BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Ministros do TST (Tribunal Superior do Trabalho) aprovaram nesta segunda-feira (23) o recuo do governo de permitir a suspensão do contrato de trabalho por quatro meses.

No período, a empresa não pagaria salário, manteria benefícios e ofereceria um curso de qualificação ao empregado durante a crise do coronavírus.

A regra derrubada pelo presidente Jair Bolsonaro em poucas horas estava prevista em MP (medida provisória) para o enfrentamento da crise do coronavírus. O texto foi editado no fim da noite de domingo (22).

Após repercussão negativa, o presidente anunciou em rede social que determinou a retirada do artigo que previa a suspensão do contrato de trabalho.

A medida valeria até o fim do ano, enquanto perdurasse o estado de calamidade pública em razão da Covid-19.

"A revogação está feita, e acho que ela foi positiva, porque deve haver alguma forma de remuneração, seja seguro-desemprego, seja outra. É uma política pública que deve estar sendo pensada por quem tem atribuição e competência para tanto. É muito importante garantir a subsistência das pessoas", disse a presidente do TST, Maria Cristina Peduzzi.

"E quem tem atribuição política de encontrar um texto adequado e a colocação adequada encontrará um denominador comum que atenda às expectativas dos empregados e dos empresários", afirmou.

Peduzzi disse que prefere não comentar o teor da MP, que trata entre outros pontos de teletrabalho, banco de horas e adiamento do pagamento do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).

"Sempre, quando questionada sobre avaliações de textos editados, tenho dito que a função do Poder Judiciário é aplicar a lei. A conveniência política, a avaliação política, é de quem edita a lei. Nessa perspectiva, não vou me pronunciar sobre o conteúdo."

Ela destacou que nesta segunda o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Dias Tofolli, havia se pronunciado sobre o tema.

"Ele [Toffoli] já fez considerações sobre aspectos da MP, sugerindo digamos a previsão de um seguro-desemprego ou de uma remuneração mínima dos empregos que em um momento de crise não poderiam ficar sem qualquer tipo de remuneração", afirmou Peduzzi.

Ex-presidente do TST, o ministro Ives Gandra Martins da Silva Filho disse que a suspensão do contrato de trabalho por tempo determinado tinha falhas.

"Era uma boa alternativa a suspensão do contrato de trabalho para se fazer cursos de qualificação pela internet, mas o problema ficou na não compulsoriedade [obrigatoriedade] da bolsa de qualificação a ser paga ao empregado", afirmou.

Segundo ele, "teria sido interessante disponibilizar, pela MP, o seguro-desemprego para a hipótese de suspensão do contrato, mas seria necessário verificar se o FAT [Fundo de Amparo ao Trabalhador] teria recursos no caso de suspensão massiva de contratos".

Gandra considera, porém, a edição da MP uma iniciativa oportuna para atenuar os efeitos da crise do coronavírus em momento de redução da atividade econômica.

O ministro do TST Alexandre Agra Belmonte afirmou que, de fato, o artigo sobre a suspensão do contrato de trabalho tinha de ser revogado. "Sem salário por quatro meses ninguém sobrevive".

Ele defende, contudo, ajustes na proposta. "Pode ser objeto de reapresentação, uma vez reformulado, porque é uma alternativa importante. Nos casos em que a atividade empresarial fica paralisada, é preferível a suspensão do contrato do que a despedida", disse.

Segundo Belmonte, empresa e governo devem participar nesse período de suspensão.

"A primeira [ajuda do governo é] com uma bolsa em valor negociado com a sindicato e o segunda com um valor advindo do FAT", afirmou.
Sobre a MP, ele disse que já constam da lei.

"[As regras] estão previstas na CLT [Consolidação das Leis do Trabalho] e foram flexibilizadas para atender o momento. Mas a participação do sindicato seria importante nesse processo de negociação com as empresas quanto às práticas a serem adotadas", disse.

A MP valoriza a negociação individual sobre a coletiva.

ENTENDA A MP 927 PONTO A PONTO

1) Suspensão do contato de trabalho por 4 meses

O presidente Jair Bolsonaro disse que esse artigo será revogado

2) Antecipação de férias individuais

Como fica:

- A notificação do início das férias poderá ser feito 48 horas antes, por escrito ou comunicação eletrônica (email ou sistema interno);

- O empregador poderá antecipar o período de férias, mesmo que o trabalhador ainda não tenha completado os 12 meses de trabalho;

- Um segundo período de férias futuras também poderá ser antecipado, mas exigirá assinatura de acordo entre as partes;

- Funcionários dos grupos de risco devem ter prioridade nas férias;

- Pagamento: o valor referente às férias poderão ser pagos no mês seguinte ao início delas; o 1/3 de férias poderá ser pago até o dia 20 de dezembro, com o 13º salário.
Como era:

- Exceto nos casos em que as convenções coletivas preveem, os empregadores precisavam comunicar o funcionário pelo menos 30 dias antes;

- O período aquisitivo para as férias só ocorria a partir do 12º mês de trabalho;

- O dinheiro das férias, mais o adicional, tinha que ser pago até dois dias antes do início do período.

3) Concessão de férias coletivas

Como fica:

- As férias poderão ser aplicadas por quaisquer períodos de duração;

- O empregador tem de comunicar os trabalhadores com antecedência de 48 horas;

- Não é necessário comunicar sindicatos ou governo.

Como era:

- A necessidade de férias coletivas precisava ser comunicada aos sindicatos das categorias e à Secretaria Especial de Previdência e Trabalho;

- Elas tinham ser de, no mínimo, dez dias e podiam ser concedidos em dois períodos do ano.

4) Aproveitamento e a antecipação de feriados

Como fica:

- Com exceção dos feriados religiosos, é possível antecipar a folga do feriado;

- O empregado precisa comunicar o funcionário de que isso será feito;

- A compensação fica para banco de horas;

- No caso dos feriados religiosos, a antecipação depende de acordo individual.

Como era:

- Não havia previsão de antecipação do feriado;

- O trabalhador tinha o direito à folga e, caso trabalhasse, a uma folga depois ou receber o dia em dobro.

5) Banco de horas

Como fica:

- O tempo para compensação passa a ser de 1 ano e 6 meses;

- A compensação poderá ser feita por meio de horas extras, limitadas a duas horas diárias;

- Os termos podem ser definidos pelo empregador, sem a necessidade de acordo coletivo ou individual.

Como era:
- A compensação de horas tinha de ser feita em seis meses, exceto nos casos em que os acordos coletivos definissem mais tempo.

6) Teletrabalho

Como fica:

- O empregador pode alterar de presencial para teletrabalho sem mexer nos contratos;

- O funcionário tem que ser avisado da mudança com 48 horas de antecedência;

- Em 30 dias, funcionário e empresa fecharão acordo para definir a responsabilidade sobre a compra e manutenção dos equipamentos;

- Quando o funcionário não tiver computador ou internet, a empresa poderá fornecer;

- Se não fornecer, o funcionário ficará em casa e as horas serão consideradas tempo à disposição da empresa;

- Fica liberado o trabalho remoto de estagiários e aprendizes.

Como era:

- O trabalho em casa ou à distância precisava ser previsto em contrato para que fossem definidos parâmetros de controle de jornada, por exemplo;

- Havia um período de transição de 15 dias para o início do home office;

- Não havia regulamento para teletrabalho de estagiários e aprendizes.

7) Exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho

Como fica:

- Todos os exames ocupacionais ficam suspensos;

- Quando o estado de calamidade acabar, as empresas terão 60 dias para fazê-los;

- Se houver um exame de saúde ocupacional realizado nos últimos seis meses, a avaliação para demissão não precisará ser feita;

- Treinamentos de saúde do trabalho estão suspensos;

- As Cipa (comissões internas de segurança do trabalho) serão prorrogadas.

Como era:

- Os funcionários precisam ser examinados na admissão e demissão e uma vez ao ano;

- As Cipa têm mandato de um ano.

8) Recolhimento do FGTS

Como fica:

- As empresas poderão optar pelo adiamento do recolhimento do FGTS;

- Isso valerá para os valores que seriam recolhidos nos meses de abril, maio e junho;

- As parcelas deverão ser pagas em seis parcelas, a partir de julho.

Como era:

- O FGTS tinha de ser pago todos os meses, junto de outros pagamentos feitos pelas empresas, como INSS.

Fontes: Advogados Luiz Antonio dos Santos Junior, do Veirano Advogados; Letícia Ribeiro, do Trench Rossi Watanabe; Alexandre Cardoso, do TozziniFreire, e Rodrigo Takano, do Machado meyer

(Folha de Londrina - 23/03/2020)