O termo desestatização entrou de vez para o vocabulário do setor público no Brasil. Seja no federal, estadual e municipal, a palavra de ordem é tirar do orçamento público o custo com infraestrutura, que exige aporte na casa dos bilhões de reais – dinheiro esse que os poderes executivos não têm para empregar.

Com as concessões e privatizações, e até mesmo em alguns casos de parcerias público-privadas (PPPs), o setor público pretende viabilizar investimentos para o aprimoramento dos serviços à população, gerar empregos e aplicar recursos em áreas essenciais como infraestrutura, saúde, educação e segurança pública.

Mas qual é a diferença entre esses modelos? Privatização é a venda de um ativo público à iniciativa privada. Já concessão trata-se da transferência temporária da prestação de um serviço a uma empresa que, em troca, tem o direito de cobrar tarifa do usuário. PPP, por sua vez, é um contrato de prestação de obras ou serviço, com duração de cinco a 35 anos, entre governo e um terceiro em que este é pago pelo poder público ou em combinação de tarifas cobradas do usuário.

Independentemente da modalidade que se dará o repasse do bem público, é consenso que a iniciativa privada tem know-how, capital e melhores condições para levar adiante os grandes projetos de infraestrutura.

E há muito a ser feito. Segundo o relatório Infraestrutura e Regulação, da série Panorama Brasil, da consultoria Oliver Wyman, de 2018, o Brasil investiu em média 2,2% do Produto Interno Bruto ao ano em programas de infraestrutura entre 2011 e 2016. Para que o país alcançar a universalização dos serviços básicos com mínimo de qualidade, seria necessário quase dobrar o percentual, para 4%, ao longo de 25 anos, indica o estudo.

O levantamento ainda mostra que, se olharmos para trás, a falta de investimento gerou um déficit de 25% do PIB do estoque de infraestrutura nos setores de saneamento, transportes, energia e telecomunicações. Isso significa que seria necessário o aporte equivalente a um quarto do Produto Interno Bruno do Brasil para deixar em boas condições todas as estradas, portos, aeroportos, telecomunicações e energia do país.

Ou seja, a demanda existe e o interesse público em repassar o investimento e a gestão da infraestrutura

à iniciativa privada também. Mas o que é preciso fazer para amarrar as duas pontas? O economista-chefe da Stone e professor de Departamento de Economia da PUC-Rio, Vinícius Carrasco, recomenda cumprir ao menos três tarefas: ajustar a questão fiscal, estabelecer regras claras de regulação e, por último, manter a governança no setor capitaneado por um órgão único no país. "Arrumando esses três pontos, não serão necessários subsídios para financiamento de projetos. O investidor terá retorno adequado, o usuário vai desfrutar de uma infraestrutura de qualidade e os governos terão boas receitas", avalia.

Um passo importante para alcançar esses objetivos, na opinião de Carrasco, foi a indicação de Tarcísio de Freitas para o Ministério de Infraestrutura. Freitas ajudou a montar o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), em 2017, ainda no período de Michel Temer, o que está permitindo ao governo atual mostrar um rápido resultado na agenda de concessões.

Antes mesmo de completar 100 dias de governo, o presidente Jair Bolsonaro já colheu os louros da acertada decisão. Em 15 de março, por exemplo, ele comemorou no Twitter o leilão de 12 aeroportos: "Conseguimos arrecadar valor 10 vezes maior, que será pago à vista. É o Brasil voltando a crescer! Grande vitória!", escreveu. Com grande predomínio de empresas estrangeiras, a União arrecadou R$ 2,4 bilhões de outorga, R$ 2,2 bilhões acima do mínimo estabelecido.

Se mantida somente a agenda herdada de seu antecessor, por meio do PPI, a previsão de investimentos nos próximos anos gira em torno de R$ 113,6 bilhões. O plano inclui as concessões de um trecho da Ferrovia de Integração Oeste-Leste, a Ferrogrão (que liga o Mato Grosso ao Pará), além de rodovias no Sul, Sudeste e Centro-Oeste.

Para especialistas no assunto, chamar a iniciativa privada para assumir projetos de infraestrutura é a única saída a ser buscada. "Não há outra opção, a não ser buscar um parceiro privado para assumir áreas chaves do país, como ferrovias, portos, rodovias. Esse é o caminho que qualquer país desenvolvido trilhou ou trilha", reforça o advogado Mauro Penteado, sócio de infraestrutura do Machado meyer Advogados e presidente da Comissão de Infraestrutura do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial.

Um levantamento do G1, publicado em janeiro passado, identificou 229 projetos de desestatização em curso no país nas três esferas. E esse número continua crescendo. Entre os estados mais adiantados nesse processo está o de São Paulo. O governador João Doria já deixou clara a diretriz da sua política de parcerias: menos Estado e mais investimentos da iniciativa privada em obras, operação e serviços.

Ao todo, são 23 projetos aprovados pelo Conselho Gestor de PPPs e Concessões paulista que devem gerar um investimento de cerca de R$ 40 bilhões. Os projetos estão em diferentes estágios, parte deles ainda na fase de estudos. Metade desse pacote refere-se a transporte e mobilidade. Do total, apenas dois dificilmente fugiriam de um modelo de PPP: presídios e o trem intercidades. Outro edital recente lançado pelo Governo do Estado de São Paulo foi para revitalizar, modernizar e dar manutenção para as marginais Pinheiros e Tietê.

Buscar parceiros para melhorar a mobilidade urbana paulista também está no horizonte próximo dos administradores. Em agosto, o governo do Estado vai inaugurar um escritório comercial em Xangai, na China, com o objetivo de estreitar as relações com aquele país. Doria já anunciou que pretende oferecer aos chineses, em especial, 139 quilômetros da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e 79 quilômetros de metrô, assim como concessões em 20 aeroportos, hidrovias e ferrovias.

A administração estadual está ávida em fechar boas parcerias e movimentar a economia. A população espera melhores serviços, modernos, inovadores e de fácil acesso. Ao mesmo tempo, queremos atrair investimentos para o estado de São Paulo porque é a única forma de gerar emprego e renda. São Paulo e o Brasil precisam retomar o círculo virtuoso do desenvolvimento", destaca o vice-governador Rodrigo Garcia.

A movimentação para diminuir os custos do Estado com infraestrutura já está em andamento em São Paulo. No mês de março, aCCR ganhou a concessão por 20 anos da operação da Linha 15 – Prata, do monotrilho, na capital paulista, que até então era administrada pelo Metrô de São Paulo.

Em linha com essas propostas também está a Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos), que, em abril passado, apresentou a Agenda de Governo 2019-2022 do setor metroferroviário brasileiro aos ministérios e agências reguladoras. O objetivo é ampliar as redes de trens e metrô e melhorar a conexão aos ônibus e outros modais de transporte público no Brasil, atacando um dos principais desafios do planejamento urbano.

A estimativa da entidade é que nos próximos quatro anos mais 164 quilômetros de sejam concluídos pelo país. Mas o potencial é bem maior. Conforme a ANPTrilhos, o Brasil tem um banco de projetos de mais de 540 quilômetros de linhas de sistemas de transporte de passageiros sobre trilhos (trens, metrôs, aeromóvel e VLTs) que aguardam a contratação, parte já com estudos de viabilidade concluídos, com potencial para sair do papel até 2023.

No segmento de estradas, a expectativa também é otimista. Depois de uma retração no setor nos últimos anos, o período entre 2019 a 2022 indica que será promissor para as empresas do setor. Conforme dados da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), nesse intervalo ao menos oito trechos serão licitados em todo o país com investimento mínimo de R$ 47,4 bilhões. Está prevista ainda a relicitação de contratos próximos do fim, como a Dutra (Rio de Janeiro-São Paulo), a Concer (Rio-Juiz de Fora) e a CRT (Rio-Teresópolis). "Precisamos voltar a investir com uma visão de país e de longo prazo, na qual concessão seja entendida como uma prestação de serviço ao usuário, e não como privatização ou apenas construção. É fundamental que se crie um ambiente favorável e efetivamente atraente para investidores locais e internacionais de forma a retomarmos o crescimento do setor, base para o desenvolvimento do Brasil”, destaca César Borges, presidente da ABCR.

Um indicativo de que os próximos anos serão positivos para o setor de infraestrutura foi a retomada das grandes concessões, como a vencida pelo Grupo CCR da Rodovia de Integração do Sul, que entrou em operação em fevereiro passado. Batizada de CCR ViaSul, a concessionária administra 473 quilômetros de trechos das rodovias BR-101, BR-290 e BR-448, no Rio Grande do Sul.

- Concessão da rodovia BR-364 entre Porto Velho, em Rondônia, e Comodoro, em Mato Grosso.

Trecho concedido: 806 quilômetros

Investimento: R$ 8 bilhões

Previsão de leilão: 2020

- Concessão das rodovias BR-152, BR-282, BR-470, em Santa Catarina, e também da SC-412, entre os municípios de Irani, Campos Novos e Navegantes.

Trecho concedido: 544 quilômetros

Investimento: R$ 9 bilhões

Previsão de leilão: 2020

- Concessão das BR-080, BR-153 e BR-414 entre Anápolis, em Goiás, e Aliança do Tocantins, em Tocantins.

Trecho concedido: 852 quilômetros

Investimento: R$ 4,3 bilhões

Previsão de leilão: 2020

- Concessão das rodovias BR-364 e da BR-365, entre Jataí, em Goiás, e Uberlândia, em Minas Gerais.

Trecho concedido: 437 quilômetros

Investimento: R$ 2 bilhões

Previsão de leilão: ainda em 2019

- Concessão de três trechos: da CRT BR-116, no Rio de Janeiro, a partir do entroncamento com a BR-040, até a divisa com Minas Gerais, próximo de Além Paraíba, a Concer BR-040, entre Juiz de Fora e Rio de Janeiro, e a NovaDutra BR-116, entre Rio de Janeiro e São Paulo.

Trecho concedido: 725 quilômetros

Investimento: R$ 20,1 bilhões

Previsão de leilão: 2020

- Concessão da rodovia BR-101 entre os municípios de Paulo Lopes e São João do Sul, em Santa Catarina.

Trecho concedido: 220 quilômetros

Investimento: R$ 4,1 bilhões

Previsão de leilão: ainda em 2019

Fonte: Ministério de Infraestrutura

- Concessão de 12 trechos de rodovias estaduais no Lote Piracicaba – Panorama.

Trecho concedido: 1.201 quilômetros.

Investimento: R$ 9 bilhões

Previsão de leilão: ainda em 2019

- Concessão das marginais Pinheiros e Tietê, englobando o trecho da Raposo Tavares até o km 34 na capital.

Investimento: R$ 3 bilhões

Em fase de estudos

- PPP no Trem Intercidades de São Paulo até Americana, com paradas em Jundiaí e Campinas.

Trecho concedido: 137 quilômetros

Investimento: R$ 7 bilhões

Previsão de leilão: 2020

- Concessão do Complexo do Ginásio do Ibirapuera e da Fundação Zoológico e Jardim Botânico.

- PPP para administrar quatro novas unidades prisionais que estão em construção

Fonte: Governo do Estado de São Paulo

Privatização - É a venda de um órgão ou empresa das prefeituras, dos Estados ou da União para a iniciativa privada em um leilão público. Transfere-se para empresas a obrigação de executar um conjunto de serviços para empresas.

Concessão - É a transferência temporária, para a iniciativa privada, da responsabilidade de oferecer um serviço (como a conservação de uma rodovia, por exemplo) à população. Esse processo ocorre em um prazo definido, que pode ou não ser renovado. Em troca, a concessionária ganha o direito de cobrar uma tarifa (como o pedágio) dos usuários do serviço.

Parceria Público-Privada (PPP) - O poder público assina, com a iniciativa privada, um contrato para uma obra ou para a prestação de serviço por um prazo determinado. Em troca, a empresa obtém o retorno pelo investimento por pagamentos do governo ou pela combinação de cobrança de tarifa com recursos públicos.

O Globo
https://g1.globo.com/especial-publicitario/inovacao-em-movimento/ccr/noticia/2019/05/22/concessoes-privatizacoes-e-ppps-crescem-para-pais-avancar-em-infraestrutura.ghtml
(Notícia na Íntegra)