Por Bárbara Pombo
A 2ª Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a Receita Federal não pode cobrar IPI
sobre mercadorias roubadas que seriam destinadas ao mercado externo. A
discussão entre os ministros foi acirrada, mas prevaleceu o entendimento que
não houve fato gerador porque a mercadoria não foi entregue ao comprador. Há
dois anos, no entanto, em um caso semelhante, a turma havia julgado em sentido
contrário. Naquele caso, porém, os produtos ficariam no mercado interno.
Para o relator do caso,
ministro Herman Benjamin, a segurança é um dever do Estado e, por isso, a
empresa não deve recolher o imposto em caso de roubo ou furto. O ministro
chegou a mudar seu voto durante o julgamento, iniciado em abril e concluído na
quinta-feira. Com esse entendimento, a Souza Cruz Trading conseguiu cancelar
uma autuação fiscal lavrada em 2000, no valor de R$ 115 mil. A empresa teve a
carga roubada no caminho entre Uberlândia (MG) e o Porto de Santos (SP).
Em sua defesa, a empresa
apresentou números para demonstrar o alto índice de roubos e furtos de cigarros
e custos com a segurança no transporte das cargas. Em 2010 e 2011, foram gastos
R$ 54 milhões em serviços de escolta, de acordo com a advogada da empresa,
Janaína Carvalho Kalume, do Eduardo Antônio Lucho Ferrão Advogados Associados.
Só em 2010, foram contabilizados 1.606 roubos e furtos de cigarros da Souza
Cruz. "Por causa disso, a empresa foi autuada diversas vezes", diz a
advogada Cristiane Romano, do Machado Meyer Advogados, escritório que
atua em conjunto na defesa da Souza Cruz. A 1ª Turma do STJ também deverá
analisar a questão neste ano a partir de um outro processo da empresa.
Em nota, a
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que deve recorrer da
decisão. O órgão vai citar, em sua defesa, uma decisão de 2010 da mesma turma
em sentido contrário. Os ministros negaram o cancelamento de um auto de
infração da Phillip Morris. Na ocasião, a maioria seguiu o entendimento do
relator, ministro Mauro Campbell. Ele entendeu que o fato gerador do IPI ocorre
com a saída da mercadoria do estabelecimento do vendedor. "Não se pode
adotar linha interpretativa que transforme o ente público tributante em
segurador universal da atividade econômica desenvolvida por todos os sujeitos
passivos", afirmou o ministro na época. Segundo a PGFN, "o
entendimento, inclusive, corrobora a defesa da Fazenda Nacional para o caso [da
Souza Cruz]".
No caso da Phillip
Morris, porém, a mercadoria seria vendida no mercado interno, o que, para
advogados, justificaria a diferença no resultado dos julgamentos. Isso porque a
exportação daria direito à imunidade tributária ao contribuinte. A autuação
teria ocorrido porque a empresa não comprovou a operação que lhe daria direito
ao benefício. Nas vendas internas, entretanto, o tributo teria deixado de ser
pago.
Para o tributarista
Daniel Correa Szelbracikowski, da Advocacia Dias de Souza, será necessário
esperar a publicação do acórdão para saber se há precedente favorável para os
casos referentes ao roubo de mercadorias vendidas internamente. "O
raciocínio poderá ser aplicado para casos de furto ou roubo de qualquer bem,
destinado à exportação ou não", diz o advogado. Como mudou seu voto, o
ministro Benjamin ainda terá que redigir o acórdão.
Para alguns advogados, o
entendimento adotado pode ser aplicado indistintamente. "A exportação em
si é mais um dado, não é determinante para a questão", afirma Cristiane
Romano, acrescentando que dois ministros seguiram o mesmo raciocínio nos
dois julgamentos. Na época, o ministro Castro Meira chegou a >
Alguns advogados, porém,
defendem a cobrança. Para José Eduardo Toledo, sócio do Gaudêncio, McNaughton e
Toledo Advogados, não há lógica em admitir a isenção de mercadorias roubadas
uma vez que o fato gerador do IPI, de acordo com o regulamento do imposto
(Decreto nº 2.637, de 1998), é a saída da mercadoria do estabelecimento. Na
opinião de Rodrigo Barreto de Faria Pinho, do Guerra, Doin e Craveiro
Advogados, entretanto, é justamente o fato gerador do imposto que foi atacado
no julgamento. "A interpretação foi flexibilizada para admitir a
incidência na saída do produto em decorrência de um negócio jurídico. No caso,
não existe negócio porque houve um roubo", diz.
(Valor Econômico 26.06.2012/Caderno E1)
(Notícia na Íntegra)