“Empresa e família é um binômio muito delicado e quando não organizados, quebram os dois: a empresa e a família. Determinadas famílias desejam que o cônjuge fique bem assistido, que tenha imóveis e ativos financeiros, mas não querem que participe do controle da empresa familiar”, afirmou Renata na entrevista que teve a participação do editor executivo da revista Maurício Cardoso e das repórteres Adriana Aguiar e Aline Pinheiro e Fernanda Erdelyi. Segundo Renata, a procura por contratos pré-nupciais e as consultas sobre os tipos de regimes matrimoniais antes do casamento cresceram muito nos últimos anos como conseqüência da evolução das relações sociais e culturais do país. “Cada vez mais eu tenho recebido clientes e consultas anteriores ao casamento para discutir regime de bens”. A advogada acredita na eficiência da separação total de bens para evitar o famoso “golpe do baú”: “o regime da separação total entrega ao casal a condição de formar o seu patrimônio da maneira que desejar”. Na complexidade da vida em família, na opinião de Renata cabe até mesmo uma responsabilização com danos morais. “O dano moral cabe tanto no casamento civil quanto na união estável. No casamento civil, por exemplo, em que um dos cônjuges é absolutamente irresponsável e mantêm várias outras mulheres e relações sem usar preservativo. Contrair uma doença sexualmente transmissível e não comunicar o cônjuge, gera indenização por danos morais”. Entrevista (parcial) ConJur - O que mudou em relação à família com o novo Código Civil? Renata Guimarães - Uma das grandes mudanças com o novo Código é a possibilidade de alterar o regime de bens do casamento. Pelo código anterior, o regime de bens era absolutamente imutável. Antes só era possível mudar o regime de bens com a separação do casal ou o divórcio. No novo Código há uma previsão específica de alteração do regime de bens. ConJur - Cabe dano moral nas relações familiares? Em que situações? Renata Guimarães - Essa é uma fonte muito interessante. Eu acho que o dano moral cabe tanto no casamento civil quanto na união estável. Por exemplo, no casamento civil, em que um dos cônjuges é absolutamente irresponsável e mantêm várias outras mulheres e relações sem usar preservativo. Contrai uma doença e contamina o outro cônjuge sem que o outro saiba. Houve um caso de um casamento de mais de 20 anos em que o ex-marido no auge do litígio foi internado as pressas. Eu até achei que a internação era uma forma de evitar a citação para pensão alimentícia e o médico diz aos filhos que o pai foi internado por causa de HIV, doença que ele tinha há alguns anos. É uma fatalidade ter contraído, mas saber disso e não comunicar o cônjuge, eu acho que gera indenização por danos morais. Existem outras situações, como de agressão física, e que são muito mais freqüentes do que se imagina em todos os níveis. Existem situações de abuso dos filhos, de abandono moral, que geram indenização por danos morais. Conjur - Quando você faz um testamento, qual é a situação? Renata Guimarães - Em um testamento, quando a pessoa morre, 50% é o que se chama de parte legítima, reservada aos herdeiros necessários, e os outros 50% é o que se chama de parte disponível. Como o próprio nome indica, a disposição é totalmente aberta. Você deixa para um filho, para um sobrinho, ou para um terceiro sem nenhum vínculo. A destinação desta parte fica a cargo única e exclusivamente do testador. Antigamente 50% do patrimônio era destinado aos filhos e aos pais. Pela lei anterior, quem não tivesse filhos e pais e fosse casado podia dispor como bem entendesse de todos os bens. Como o cônjuge não era um herdeiro necessário, o outro cônjuge, ao morrer, poderia deixar cem por cento do patrimônio para qualquer pessoa. Hoje isso muodou. Conheci uma situação em que uma moça muito jovem perdeu os pais e herdou tudo o que eles tinham. Ela era casada em separação total de bens e um ano depois ela morreu. Não teve filhos e o cônjuge dela herdou toda parte que ela havia recebido dos pais. E mesmo que ela fizesse um testamento, 50% dos bens teriam que necessariamente ser do cônjuge, e os outros 50% ela poderia destinar para o irmão, para o sobrinho, o que fosse. Conjur - O que significa pacto antenupcial? Renata Guimarães - É um entendimento anterior ao casamento para escolha de um regime de bens diverso do legal à época. Tem aumentado muito. Até porque, imagine a situação: moraram juntos há seis anos e vão se casar. São duas situações jurídicas: uma é a união estável, a outra é casamento civil. Se depois eles se separarem, o que acontece? Na realidade tem que haver duas ações. Uma de separação do casamento e a outra de dissolução da união estável anterior, porque pode ter havido formação patrimonial. O pacto nupcial entra aí para quitar, fechar e distribuir os bens da união estável e pactuar o casamento para frente. Assim fica resolvida uma situação pretérita de união estável e o ajuste do casamento para frente. Esse não é o foco do pacto, mas pode conter essas disposições. E o que significa o planejamento familiar? O planejamento familiar societário, sucessório une três áreas: a parte de família e sucessões, a parte societária e a parte tributária. Empresa e família é um binômio muito delicado e quando não organizados, quebram os dois: a empresa e a família. Portanto, o planejamento passa por testamentos, por doações; por regulamentar as uniões estáveis para que os dividendos não corram para fora; criar testamentos para que os filhos tenham o controle das empresas. A hora que o cônjuge se tornou herdeiro, por exemplo, não é o caso de excluir o cônjuge ou de impedir que ele receba patrimônio, mas providenciar para que ele receba patrimônio que não seja a empresa familiar. Ele pode receber imóveis e ativos financeiros. Muitas vezes, o patriarca daquela família quer que a sua empresa fique exclusivamente com os filhos, com os netos, bisnetos. Há uma linha de consangüinidade dentro disso. Deseja que o cônjuge fique bem assistido, com imóveis, com ativos financeiros, mas não quer que participe do controle da sua empresa. A mudança na destinação da herança pode trazer conseqüências muito graves. Empresas cujo planejamento já estava de alguma forma estruturado sofreram uma grande revisão com o novo Código. Conjur - Por que eu devo ou não devo fazer um testamento? Renata Guimarães - A medida do testamento é se você deseja ou não as conseqüências legais. Eu vou lhe dar um exemplo. Imagine um caso: uma pessoa que tem uma única empresa, resolveu colocar nessa limitada todos os seus bens, os bens pessoais, os gerados pelo negócio, tudo. Ele é casado e tem um filho de 40 anos que sempre trabalhou com ele e é ativo na empresa da família. Esse senhor dono dessa empresa terminou o casamento, teve uma namorada e resultou desse relacionamento passageiro uma filha menor de idade. Termina o caso e o dono da empresa casa-se novamente com outra moça no regime de separação total de bens. Faleceu. Não deixou testamento. Pela lei anterior, ele teria como herdeiros os dois filhos dele: o de 40 anos que toca o negócio e a filha menor de idade. Pelo novo código, desse único bem que ele deixou de herança, que é a empresa, um terço é do filho de 40 anos, um terço é da menina, um terço da última esposa casada em separação total de bens. Até que essa menina complete dezoito anos, a mãe, pela decorrência do que se chamava pátrio poder e hoje poder familiar, poder parental, ela tem administração e usufruto legais. Assim, cada um tem 33%. por Maria Fernanda Erdelyi
Fontes: Revista Consultor Jurídico 10.10.2005 Data da inclusão: 11/10/2005 - 19:32:05