O afundamento do solo em áreas de Maceió (AL) próximas à região de mineração de sal-gema da Braskem custará mais caro do que os R$ 2,7 bilhões do acordo com o Ministério Público e outras autoridades anunciado em janeiro. Agora, a petroquímica prevê gastar R$ 3,4 bilhões para solucionar o problema, que ainda depende de negociações individuais com moradores e proprietários de imóveis nos locais considerados de risco.

O montante, que foi provisionado no quarto trimestre, explica o prejuízo líquido recorde de R$ 2,9 bilhões no intervalo. E incorpora o valor previsto no acordo de janeiro - R$ 1,7 bilhão em indenizações e R$ 1 bilhão para o fechamento dos poços cuja situação é considerada mais crítica - e outras despesas estimadas, que ainda vão incorrer. "É a melhor estimativa que a empresa tem hoje para o custo total de Alagoas", disse ao Valor o vice-presidente de Finanças e Relações com Investidores da petroquímica, Pedro Freitas.

Com essa magnitude, o evento geológico em Maceió já custa à Braskem praticamente o mesmo que o acordo de leniência firmado em 2016, após a Operação Lava-Jato revelar a existência de um esquema de pagamento de propina na petroquímica e em sua controladora, a Odebrecht. O reconhecimento desses gastos também tem em comum o estrago provocado no balanço financeiro da empresa, resultando nos maiores prejuízos já registrados pela companhia.

Antes desses R$ 2,9 bilhões, a maior perda trimestral havia sido registrada justamente no mesmo intervalo de 2016, quando foi firmado o acordo leniência de R$ 3,1 bilhões com autoridades do Brasil, Estados Unidos e Suíça - no ano passado, essa conta ficou um pouco mais salgada com os R$ 410 milhões adicionais do acordo com a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Advocacia-Geral da União (AGU). Naquele intervalo, a perda foi de R$ 2,5 bilhões.

O cenário desafiador para a petroquímica mundial se refletiu em queda de 15% da receita líquida da Braskem no quarto trimestre, na comparação anual, para R$ 12,6 bilhões. Já o resultado antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) recuou 45%, para R$ 1,05 bilhão. No acumulado de 2019, a receita líquida caiu 10%, a R$ 52,3 bilhões, e o Ebitda encolheu 31%, para R$ 7,8 bilhões. De acordo com Freitas, apesar da situação "bastante confortável" do ponto de vista de caixa e endividamento, as incertezas geradas pela crise da covid-19 motivaram o saque de linha de crédito de US$ 1 bilhão.

"É um seguro", comentou o executivo, acrescentando que a geração de caixa livre em 2019, de R$ 3 bilhões, foi forte. Ao fim do ano passado, a Braskem tinha perto de US$ 2 bilhões em caixa e essa posição vem se mantendo. Além disso, a Braskem emitiu US$ 2,25 bilhões em bônus no quarto trimestre do ano passado, na maior operação de sua história, e pré-pagou cerca de US$ 2 bilhões em dívidas com vencimento até 2023. Com isso, reduziu a menos de US$ 1 bilhão os compromissos vincendos nesse intervalo.

"Fizemos isso por causa do ciclo de baixa da petroquímica, mas também nos ajuda nesse cenário de covid-19", comentou.

Em outra frente para lidar com os spreads petroquímicos comprimidos, a Braskem reduziu os investimentos na operação e em expansão ao longo de 2019. No ano, foram desembolsados R$ 2,78 bilhões, 16,3% menos do que o previsto inicialmente, ou R$ 3,32 bilhões. Os aportes operacionais ficaram em R$ 1,87 bilhão, redução de 17,4%, e o desembolso estratégico, com destaque para a nova fábrica de polipropileno nos Estados Unidos, totalizou R$ 903 milhões, com queda de 13,7% frente ao que estava planejado inicialmente. No México, a Braskem Idesa investiu o equivalente a R$ 104 milhões, frente a R$ 107 milhões do orçamento original.

Conforme Freitas, a companhia tem percebido aumento na demanda de resinas em determinados segmentos, como o de embalagens, e queda em outras áreas, como as relacionadas à construção civil. Diante disso, ainda não é possível afirmar se haverá necessidade de algum ajuste de produção nas fábricas brasileiras. As unidades mantém produção normal, com efetivo reduzido e medidas adicionais para preservar os trabalhadores, e não houve ruptura na cadeia de suprimentos. "Ainda não está claro qual será o impacto da pandemia nas operações", ponderou.

Na Europa, as restrições à movimentação entre países têm afetado a operação da Braskem, que produz polipropileno na Alemanha. Ali, a taxa de utilização está menor. Nos Estados Unidos, comentou o executivo, o cenário é outro. A demanda pelo PP produzido nas unidades da brasileira é maior do que a capacidade de produção. O PP é o principal plástico na cadeia da saúde, usado na fabricação de máscaras cirúrgicas, aventais de proteção, itens hospitalares, entre outros. (Colaborou Raquel Brandão)


Jornalista: FONTES, Stella

(Valor Econômico - 07.04.2020, p. B3)