Por Fernando Munhoz Ribeiro

Advogado da área tributária do escritório

A introdução da figura da declaração de planejamento tributário pela Medida Provisória nº 685/2015 impõe que os contribuintes informem à Receita Federal do Brasil o conjunto de operações que tenham o condão de reduzir ou postergar a incidência tributária. De acordo com manifestações de órgãos oficiais, a inspiração para a exigência seria o alinhamento à tendência internacional e às recomendações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico ("OCDE") no contexto do Projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting), mais precisamente o Plano de Ação 12 (Mandatory Disclosure Rules).

A OCDE divulgou o relatório final do Plano de Ação 12 no último dia 5 de outubro. Sua análise cuidadosa demonstra que pontos importantes não foram levados em consideração pela MP 685, os quais - em eventual conversão da medida provisória em lei ou mesmo quando da sua regulamentação - deverão ser aperfeiçoados. É necessário aumentar a efetividade da obrigação para que a sedizente inspiração no Projeto BEPS e na tendência internacional não seja apenas um discurso na tentativa de legitimar tão agressiva exigência. Registre-se que a constitucionalidade de dispositivos da MP 685 é objeto da Ação Declaratória de Inconstitucionalidade nº 5366.

O relatório do Plano de Ação 12 aponta como pilares para a declaração de planejamento de tributário, as seguintes premissas: rápida obtenção, por parte das autoridades fiscais, de informações a respeito de mecanismos para redução da carga tributária; identificação dos instrumentos e dos seus usuários (contribuintes e responsáveis pela criação das estruturas); e, como consequência, dissuasão de potenciais interessados na sua adoção.

Para atingir o fim almejado, ainda de acordo com a recomendação da OCDE, a regulamentação do tema deve: ser clara na descrição das situações carecedoras de apresentação da declaração e de fácil compreensão, além de definir quem deverá atender à exigência. Deve ainda ser precisa na indicação das informações que deverão ser reportadas, apontar as consequências do cumprimento e do descumprimento da obrigação (previsão de penalidades pecuniárias e também não pecuniárias) e, por fim, contribuir para o incremento da transparência, refletida na melhoria da legislação tributária e nas orientações fornecidas pelas autoridades fiscais.

A essência do regime recomendado pela OCDE pressupõe uma cooperação entre contribuintes e autoridades fiscais, cujo desiderato último é a melhoria da qualidade da legislação tributária, pela via da diminuição das lacunas existentes e, por consequência, da utilização de formas agressivas com a única finalidade de reduzir a carga tributária. Na linha do Plano de Ação 12, uma vez obtidas as informações relativas a essas formas, as autoridades fiscais teriam condições de avaliá-las e, se o entendimento for pela sua não aceitação, propor os ajustes pertinentes na legislação para evitar que sejam novamente implementadas.

Ao fazer o confronto da MP 685 com as recomendações da OCDE, infere-se que a intenção da legislação brasileira caminha no sentido antagônico. Não nos parece que a intenção seja o aperfeiçoamento, mas o estabelecimento de sanções mais severas com mero fim arrecadatório. Além disso, a redação da MP 685, ao revés da sugestão do Plano de Ação 12, não é clara e muito menos objetiva no que concerne às situações que deverão ser reportadas, nem distingue os casos em que há comprovação de fraude daqueles em que a divergência é meramente interpretativa. E, ademais, confere demasiado poder às autoridades da Receita Federal para reconhecer, ou não, para fins tributários, determinadas estruturas adotadas.

Acrescente-se que a transparência almejada com a imposição da declaração de planejamento tributário não encontra correspondência na MP 685. Isto porque, levando em conta que a instituição desse regime visa, dentre outras finalidades, externar e tornar público e de conhecimento dos contribuintes o entendimento das autoridades fiscais no tocante à aceitação ou não de certas estruturas sob o enfoque tributário, a MP 685 indica que a análise será casuística, com intimação apenas do contribuinte envolvido. Da forma como redigida a MP, não há previsão de instrumento que garanta, desde já, ampla divulgação da posição da Receita Federal com a subtração da identidade do contribuinte, atendendo ao escopo de orientação.

Conclui-se, portanto, que a implementação da obrigação de apresentação da declaração de planejamento tributário exige aperfeiçoamentos, tais como descrição clara e objetiva das hipóteses que impõem o seu cumprimento e o dever de orientação das autoridades fiscais (na ótica da transparência do seu posicionamento), sob pena de se perder excelente oportunidade de, efetivamente, alinhar à tendência internacional e às recomendações da OCDE nesse particular.

(Jota - 05.11.2015)

(Notícia na íntegra)