Por Mauro Bardawil Penteado, Rafael Domingos Faiardo Vanzella e Letícia Oliveira Lins de Alencar
Após calorosos debates em torno das licitações portuárias anunciadas pelo Governo Federal há alguns meses, em 12 de agosto, foram publicadas as minutas dos documentos licitatórios relativos aos arrendamentos inseridos no 1º Bloco de Licitações Portuárias, localizados no Estado de São Paulo e do Pará.
Desde o segundo semestre de 2012, o Governo Federal passou a envidar seus melhores esforços no sentido de incentivar a realização de investimentos na infraestrutura portuária brasileira. Isso se deu, dentre outras medidas, a partir da elaboração do Programa de Investimentos em Logística (PIL) para o setor, que prevê a realização de investimentos da ordem de R$ 54,4 bilhões até 2017. Tais recursos devem ser destinados à implantação de novos terminais privativos e, inclusive, para a outorga de arrendamentos portuários.
Pelo que se depreende do PIL referente ao setor portuário, a intenção do Governo Federal é a de licitar arrendamentos portuários localizados em 25 (vinte e cinco) portos públicos brasileiros. Devido à quantidade de arrendamentos e complexidade dos projetos, as licitações serão realizadas em 4 (quatro) blocos distintos. Os documentos licitatórios recentemente publicados pelo Governo Federal integram o 1º Bloco e tem por objeto o arrendamento de instalações portuárias localizadas em portos públicos do Estado de São Paulo e do Pará.
Ao todo, serão 31 (trinta e um) terminais portuários licitados neste bloco. Com o objetivo de dotar de celeridade os processos licitatórios e garantir maior transparência e informações aos licitantes, as instalações portuárias que estão sendo licitadas neste primeiro bloco foram agrupadas em 10 (dez) lotes, correspondendo, cada um deles, a um edital específico. A divisão destes terminais levou em consideração, além da semelhança da carga a ser movimentada, o fato de possuírem posições competitivas análogas ou complementares. Diante disso, todos aqueles terminais que tenham sido alocados em um mesmo lote estarão sujeitos às mesmas condições específicas para a licitação e, além disso, serão julgados em uma mesma sessão pública.
O processo de Consulta e Audiência Pública, destinado ao recebimento de contribuições aos documentos licitatórios, foi encerrado em 6 de setembro e, agora, espera-se o pronunciamento da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) quanto às sugestões e questionamentos recebidos e a submissão da minutas finais dos documentos à análise do Tribunal de Contas da União (TCU), tal como determina a Instrução Normativa nº 27, de 2 de dezembro de 1998, do TCU.
Malgrado seja possível que, após o recebimento das contribuições, os documentos licitatórios sejam aprimorados, a análise preliminar dos documentos disponibilizados nos permite depreender as características gerais do novo modelo, que não deverão ser alteradas, tanto no tocante ao procedimento licitatório, como no que se refere à forma de exploração destes terminais.
No que tange aos aspectos procedimentais do certame, todas as licitações envolvidas neste primeiro bloco serão realizada na modalidade leilão, tendo sido adotada a inversão de fases, e, pela sistemática do edital, se dividem em 3 (três) etapas distintas.
Na primeira delas, as licitantes deverão apresentar, tão somente, algumas declarações preliminares, documentos de representação e a Garantia de Proposta.
Na segunda, as proponentes apresentarão as suas Propostas Econômicas em meio à Sessão Pública de Leilão, na qual será realizada a fase de negociações. A fase de negociação prevista na modelagem seguiu o mesmo roteiro previsto nas licitações aeroportuárias. Diante disso, somente poderão participar desta etapa aquelas licitantes cuja oferta atenda a, pelo menos, uma das seguintes condições: (i) esteja entre as 3 (três) maiores ofertas de desconto sobre as tarifas máximas; e/ou (ii) o desconto linear ofertado seja igual ou superior a 90% (noventa por cento) do desconto linear ofertado pela melhor oferta apresentada.
Por fim, na terceira fase, a Comissão de Licitação analisará os documentos de habilitação da licitante vencedora. Após a publicação da ata de julgamento com o resultado da análise dos documentos de licitação das proponentes vencedoras, será aberto prazo para a interposição de recursos, que somente poderão ser interpostos neste momento. Julgados os recursos, homologado o resultado da licitação e cumpridas as condições prévias para a adjudicação do objeto, o contrato será celebrado.
Em que pese a licitação relativa a cada lote possa observar critérios específicos de seleção, a intenção do Governo Federal foi a de adotar um critério baseado na maior capacidade de movimentação (e investimentos) para a licitação de arrendamentos que se encontrem inseridos em cadeias verticalizadas ou com ambiente de competição sadio ou, nos casos em que o objeto da licitação seja terminal com característica de prestação de serviços a terceiros, o critério da menor tarifa. Diante disso, para cada lote específico deste 1º Bloco foi previsto um critério de julgamento específico.
Pelo que se depreende do modelo proposto, em nenhum dos casos será levada em consideração, como critério de julgamento, a técnica a ser utilizada por cada um dos licitantes. A rigor, embora seja prevista a necessidade de apresentação de um Projeto Básico de Implantação (PBI) específico para cada um dos terminais, esta exigência se impõe, tão somente, ao licitante vencedor. Há quem sustente que deveria ser alterado o critério de julgamento, de forma que ele se baseasse, também, na técnica a ser utilizada por cada proponente. Para isso, os editais poderiam, por exemplo, exigir a apresentação de um PBI por cada proponente durante a licitação. Em última análise, esta concepção estaria de acordo com os próprios ditames da Lei Federal nº 12.815/2013, que, ao instituir o novo marco regulatório do setor portuário, previu a necessidade de a exploração de terminais portuários visar à modernização, qualidade e a eficiência das atividades prestadas (art. 3º).
Como a intenção do Governo Federal é a de licitar em lotes, de acordo com o tipo e carga e posição dos arrendamentos, em alguns casos, foram estabelecidas restrições para que mais de um terminal possa ser adjudicado a uma única proponente. Isso foi previsto nas condições específicas dos editais referentes aos Lotes 1 (destinado ao arrendamento dos terminais de cargas gerais de Macuco e Paquetá), 3 (somente em relação aos terminais de granéis sólidos vegetais da Ponta da Praia e em Conceiçãozinha, ambos no Porto de Santos) e 4 (restrição apenas aplicável aos terminais de granéis sólidos minerais de Outeirinhos).
Nada obstante sejam previstas restrições, em determinados casos, à adjudicação de terminais por parte de um mesmo licitante, o objetivo do Governo Federal é bastante claro no sentido de ampliar a competitividade dos certames. Além de ser prevista a possibilidade de participação individual ou em consórcio no certame, as condições gerais dos editais, aplicáveis indistintamente a todos os lotes, sequer exigem a apresentação de documentos de qualificação técnica que comprovem que o licitante possui experiência prévia na realização de operações portuárias. A única exigência prevista é a de apresentação de compromisso de obter a sua pré-qualificação como operador portuário ou, até mesmo, a de contratar operador portuário pré-qualificado.
No tocante à forma de exploração, verifica-se uma grande heterogeneidade em relação à vigência dos contratos e tipo de carga a ser movimentada em cada um dos terminais licitados.
Os contratos possuem prazos específicos. O prazo mais frequente é o de 10 (dez) anos: é o caso dos Terminais de Granéis Líquidos de Alamoa e de Barnabé, Terminais de Granéis Sólidos Minerais de Outeirinhos e de Vila do Conde, do Terminal de Veículos e Cargas Gerais Conteinerizadas ou não do Saboó, dos 4 (quatro) Terminais de GLP de Miramar, de 3 (três) Terminais de Granéis Líquidos de Miramar e do Terminal de Granéis Líquidos de Santarém. Em relação a 7 (sete) arrendamentos (Terminal de Cargas Gerais do Paquetá, Terminal de Granéis Líquidos de Alamoa, Terminal de Granéis Sólidos de Outeiro, Terminal de Granéis Sólidos de Santarém, Terminal de Granéis Sólidos Vegetais de Ponta da Praia, Terminal de Granéis Sólidos Minerais de Vila do Conde e Terminal de Granéis Líquidos de Vila do Conde), é previsto o prazo de 25 (vinte e cinco) anos e, em 2 (dois) casos - Terminal de Cargas Gerais do Macuco e Terminal de Contêineres de Belém -, prazo de 15 (quinze) anos. Além destes, foram estabelecidos outros prazos para os demais terminais, variando entre 2 (dois) e 9 (nove) anos.
Em todos os contratos será prevista a possibilidade de prorrogação por uma única vez. O prazo máximo, contudo, deverá ser igual ao originalmente contratado, o que, em alguma medida, desincentiva a realização de investimentos de monta naqueles terminais cujos prazos de vigência são bastante exíguos.
Também em relação às cargas a serem movimentadas, verifica-se grande pluralidade. Isso se justifica na medida em que, neste primeiro bloco de licitações, há terminais destinados, exclusivamente, à movimentação de cargas gerais, granéis líquidos, granéis sólidos, produtos gasosos, veículos e contêineres.
No que se refere à modelagem dos contratos, é interessante notar que, diferentemente da praxe do setor, foi adotada uma nova metodologia para a realização de revisões extraordinárias destes contratos de arrendamento. Pelo que se aduz das condições gerais do contrato, a partir de agora, a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro destes contratos será realizada a partir da concepção de um fluxo de caixa marginal, projetado em razão de investimentos ou custos. Trata-se de uma metodologia que já vem sendo utilizada há algum tempo em outros setores regulados - tal como ocorre em rodovias.
Apesar de ser possível que, uma vez encerrada a fase de Consulta e Audiência Pública, os documentos licitatórios sejam alterados, entendemos que as diretrizes adotadas pelo Governo Federal e expostas acima consistem em verdadeiras premissas do modelo e, portanto, não serão modificadas. É preciso reconhecer que os documentos, embora, em diversos aspectos, tenham incorporado inúmeras disposições editalícias e contratuais já utilizadas nas concessões federais realizadas recentemente, ainda podem e devem ser aprimorados, sobretudo no tocante à alocação de riscos e às penalidades estabelecidas na minuta de contrato.
Resta, agora, torcer para que sejam implementadas alterações capazes de efetivamente atender, na maior medida possível, às diretrizes estabelecidas pelo novo marco regulatório, que tem como norte o primado da modernização, eficiência e qualidade.