A atuação das associações civis na defesa coletiva de direitos tem sido objeto de constante evolução jurisprudencial no Supremo Tribunal Federal (STF), especialmente no que se refere à impetração de mandado de segurança coletivo.

Desde a edição da Súmula 629[1], em 2003, que dispensa a autorização expressa dos associados para esse tipo de ação, o tema tem sido revisitado em diversos julgamentos, revelando tensões entre a proteção de direitos coletivos e os limites da representação processual.

Em 2014, o STF enfrentou o Tema 82, que tratou da necessidade de autorização expressa para que associações atuem judicialmente em nome de seus filiados. A Suprema Corte firmou entendimento de que a simples previsão estatutária não é suficiente para legitimar essa atuação, exigindo-se autorização específica, ainda que deliberada em assembleia.

Já em 2017, no julgamento do Tema 499, o STF restringiu os efeitos da coisa julgada em ações coletivas ordinárias aos associados que já integravam a entidade no momento da propositura da ação, e que constassem nominalmente na petição inicial.

Essas teses foram voltadas às ações ordinárias, razão pela qual surgiram dúvidas quanto à sua aplicação ao mandado de segurança coletivo, especialmente diante da aparente contradição com a Súmula STF 629. A questão foi enfrentada no Tema STF 1.119, julgado em 2020, no qual se reafirmou que no âmbito do mandado de segurança coletivo não se exige autorização expressa, lista nominal de associados ou comprovação de filiação prévia. O fundamento central acolhido foi a natureza de substituição processual própria desse instrumento, que o distingue das ações coletivas ordinárias.

Contudo, o julgamento do ARE nº 1.339.496/RJ pela Segunda Turma do STF reacendeu o debate ao delimitar a aplicação da tese do Tema 1.119. Neste caso, a Corte entendeu que associações civis “genéricas”, como a Associação Brasileira de Contribuintes Tributários (ABCT), não possuem legitimidade para impetrar mandado de segurança coletivo. O voto vencedor, proferido pelo Ministro André Mendonça, destacou que a ausência de especificidade no objeto social da entidade compromete a identificação de um grupo determinado de beneficiários, requisito essencial para a tutela de direitos coletivos.

A decisão também reforçou a importância da apresentação da lista nominal de associados como garantia do devido processo legal, permitindo à parte contrária saber contra quem se defende.

A despeito de o julgamento do ARE nº 1.339.496/RJ não ter ocorrido sob o regime da repercussão geral, esse tem gerado impactos diretos na jurisprudência do STF.

As Primeira e Segunda Turmas da Suprema Corte, após o julgamento do ARE nº 1.339.496/RJ, decidiram, em situações semelhantes, que a tese firmada no Tema 1.119 não se aplica às associações genéricas. Nesse sentido, até o momento, foram identificados os acórdãos proferidos nos autos do Agravo em Recurso Extraordinário nº 1.388.698/SP (ARE nº 1.388.698/SP), Recurso Extraordinário nº 1.480.978/RJ (RE nº 1.480.978/RJ) e Recurso Extraordinário nº 1.450.917 (RE nº 1.450.917).

Esse cenário revela um campo jurídico em constante transformação, marcado por tensões entre a ampliação do acesso à justiça e a necessidade de preservar a legitimidade da representação coletiva.

O debate sobre a atuação das associações civis em mandado de segurança coletivo permanece aberto, especialmente quanto à definição dos limites da substituição processual e à caracterização das entidades legitimadas.

Diante da complexidade e da relevância do tema, que tem gerado intensos debates no meio jurídico, o Machado Meyer Advogados tem assessorado companhias interessadas em compreender melhor esse cenário e avaliar estratégias jurídicas adequadas à sua realidade.

 


[1] Súmula 629/STF: A impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes.