrários às Súmulas e entendimento firmado em resolução de demandas repetitivas; (v) julgamento de embargos de declaração; (vi) julgamento de agravo interno; (vii) preferências legais e metas estabelecidas pelo CNJ; (viii) processos criminais e (ix) causas que exijam urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada. Vale mencionar, ainda, que o processo que (i) tiver a sua sentença ou acórdão anulado ou (ii) nos casos de reexame do processo quando da publicação de acórdão paradigma, ocupará o primeiro lugar na lista mencionada anteriormente.
Honorários advocatícios na fase recursal (artigo 85, § 11, do NCPC)
Como parte dos esforços para agilizar o trâmite dos processos judiciais, o NCPC prevê a majoração dos honorários sucumbenciais quando da interposição de recursos. É o que a doutrina está a chamar de "honorários em cascata". Em suma, o NCPC determina que o tribunal, quando da apreciação de recursos, deverá majorar os honorários, levando em conta o esforço adicional do advogado para a atuação no tribunal. Com isso, o código pretende obstar a interposição desnecessária de recursos.
Cabe, contudo, a ressalva de que essa majoração deverá observar o limite imposto pelo artigo 85, §2º, NCPC (que tem redação semelhante à do artigo 20, § 3º, do CPC atualmente em vigor), segundo o qual os honorários deverão ser fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido, ou, então, do valor atualizado da causa. Por fim, deve-se lembrar que a majoração é passível de cumulação com as demais multas e sanções processuais previstas no código, como, por exemplo, a multa destinada ao litigante de má-fé (artigo 81, NCPC).
Desconsideração da personalidade jurídica (artigos 133-137 do NCPC)
Uma das principais inovações trazidas no NCPC é a expressa previsão de procedimento incidental destinado à desconsideração da personalidade jurídica. O instituto, até então previsto no Código Civil Brasileiro, no Código de Defesa do Consumidor e no Código Tributário Nacional, não possuía regras procedimentais para a sua aplicação, o que será suprido com o advento do NCPC, que estabelece procedimento pormenorizado para a apreciação do pedido. O novo diploma processual dispõe que o incidente poderá ser instaurado em qualquer fase processual, por iniciativa do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo, ou da própria parte, estando presentes os pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica. A citação do sócio, do terceiro ou da pessoa jurídica, até então dispensada pela jurisprudência majoritária do STJ, passou a ser obrigatória na nova sistemática processual, conferindo maior rigor e formalidade ao instituto. Essa alteração procedimental, no entanto, tem sofrido críticas por parte dos doutrinadores, que ponderam que a citação, por vezes morosa, não se coaduna com os princípios de celeridade e efetividade que nortearam a reforma do CPC.
Negócios processuais (artigos 190-192 do NCPC)
O NCPC inova no Processo Civil brasileiro ao permitir a flexibilização procedimental nos casos em que o processo estiver a tratar de direitos que admitam autocomposição – são os chamados negócios jurídico-processuais, em oposição aos negócios jurídicomateriais. Por meio deles, as partes poderão convencionar a distribuição do ônus da prova e demais poderes, faculdades e deveres processuais. No entanto, para que tal inovação não se converta em instrumento de dominação do litigante mais hábil ou economicamente mais forte sobre o menos favorecido, o juiz conserva a possibilidade de intervir e controlar a validade de tais convenções (art. 190, NCPC). O NCPC também faculta às partes fixar calendário para a prática dos atos processuais, que as vinculará (art. 191, NCPC). Sobre pelo menos um ponto, contudo, as partes não têm poder de disposição: o idioma em que os atos e termos do processo serão praticados, que continua a ser a língua portuguesa obrigatoriamente.
Contagem de prazos (artigos 219, 220, 1.003 e 1.023 do NCPC)
O NCPC traz novidades relevantes no que diz respeito à contagem de prazos. No CPC anterior, os prazos eram contados em dias corridos. O NCPC, contudo, estabelece que, para fins de contagem de prazos processuais, serão considerados apenas os dias úteis. A suspensão de prazos durante as festas de final de ano também foi objeto de importante alteração. Antes, o Tribunal de Justiça do respectivo Estado determinava a suspensão dos prazos por meio de resolução. Com a entrada em vigor do NCPC, a suspensão dos prazos do dia 20 de dezembro ao dia 20 de janeiro passa a ser matéria regulamentada pelo próprio Código. Por fim, inova o NCPC ao unificar o prazo para a interposição de recursos, com a exceção dos embargos de declaração. No CPC anterior, os prazos recursais eram previstos individualmente e diferentes para cada recurso. No NCPC, fica estabelecido o prazo de 15 dias para interposição e resposta a recursos e de 5 dias para a oposição de embargos declaratórios. Tutela de evidência (artigo 311 do NCPC)
Diferentemente do diploma atual, o NCPC introduz a chamada tutela de evidência, que vem disciplinada ao lado da tutela de urgência, formando, assim, um novo sistema para as tutelas provisórias. Na tutela de evidência não é necessária a demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, o que deverá colocar fim as diferentes interpretações que eram dadas ao inciso II do artigo 273 do CPC em vigor. Com isso, resta clara a permissão legal para a antecipação da tutela jurisdicional quando ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte, independentemente da existência de perigo. Além disso, o NCPC elenca as seguintes hipóteses de configuração da tutela de evidência: (i) quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e a tese for firmada em julgamentos de casos repetitivos ou súmula vinculante; (ii) quando há pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito legal ou convencional; e (iii) quando a petição inicial for instruída com prova documental irrefutável do direito alegado pelo autor e o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Com a introdução dessa nova sistemática, o NCPC amplia as modalidades utilizadas para concessão das tutelas provisórias, voltadas para a necessidade de conferir soluções mais céleres ao direito material discutido no litígio.
Conciliação e Mediação no ajuizamento da ação (artigo 334 do NCPC)
O NCPC pretende valorizar e fortalecer os mecanismos de autocomposição e pacificação das partes, mediante sistematização e priorização dos institutos da conciliação e da mediação. Em suma, a audiência de conciliação ou de mediação passa a anteceder a apresentação da defesa (art. 334), salvo se ambas as partes manifestarem expressamente desinteresse na composição amigável ou se o processo não admitir a autocomposição (art. 334, § 4º). Nesse contexto, a opção do autor pela realização ou não da audiência passa a ser requisito obrigatório da petição inicial (art. 319 e 334, § 5º) e, em contrapartida, o réu deve indicar o seu desinteresse na autocomposição em petição a ser apresentada em até dez dias antes da data da audiência. O não comparecimento injustificado do autor ou do réu passa a constituir ato atentatório à dignidade da justiça, sancionado com multa de até 2% da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa (art. 334, § 8º). Ademais, as partes passam a poder escolher, de comum acordo, o conciliador, mediador ou câmara privada de conciliação e de mediação que atuará no processo (art. 168).
Embora a iniciativa do legislador seja louvável, sua difusão no âmbito jurisdicional, sobretudo para os casos de maior complexidade, irá depender de dois fatores principais: (i) o comprometimento do Poder Judiciário na criação e aparelhamento dos centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição (art. 165); e (ii) o empenho do Conselho Nacional de Justiça e do Ministério da Justiça na regulação, credenciamento e fiscalização das entidades responsáveis pela capacitação dos conciliadores e mediadores (art. 167).
Incidente de substituição de parte (artigos 338 e 339 do NCPC)
O NCPC traz novidade interessante quando disciplina as consequências da alegação, pelo réu, em sede de contestação, de que seria parte ilegítima para figurar no processo. No CPC anterior, uma vez que o juiz acolhesse a alegação de ilegitimidade do réu, deveria extinguir o processo sem julgamento do mérito, levando, em muitos casos, a um enorme desperdício de tempo e de recursos. O NCPC estabelece que incumbe ao réu nessas hipóteses indicar o sujeito passivo correto, não bastando apenas a mera alegação de ilegitimidade, sob pena de arcar com as despesas processuais e com o pagamento de indenização ao autor pelos prejuízos que sejam decorrentes da sua omissão. Feita a indicação do terceiro pelo réu que figurou originalmente no processo, caberá ao autor aceitar ou não, podendo optar pela substituição do antigo réu pelo novo sujeito ou, ainda, podendo aceitar que ambos (réu originário e terceiro indicado) sejam incluídos no polo passivo. Com a introdução dessa nova sistemática, foi possível eliminar a antiga “nomeação à autoria”, instituto que já se mostrava ultrapassado e com pouca aplicabilidade prática.
Fundamentação das decisões judiciais (artigo 489 do NCPC)
O NCPC veio reforçar a garantia constitucional do dever de motivação das decisões judiciais (artigo 93, IX, da Constituição Federal), estendendo-a, expressamente, a todos os atos decisórios a serem emanados pelo Judiciário. No CPC anterior, o dever de fundamentação já era previsto (artigos 131, 273, §1º e 4º e 458, II), mas de uma maneira mais genérica e os fundamentos eram apontados como um requisito essencial. O NCPC, por sua vez, traz um rol de hipóteses, não exaustivo, em que as decisões poderão ser anuladas por ausência de fundamentação. Visa-se, com o novo texto legal, evitar que atos decisórios sejam padronizados e se limitem a utilizar fórmulas genéricas, em que a fundamentação é substituída pela mera menção ao artigo de lei ou indicação vaga de presença/ausência dos requisitos autorizadores para concessão de uma medida, sem que seja feita a devida relação com os fatos ou argumentos invocados pelas partes. Dessa maneira, o NCPC aponta para a necessidade de individualização das decisões e sua aproximação com o caso concreto, o que representa um avanço na realização do direito constitucional à fundamentação das decisões judiciais.
O início da fluência do prazo para pagamento da multa de 10% no cumprimento de sentença de pagar quantia (artigo 523 do NCPC)
No CPC anterior, havia grande controvérsia acerca do início da fluência do prazo de 15 (quinze) dias para pagamento da multa de 10% no âmbito do cumprimento de sentença (artigo 475-J do diploma renovado). A orientação da doutrina e a jurisprudência era variada, de modo que alguns defendiam a fluência automática do prazo, a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória; outros defendiam que o prazo corria a partir da intimação do devedor na pessoa de seu advogado e, por fim, existia quem sustentasse a necessidade de intimação pessoal do devedor, a partir de quando fluiria o prazo para pagamento. O NCPC é claro ao estatuir que o devedor deverá ser intimado, após requerimento do credor, na pessoa de seu advogado, a partir do que se iniciará o prazo de 15 (quinze) dias, findo os quais, sem pagamento, o montante da condenação será acrescido de 10% e, também, de honorários advocatícios de 10% (inovação não prevista anteriormente).
A responsabilização do réu pelas averbações excessivas (artigo 828 do NCPC)
O NCPC traz o instituto da averbação do ajuizamento da execução, que permite ao credor registrar a existência de execução no registro dos bens passíveis de penhora, arresto ou indisponibilidade. De forma a coibir atuação excessiva por parte do credor, o NCPC inova ao prever que a averbação indevida pelo credor resultará em indenização para o executado, a ser obtida em incidente em autos apartados. Essa indenização, diversamente da atual previsão do artigo 615-A, não está atrelada ao patamar de 20% sobre o valor da causa para os casos de litigância de má-fé (CPC, artigo 18, §2º). Dessa forma, na dinâmica do NCPC, o executado estará livre para pleitear indenização que seja proporcional ao dano sofrido. Igualmente, o não cancelamento de averbações excedentes àquelas que se transformaram em penhora também é motivo de indenização em favor do executado.
Uniformização de jurisprudência (artigos 926-928 do NCPC)
Um dos grandes motes do NCPC é a valorização da jurisprudência dos tribunais e cortes superiores, tendência que vem se consolidando ao longo dos anos. Pelo NCPC, além da obediência às súmulas vinculantes, que já eram obrigatórias por expressa previsão constitucional, também entram nesse rol, decisões do STF em controle concentrado de constitucionalidade, decisões oriundas do incidente de resolução de demandas repetitivas, súmulas e orientações dos tribunais. Atendendo a esse mesmo espírito de valorização jurisprudencial, a alteração de enunciados e súmulas já editados pelos tribunais ou de entendimento dominante do STF deverá ser fundamentada de forma específica e detalhada, sopesando princípios constitucionais como o da segurança jurídica e da isonomia, podendo, ainda, ser precedida de discussão com os jurisdicionados por meio de realização de audiência públicas. A intenção é boa, mas só o tempo e o uso indicarão se esses dispositivos serão efetivos para alcançar o objetivo a que se propõe.
Incidente de solução de Demandas Repetitivas (artigos 976-987 do NCPC)
O incidente de solução de demandas repetitivas, que já era previsto no CPC anterior, poderá ser instaurado quando se verificar a efetiva repetição de processos que versem sobre a mesma questão de direito. O objetivo é uniformizar a interpretação e evitar decisões conflitantes a respeito de determinada matéria (art. 976). Para tornar o debate mais aprofundado, a instauração e posterior julgamento do incidente serão, pelo NCPC, amplamente divulgados, inclusive por meio de registro eletrônico no Conselho Nacional de Justiça (art. 979). Além disso, atendendo aos reclamos da doutrina, haverá a possibilidade de participação dos demais interessados na controvérsia (que poderão, inclusive, juntar documentos ou requerer diligências – art. 983), viabilizando a contribuição e elucidação da questão de direito controvertida. Inovação importante, que consolida polêmico entendimento jurisprudencial sobre o assunto, é a impossibilidade de, uma vez instaurado o incidente, ocorrer a desistência ou abandono do recurso pelo recorrente (art. 976, §1º). Em tais casos, a intenção da parte não impedirá o exame de mérito da questão objeto do incidente que, se necessário, será conduzido pelo Ministério Público (art. 976, §2º). Com o julgamento do incidente, que será realizado pelo órgão do tribunal responsável (art. 978), a tese jurídica consolidada será aplicada a todos os processos individuas ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal (art. 985), para quem deverá ser direcionada a reclamação em caso de desobediência ao que restou decidido. Do julgamento do mérito do incidente ainda caberá recurso extraordinário ou especial cujo resultado do julgamento terá aplicação em âmbito nacional (art. 987).
Agravo (artigos 994, 1.015/1.022 e 1.042 do NCPC)
O NCPC apresenta importantes e substanciais alterações com relação aos recursos de “agravo”. É importante notar o desmembramento do “agravo” em “agravo de instrumento”, “agravo interno” e “agravo em recurso especial ou extraordinário”: (a) “Agravo de instrumento” é o recurso cabível contra as decisões interlocutórias, cujas hipóteses de cabimento foram restritas pelo legislador, (b) “Agravo interno” é o recurso voltado à decisão proferida pelo relator no âmbito dos tribunais, para o respectivo órgão colegiado e (c) “Agravo em recurso especial ou extraordinário” é o recurso que tem como objetivo impugnar a inadmissibilidade do recurso especial e/ou extraordinário. Nessa nova sistemática, destaca-se (i) o prazo fixo de 15 dias para a interposição dos
“agravos”; (ii) a extinção do “agravo retido”, há tempos criticado pela doutrina; (iii) o rol taxativo de hipóteses para a interposição de agravo de instrumento – as decisões interlocutórias que não comportarem agravo de instrumento não mais precluem e devem ser suscitadas diretamente em sede de apelação ou contrarrazões de apelação –; (iv) concessão de prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente em “agravo de instrumento” para regularização do recurso, em caso de falta de apresentação de qualquer peça ou de algum outro vício que comprometa a admissibilidade do agravo.
Apelação (artigos 1.009-1.014 NCPC)
O NCPC trouxe relevante mudança na sistemática recursal ao ampliar a abrangência do recurso de apelação, que não se restringirá à impugnação da sentença, mas também alcançará decisões interlocutórias proferidas na fase de conhecimento. De acordo com a nova sistemática, a parte que se sentir prejudicada por uma decisão interlocutória, não recorrível por agravo de instrumento, deverá reiterar a questão decidida em preliminar no recurso de apelação ou em contrarrazões. Vê-se que o NCPC excluiu do sistema o agravo retido, a fim de prestigiar um processo mais célere. O NCPC também aumentou o número de hipóteses em que o Tribunal poderá julgar o mérito da causa diretamente em sede de apelação. A partir do novo código, o Tribunal enfrentará diretamente o mérito quando a lide estiver em situação de imediato julgamento, independentemente de ser, ou não, a matéria discutida exclusivamente de direito. Também de acordo com as novas regras da apelação, terão seguimento negado aqueles apelos que não tenham atacado especificamente os fundamentos da decisão ou sentença recorrida, sendo mantida a possibilidade de negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível e prejudicado.