Com o mercado ainda fechado para aberturas de capital, duas empresas optaram por já pedir o registro na Bovespa mesmo sem captar recursos, a Clarion Agroindustrial e a Steel do Brasil. O objetivo é criar um histórico de transparência. Oferecer informações antes de pedir recursos.
 
A Clarion, empresa de agronegócios que está sob a chancela da Bovespa e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) desde dezembro do ano passado, já realizou até a primeira apresentação para analista de investimentos na semana passada, mesmo com as ações concentradas nas mãos do controlador, Reno Ferrari. Embora não tenha papéis em circulação, a Clarion já possui registro de negócio e código na bolsa (CLAN3 e CLAN4).
 
Já a Steel do Brasil é uma companhia pré-operacional. Criada em agosto do ano passado, a empresa tem como objetivo investir na atividade de mineração, seja na operação diretamente ou em participações em companhias que atuem no ramo. Controlada pelo alemão Dirk Adamski, a empresa ainda não captou recursos para seu projeto. Até o momento, tem registro na Bovespa e na CVM, obtidos em junho, mas ainda não solicitou a negociação dos papéis. Mas já informa qual será seu código na praça paulista: STLB3.
 
A diretora de relações com empresas da BM
FBovespa, Cristiana Pereira, afirmou que no atual momento essa pode ser uma saída interessante para as companhias que querem se expor e se apresentar aos investidores, visando um diferencial quando o mercado reabrir para captações por novatas - as ofertas iniciais.
 
O apetite por ações de companhias brasileiras já se provou nas ofertas de ações realizadas neste ano ou em andamento, como de Hypermarcas, Light, BR Malls, MRV, Redecard e mais recentemente de Brasil Foods e Natura. No entanto, foram operações de empresas já abertas, conhecidas como ofertas subsequentes.
 
Ainda predomina a análise de que é cedo para falar em ofertas iniciais, especialmente de companhias desconhecidas do público. A colocação de VisaNet foi considerada uma exceção. Para o fim deste ano, contudo, é possível que o movimento recomece, com grandes expectativas já para o primeiro trimestre de 2010.
 
Cristiana, da BM
FBovespa, explicou que essa alternativa de listar sem captação é apresentada especialmente às empresas que estavam interessadas em abrir capital no Bovespa Mais. Trata-se do segmento de listagem com governança diferenciada destinado a companhias que desejam fazer uma aproximação gradual com o mercado - seja pelo tamanho do negócio ou por questões culturais. Nesse espaço, não há exigência de uma fatia mínima do capital em circulação, de 25%, como existem nos Níveis 1 e 2 e Novo Mercado.
 
A Clarion aproveitou o registro de balcão da Encomind, companhia adquirida pelo seu controlador em 2003, e apenas migrou para a bolsa. José Martins Pereira, presidente da Clarion, conta que a a empresa estuda emitir dívida - como debêntures ou criar um fundo de recebíveis (FDIC) - neste ano e emitir ações no futuro. Porém, não há uma definição, e a empresa deve esperar a evolução do ambiente neste ano.
 
Com faturamento líquido anual de R$ 575,8 milhões e lucro de R$ 29,7 milhões, a companhia pretende obter R$ 400 milhões para expandir os negócios, segundo Pereira. A Clarion dividirá os recursos na expansão da capacidade de processamento de soja, na produção de biodiesel, álcool e cana-de-açúcar. Ao fim do ano passado, tinha uma dívida líquida de R$ 59,4 milhões, equivalente a menos de um ano do lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (lajida).
 
Pedir o registro de negociação antecipadamente na bolsa e realizar reunião com o mercado tiveram como objetivo divulgar a empresa. "No Rio, principalmente, todo mundo conhece o açúcar Amoroso e o álcool Parati, mas quase ninguém sabe da Clarion."
 
O sócio da Ernst
 Young especializado em fundos de participações Carlos Asciutti contou que estar submetido ao crivo dos reguladores e dar transparência às informações são pontos que certamente agregam valor numa transação para entrada de um sócio financeiro, como os fundos dedicados a investimentos de longo prazo.
 
Ele lembrou que é comum empresas emitirem títulos de dívida fora do Brasil, já com a previsão de registro no regulador americano e a redução automática no custo da operação. "É o mesmo princípio. É uma segurança para o investidor."
 
Buscar aportes relevantes de poucos sócios, incluindo fundos de participação, é o plano da Steel da Brasil. O projeto, segundo o prospecto da companhia disponível na CVM, está apoiado na capacidade de divulgação do controlador, que é criador da empresa de investimentos alemã Metropolis Capital Markets. Assim, a listagem na bolsa brasileira seria uma contrapartida de transparência para os potenciais interessados no projeto. Procurada, a empresa não comentou os planos.
 
Embora estar sob o guarda-chuva da Bovespa e da CVM ofereça uma segurança quanto ao fornecimento de informações como balanços e movimentações societárias, essa não é a única alternativa para os interessados em cultivar uma imagem de boas práticas de governança antes mesmo de acessar o mercado de capitais.
 
Carlos Motta, especialista em direito societário do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, explica que uma companhia fechada pode criar essa agenda de transparência tanto por meio do acordo de acionistas como do seu estatuto social. A empresa pode se obrigar a ter balanço auditado e publicado e a divulgar informações importantes. Na opinião dele, não é necessário arcar com os custos da obrigatoriedade da informação se ainda não foi auferido o benefício da captação.
 
A visão das companhias, contudo, é que esse esforço anterior resultará em benefício adicional quando chegar o momento da capitalização. Ou seja, a ideia é que a iniciativa se transforme em melhores condições, seja em taxas mais baixas para custo de dívida, seja maior apetite por suas ações numa possível oferta pública.
 
(Valor Econômico 30.07.2009/Caderno D1)
 
(Notícia na Íntegra)