A Revista Saneamento Ambiental (www.sambiental.com.br) promoveu, no dia 15 de dezembro, o webinar "Perspectivas do Eólico Offshore no Brasil - A nova fronteira energética”. Transmitido no canal do Youtube da revista, o evento teve como moderador Eugênio Singer, conselheiro da Saneamento Ambiental e Diretor-Geral da Ramboll e as participações de Gabriel Zeitouni, Diretor de Desenvolvimento Técnico da COP, Marcelo Storrer, presidente da Abemar e CEO da Eólica Brasil, Eduardo Wagner, Chefe da Divisão de Licenciamento Ambiental de Energia Nuclear, Térmicas, Eólicas e outras fontes alternativas do Ibama e Ana Karina Souza, Sócia da área de Infraestrutura e Energia do Machado Meyer Advogados

Representante da Abemar, Storrer (que também é empreendedor do projeto Asa Branca, no Brasil) disse que o potencial eólico offshore no País é de 750G até 50 m de profundidade e está concentrado em estados do Norte/Nordeste, como Rio Grande do Norte, Ceará, Amapá, Piauí, Maranhão, Pará e todo o litoral norte em geral, por conta dos ventos locais. Cabo Frio e Búzios, no Rio de Janeiro e os estados do Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Santa Catarina também possuem potencial, mas o maior é o da Costa Norte brasileira. 

Em relação à fronteira energética, a previsão é que tenha uma inserção dessa nova fonte energética por volta de 2025 ou 2026, desde que exista programa de incentivo às eólicas offshore e que seja inserida alteração na lei 10.438/2002, que instituiu o PROINFA. “É o que vai melhor trazer um horizonte de contratação para este mercado”. Segundo Storrer, o segmento de éolica offshore não possui infraestrutura básica portuária, pois não há fabricantes de pás e torres, por exemplo, no Brasil. A infra da eólica terrestre é completamente diferente da offshore, já que os equipamentos são menores. Questionado se o Brasil pode a vir a ser uma potência no mercado de eólica offshore, o executivo disse : “Se tivermos um incentivo, o Brasil tem um potencial enorme no mercado mundial. É incontestável nossa área de águas rasas e a velocidade dos ventos viabiliza o desenvolvimento de projetos”. 

Ana Karina, do Machado Meyer Advogados, comentou sobre a segurança jurídica para projetos no setor offshore brasileiro. “Sob a perspectiva jurídica, não há nenhum impedimento para que haja projetos eólicos offshore com base no marco regulatório atual. Agora, certamente, os projetos eólicos offshore têm algumas particularidades, por estarem localizados em águas públicas, geralmente no mar territorial ou um pouco depois e por causa do grande volume de energia que advém desses projetos, o que na prática exige soluções adequadas de Políticas-Públicas Energéticas (PPE). Inclusive, outras políticas de incentivos já foram adotadas no passado, como, por exemplo, os leilões de energias renováveis por produto/fonte, PROINFA”. 

A representante do Machado Meyer disse que não há impedimentos, mas há oportunidades de aprimoramento e de definição de políticas que seriam muito benvindas para o desenvolvimento desses projetos. Entre as soluções, Ana Karina diz que projetos eólicos offshore não dependem de uma única entidade ou agência e destaca quatro entidades que considera muito importantes: a Aneel – Agência Nacional de Energia Elétrica, que é responsável pela emissão da DRO – primeiro estágio para que o investidor possa tomar algumas iniciativas para desenvolver o projeto e o segundo ponto é que a Aneel é a entidade que irá emitir a outorga para geração de energia; O Ministério de Minas e Energia (MME), responsável por formular a política energética e que determina a formatação dos leilões, detalhamento de preço/requisitos de sistemas. “Ele tem o papel muito importante de trazer para a discussão a importância da inserção desses projetos de eólica offshore”. 

Outro agente é a SPU (Secretaria de Patrimônio da União), que administra e concede o uso de imóveis em áreas de propriedade da União. “Aqui os projetos eólicos offshore têm essa particularidade, pois como há o uso de águas públicas exclusivo para terceiros, ele só pode ser concedido mediante uma celebração de contrato de cessão de uso, precedido de licitação ou com a sua dispensa. E, enfim, o Ibama, que é importante para o desenvolvimento desses projetos. 

O engenheiro Eduardo Vargas, do Ibama, esteve recentemente à frente do Termo de Referência criado para empreendimentos offshore. Segundo ele, o Termo veio dar tranquilidade para o órgão ambiental e para o próprio setor. “Assim que apareceram os primeiros processos de licenciamento para a indústria eólica offshore, consideramos necessário um maior entendimento da causa, já que há uma tipologia nova e até então inexistente no Brasil. Vimos uma oportunidade de construir algo horizontal, com a participação de todos (e não de algo que partisse do Governo) e convidamos profissionais com certo entendimento da inserção destes parques eólicos offshore em regiões marítimas, para, posteriormente, compilarmos os dados com as principais regulamentações de países europeus e do Reino Unido”. 

Vargas diz que uma equipe mutidisciplinar do Ibama foi montada, composta por dez técnicos, entre eles, biólogos, oceanógrafos, especialistas em ciências sociais, engenheiros civis e ambientais. “Conseguimos criar o Termo de Referência com a participação pública no início de 2020, com cerca de 130 contribuições, onde todas foram consideradas”. O representante do Ibama comenta que as contribuições para o Termo de Referência trouxeram uma boa segurança para aquilo que precisa ser levantado dos estudos e para todos que irão se utilizar do Termo, que há uma previsão do que é necessário para aplicar um processo de licenciamento ambiental junto ao Ibama. 

Em relação ao ordenamento costeiro, Vargas acredita que é uma atividade fundamental para que esse meio se consolide no Brasil, pelo fato da existência de um grande conflito de uso, desde o uso artesanal com pequenas embarcações indo realizar pesquisas em alto-mar em até 100km, pesca, uso de rotas e a atividade de extração de petróleo. “Na Europa este ordenamento é mais fácil de ser realizado, devido ao tamanho da costa do continente. No Brasil, se começarmos a fazer este ordenamento com pequenos projetos para depois ir expandindo, seria um bom começo para que tenhamos isso definido”. Os órgãos governamentais e a sociedade civil têm o dever de realizar isto nos próximos anos, não apenas pensando nas eólicas offshore, mas no uso geral da faixa costeira até 20 km. 

Gabriel Zeitouni, Diretor de Desenvolvimento Técnico da COP, comentou que o setor de offshore está, sem dúvidas, mais desenvolvido na Europa, continente que está com 23GW de eólica offshore instalada e também onde nasceram os primeiros parques (Dinamarca). Isto aconteceu porque o Governo dinamarquês começou a atrair estatais para desenvolver projetos de energias renováveis em terra e em alto- mar. Em novembro de 2020, a Comissão da União Europeia lançou um novo plano para eólicas offshore ligado à estratégia do bloco para instalar mais de 60GW até 2030, o que triplicaria essa fonte limpa na Europa. “O próxima milestone pretende instalar 300GW até 2050. Então, a Europa continua a liderar o setor. Foi onde tudo começou e deve expandir de forma significativa projetos de eólicas offshore. Porém, vale destacar que os Estados Unidos também estão se desenvolvendo neste setor e, principalmente, o mercado asiático. Com certeza, a COP e outros players veem um potencial realmente na Ásia de presença offshore e, quem sabe, também na América do Sul e no Brasil”. 

Zeitouni concorda que o potencial brasileiro é grande e propício para o desenvolvimento de eólicas offshore. “Os recursos eólicos são muito bons, com os ventos alísios, além de outras condições, como a grande área marítima sem águas muito profundas (com até 60 m de profundidade), o que viabiliza os projetos com plataformas fixas no fundo do mar. O Brasil tem a seu favor também o fato de não ter eventos extremos, como na Ásia, e, desta forma, facilita a implantação de empreendimentos, pois em regiões com eventos extremos (terremotos, ciclones), o valor a ser investido é muito maior”. 

Em relação à cadeia de suprimentos, o CEO Marcelo Storrer diz que precisa haver investimentos na cadeia de suprimentos no Brasil para este segmento de equipamentos mais pesados. “Estes equipamentos utilizados no mar são bem maiores que os usados na área terrestre e é necessária uma quantidade maior de novas unidades industriais, sem contar nos portos, com uma capacidade superior de armazenamento, com pátios maiores”. Além disso, Storrer comenta que os portos, como o de Pecem, não estão preparados para receber equipamentos de projetos eólicos offshore. “Pecem não está preparado para isto”. Terá que ter um terminal como o Tecon para o setor. É uma condição “sine qua non”. A Abimaq quer apoiar eólicas offshore. Nós trabalhamos para que haja um programa de incentivos nos mesmos moldes do Proinfa e mesmo nível de preço que teve a solar fotovoltaica. 

Sobre o ESG, Ana Karina disse que hoje temos um grande plano de desenvolvimento do setor elétrico, dividido em mais de 15 frentes, dentre as quais uma delas é a governança. Em especial, a governança de participação, da sociedade, para que se possa acompanhar o desenvolvimento do setor. “A matriz energética terá uma cara diferente no futuro. Eólica offshore nos traz benefícios importantes, mas é preciso uma política pública clara”. 

Ana Karina disse que: “Quando tivemos, há 20 anos, o primeiro programa de incentivo a fontes renováveis, tivemos uma decisão de Governo, que decidiu trazer as opções de matriz eólica, biomassa, PCHs, na época, porque se notou que era necessária uma diversidade de matrizes energéticas para daqui a alguns anos”. “Na época, diziam que era um absurdo e não fazia sentido investir nessas frentes. Em solar fotovoltaica, então, nem se falava, já que é algo mais recente. Questionava-se o fato dos investimentos em fontes limpas serem caros, de o Brasil não ter parque de suprimentos, além do fato das hidrelétricas serem o investimento preferencial”. 

Entretanto, os projetos estavam lá, apareceram investidores e o parque de suprimento se desenvolveu. “Hoje, em 2020, temos 10% da matriz energética suprida por projetos eólicos e fotovoltaicos. Temos que trazer uma governança, regulação, um ambiente de política pública que permita que o setor se desenvolva. Pensando na Eólica offshore, precisa de um “empurrãozinho”, de um sinal mais forte de política pública. Os benefícios estão aí e este “empurrãozinho” iria com esse leilão de contratação no mercado regulado com subsídios ou preços pagos na CDE para viabilizar a implantação desses projetos no Brasil”. 

O engenheiro do Ibama comentou que é possível trabalhar com agências de cooperação e programas de bancos na formação de agências multilaterais. “Nós não podemos ter uma cooperação técnica para suprir lacunas de conhecimentos técnicos, mas a diretoria do Ibama de licenciamento ambiental trabalha muito para obter parcerias e realizar cursos. Em 2020 tivemos cursos curtos – uma a duas semanas) para alguns técnicos. Além disso, nós temos uma política de liberação de técnicos para fazer mestrado ou doutorado, o que não é apenas para a área do licenciamento ambiental, mas para todo o Ibama”. 

Em relação à quantidade de recursos técnicos, nós temos perdido nos últimos anos muitos profissionais pela falta de reposição com concursos, mas conseguimos manter a capacidade de produção técnica e de elaboração dos trabalhos que precisam ser feitos dentro do processo de licenciamento ambiental. “Hoje temos nove técnicos na minha divisão para realizar o licenciamento para usinas nucleares, térmicas e eólicas, o que acaba sendo apertado. A cinco, seis anos atrás, nós tínhamos uma média de dois a três processos técnicos, e hoje está acima de sete, mas temos cumprido nosso dever de casa e realizado nosso trabalho”. Wagner diz que se o órgão tivesse um aporte de mão-de-obra capacitada conseguiria cumprir muito mais a contento os objetivos. 

Ele afirma que as análises de processos de licenciamento para o setor offshore teriam gargalos, caso dependesse apenas da divisão onde chefia, porque o trabalho ficaria apertado. Mas ele conta com o apoio dos núcleos de licenciamento ambiental dos estados. “O primeiro estudo de impacto ambiental de uma Eólica Offshore foi uma análise conjunta da minha equipe com a Divisão Responsável por Portos (CE/RN/RS). Temos tido esse apoio dos técnicos que estão nas pontas, com boa capacitação e entendimento, principalmente os que estão nas áreas de inserção dos projetos, pois podem fazer vistoria rápida. Não estamos centralizando as análises apenas em Brasília para dar vazão a todos estes projetos”. 

Gabriel Zeitoune, da COP, falou sobre os investimentos em negócios eólicos. Se são investimentos próprios, de fundos de investimentos, agências multilaterais estão envolvidas e sua visão sobre ESG em energia renovável. “Os investimentos vêm de diferentes atores, como Equinor, Iberdrola, COP, onde atuo, que são fundos de investimentos. Temos a intenção de desenvolver projetos específicos através do Brasil e na maturação de áreas para esses empreendimentos. Investimentos de bancos e agências ao redor do mundo entrariam com o caráter de facilitar a iniciação do setor de offshore de forma geral, além de facilitadores na área financeira”. Em relação a ESG, ele disse que tem diferentes perfis de investidores e desenvolvedores. “Na COP, respeitamos os requerimentos de investidores institucionais com que trabalhamos, principalmente fundos de pensão. Respeitamos critérios ditados por requerimentos locais e internacionais ligados tanto à área de pescadores, como de impactos ambientais, fauna, etc”. 

Veja a íntegra do webinar em https://youtu.be/2GmgsrTl3P0

(Revista Saneamento Ambiental - 21.12.2020)