Energia Sob forte expectativa das empresas, futuro da licitação de R$ 7 bi começa a ser definido amanhã

Natalia Viri | São Paulo

Há mais de três meses parada no Tribunal de Contas do Município (TCM), a licitação bilionária para melhoria e operação do sistemas de iluminação pública da cidade de São Paulo pode finalmente sair do papel. Segundo informações do tribunal, o relator do processo, João Antônio, pretende apresentar seu voto ao colegiado do órgão amanhã, quando se decidirá sobre a retomada do processo.

O projeto, que pode render ao vencedor mais de R$ 7 bilhões ao longo dos 20 anos de concessão, é aguardado com ansiedade pelo mercado, na medida em que não exige a participação de empreiteiras e pode ser a salvação para as obras públicas em tempos de Lava-Jato. Além disso, será a primeira parceira público-privada (PPP) para iluminação no país, num processo que pode ser replicado por diversas outras cidades.

Apesar da expectativa, contudo, a piora nas condições macroeconômicas desde a previsão inicial de licitação, em junho, traz preocupações quanto ao número de interessados. Com o dólar mais caro e a disparada nas taxas de juros, conseguir financiamento para os R$ 2 bilhões a R$ 3 bilhões em investimentos previstos será uma tarefa mais complicada.

Das onze empresas que apresentaram estudos para a concorrência ao longo do processo de audiência pública, pelo menos uma está fora do jogo. Com o clima ruim para grandes obras, a J&F - que controla, entre outros negócios, o frigorífico JBS -, optou por sair de infraestrutura e concentrar esforços em outros setores, confirmou o porta-voz Miguel Bueno.

A Alumini Engenharia, antiga Alusa, informou que ainda pretende participar da concorrência. Mas, com dificuldades ocasionadas por conta de bloqueio de pagamentos da Petrobras, a companhia perdeu fôlego e entrou em recuperação judicial.

A licitação é a maior do mundo no segmento. Quem levar o contrato terá de trocar de 620 mil lâmpadas pelas de tecnologia LED, mais eficientes, nos cinco primeiros anos do contrato, além criar 76 mil novos pontos de luz na cidade, e implantar uma central de monitoramento remoto.

Pelo edital original, a contraprestação máxima anual é de R$ 366 milhões e será bancada pela Cosip, taxa cobrada nas contas de luz. Ao longo dos 20 anos de contrato, o valor a ser recebido pelas concessionárias pode chegar a R$ 7,33 bilhões - ganha quem oferecer o maior deságio.

Entre fontes que acompanham o projeto, há a expectativa ainda de que haja mudanças no valor dessa contraprestação, por conta do aumento nas tarifas da Eletropaulo, de cerca de 15%, ocorrido em julho. Se a licitação tivesse ocorrido em julho, como previsto, os concessionários já teriam direito a pedir revisão do valor.

Apesar das dúvidas, a americana GE segue animada com a licitação. Foi a companhia que propôs à Prefeitura a realização da licitação na forma de PPP. "A demora não modifica nosso interesse. Estamos bastante interessados, não só nesse processo, mas em outros no Brasil", afirma Rodrigo Martins, presidente da GE Lighting para a América Latina. "Espero que possa sair ainda neste ano", complementa.

O consórcio formado por AES Brasil e Philips também mantém o interesse no projeto, mas não quis dar mais detalhes. Os grupos CPFL Brasil, Brookfield Serviços e Unicoba, que chegaram a elaborar estudos, foram procurados, mas não retornaram o contato.

Com a piora no ambiente de crédito, as multinacionais podem ter alguma vantagem competitiva, na medida em que têm acesso a financiamentos externos, afirma Lucas Sant′anna, sócio de infraestrutura do Machado Meyer Advogados. O BNDES já informou que terá uma linha de crédito voltada para a PPP de iluminação, mas o crédito disponível e as condições ainda não foram acertadas.

A proposta inicial é que os empréstimos correspondam a 70% dos itens financiáveis e tenham prazo de 15 anos. A ideia é estimular a cadeia de produção de componentes para luminárias LED, a exemplo do que hoje já é feito com os fabricantes da cadeia de energia eólica, aponta Marco Aurélio Cabral, engenheiro do BNDES, que participa da elaboração do plano. Em linhas gerais, quanto maior o uso de conteúdo nacional, menores os juros para o concessionário.

Com o atraso da PPP de São Paulo, no entanto, o processo está parado. "Abrimos as solicitações de credenciamento, mas com a licitação parada ainda não temos recebido pedidos", afirma Cabral. Segundo ele, para o banco de fomento, a experiência de São Paulo é crucial para determinar como se dará a política de financiamento para novas licitações.

Apesar da demora e das dúvidas, a percepção é que a licitação será mantida, mesmo que haja pedidos de mudanças no edital por parte do TCM e eventualmente até por uma nova gestão. O projeto era um dos carros-chefe da gestão de Fernando Haddad, que conta com a concorrência para melhorar a iluminação na cidade e gerar uma economia de até 50% no consumo de energia dos postes da capital.

"É um projeto que tem muito sentido, prevê uma economia e que tem como teto o que já é pago hoje", avalia Bruno Werneck, sócio do Mattos Filho Advogados. Ele pondera, contudo, que se São Paulo não agir corre o risco de perder a liderança no processo. "Vitória, Belo Horizonte e Contagem estão com processos bem avançados", afirma.

(Valor Econômico - 06.10.2015, p. B2)

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