O processo do Projeto Gemini entrou em fase de produção de provas, após reunião com as empresas do Consórcio Gemini, formado pela Petrobras e a White Martins, e a Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG), na última sexta-feira (8/5). O encontro foi convocado pelo MME.

Apesar de tramitar no Supremo Tribunal Federal (STF) há 14 anos, o processo ainda está em fase inicial. Em março de 2019, a 2ª Turma do tribunal reconheceu a existência de conflito federativo e determinou a subida dos autos à corte, sob a forma de ação cível ordinária (ACO), que vai determinar o resultado da discussão.

Está em jogo a interpretação das atividades planejadas pelo consórcio como transporte de gás natural ou distribuição local de gás canalizado. No primeiro caso, caberia à ANP o papel de entidade reguladora, enquanto, no segundo, as atividades se enquadrariam na competência estadual, sendo reguladas pela Agência Reguladora de Saneamento do Estado de São Paulo (Arsesp) – antiga Comissão de Serviços Públicos de Energia (CSPE).

O projeto prevê o transporte, pela TBG, do gás natural fornecido pela Petrobras até uma unidade de liquefação da White Martins em Paulínia (SP). Liquefeito, o gás seria, então, transportado via caminhões até os clientes finais. O acordo também prevê o fornecimento de gás comprimido (GNC) em cilindros de alta pressão.

A interpretação da Arsesp – de que caberia ao estado de São Paulo regular as atividades do empreendimento – deu início ao litígio. A distribuição de gás natural na região metropolitana de São Paulo é de concessão da Comgás, que também entrou na disputa.

“A Constituição é muito simples na definição da atividade estadual”, afirma Daniel Szyfman, do escritório Machado meyer. De acordo com o advogado, o estado de São Paulo e a Arsesp entendem que a configuração do projeto leva à conclusão de que a atividade de levar gás aos consumidores finais, ainda que por meio diferente do gasoduto de distribuição, estaria sujeita à exclusividade da distribuidora.

Para ele, o conflito – que ainda deve demorar no STF, dado o estágio inicial do processo – pode servir de parâmetro para outros casos, no que se refere à definição das competências federal e estadual.

No entanto, é possível que o STF chegue a uma decisão específica para o caso e não resolva a questão como um todo, ponderou Ricardo Martinez, do escritório Vieira Rezende. “Todas as legislações fugiram dessa conceituação – onde termina o transporte e começa a distribuição – porque os interesses políticos com todos os estados e a União eram muito grandes”, avalia.

De acordo com o advogado, a limitação da área de atuação dos estados também limita o valor das concessionárias estaduais, por se tratar de “uma briga de interesses econômicos”, sendo que o impacto no valor das concessões só pode ser quantificado se outras empresas entrarem no mercado fazendo a distribuição de gás sem utilizar gasodutos.

Martinez concorda que processo pode abrir precedente para a distribuição de GNL fora da regulação das autarquias estaduais. “Se isso acontecer, certamente atrairá muitos outros players para o mercado”, declarou.

Procurada pelo PetróleoHoje, a Arsesp declarou que “no caso Gemini, ocorreu uma operação ilegal”, sendo a exploração para distribuição de gás canalizado no estado competência da concessionária estadual. “A Arsesp entende como positivo o andamento do processo”, completou.

A White Martins e a ANP declararam que não comentam casos em juízo. A Petrobras também decidiu não comentar o litígio.

(Brasil Energia - 13/05/2020)