São Paulo, 23/07/2012 - Apesar de
faltarem menos de seis meses para entrar em vigor a nova legislação que em tese
coloca um ponto final na chamada “guerra dos portos”, os envolvidos nos
processos (empresas, advogados e BNDES) ainda tem dúvidas com relação ao seu
impacto efetivo. Cálculos preliminares de fontes do setor indicam que o
Espírito Santo poderá perder cerca de 30% do volume de contêineres que
movimenta hoje e em Santa Catarina a perda pode atingir 15%.
Na área jurídica, alguns advogados
acreditam que persistem brechas na legislação para a oferta de outros
benefícios fiscais. O próprio governo ainda tenta descobrir quanta carga deve
deixar de entrar no País por portos como os de Santa Catarina e o Espírito
Santos, os mais afetados com a mudança. O Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) encomendou um estudo à consultoria Booz Allen com
essa intenção, mas ele ainda não está pronto. O BNDES deve liberar recursos
especiais aos Estados afetados para compensar a perda de receita que terão em
consequência da nova lei.
As empresas que operam terminais
também alegam ainda não saber qual será o impacto na movimentação de cargas e,
procuradas pela reportagem da Agência Estado, se recusaram a falar a respeito.
Segundo dois profissionais que aceitaram falar sob a condição de anonimato,
acredita-se que no Espírito Santo a perda de 30% na movimentação de contêineres
equivale a aproximadamente 200 mil TEUs (unidade de medida equivalente a um
contêiner de 20 pés). Em Santa Catarina, a perda pode ser de 10% a 15% do total
de contêineres movimentados, o que também equivale a cerca de 200 mil TEUs.
Entre as empresas de capital aberto que operam terminais de contêineres nesses
dois Estados estão a Log-In, a Triunfo e a Santos Brasil.
No final de abril, após infindáveis
debates e discussões, o Senado aprovou a resolução número 13/2012 que determina
que, a partir de janeiro de 2013, a alíquota do Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS) cobrada dos produtos importados seja de 4% nas
operações interestaduais (quando chegam por um Estado e são enviadas a outro).
Atualmente, o porcentual varia entre 7% e 12%.
Com a redução, a intenção do governo
é inviabilizar os incentivos ficais que vinham sendo concedidos por alguns
Estados. Santa Catarina e Espírito Santo, por exemplo, por meio de uma
engenharia financeira (principalmente no Estado do Sudeste), na prática cobram
uma alíquota que varia entre 3% e 4% nessas operações. Isso significa que, para
continuarem oferecendo benefícios fiscais, terão a partir de janeiro de reduzir
a alíquota para próximo de zero, ou seja, não arrecadar quase nada com esse
imposto.
Pela lógica, a mudança deve fazer com
que os produtos importados passem a entrar no País pelos portos dos Estados
onde estão os principais consumidores. São Paulo, obviamente, é o que mais deve
sair ganhando. Já Santa Catarina e o Espírito Santo, que hoje oferecem
benefícios fiscais para os importadores usarem seus portos, devem ver o volume
de carga diminuir significativamente.
No caso do Espírito Santo, o Terminal
Vila Velha (TVV), operado pela Vale, através da Log-In, é que deve ser mais
afetado com a migração da carga para outros portos. Mas isso pode não ser uma
má notícia. “O TVV opera hoje perto do limite da sua capacidade. Se houver
diminuição do volume de carga, ele poderá operar com mais eficiência e, dessa
forma, ter até mais espaço para cobrar taxas mais altas”, afirma o executivo de
uma empresa concorrente.
A esmagadora maioria dos carros
importados no Brasil - mais de 80% - também chega pelo porto do Espírito Santo,
mas pessoas consultadas pela reportagem acreditam que isso não deve mudar, pelo
menos no curto e médio prazo. “Não há hoje outro porto brasileiro com espaço
suficiente para esses carros ficarem parados até serem desembaraçados na
alfândega”, afirma uma delas. “Além disso, lá já estão instaladas empresas
especializadas no desembaraço de veículos e no seu transporte para outros
Estados.”
Há questionamentos se o porto de
Santos, o mais movimentado do País e que atende o maior centro consumidor do
Brasil, que é o Estado de São Paulo, terá condições de receber a carga que
tende a deixar de entrar pelos portos catarinenses e capixabas. “Ao contrário do senso
comum, Santos tem, sim, como absorver 100% desse volume extra, se necessário.
Ainda há problemas, claro, mas o
risco de gargalo não é tão grande assim em Santos como se costuma falar”, diz o
consultor Emerson Colin, da Verax, consultoria que já realizou vários estudos
sobre o setor portuário brasileiro.
Um indicativo de que Santos tem
capacidade de absorver o volume de contêineres que pode migrar dos portos de
Santa Catarina e Espírito Santo é o fato de que deve ser inaugurado no primeiro
semestre de 2013 a área do Brasil Terminais Portuários, que permitirá a
movimentação de mais 1,2 milhão de TEUs - três vezes mais do que deve deixar de
ser movimentado em Santa Catarina e Espírito Santos juntos. A BTP é uma joint
venture entre as empresas Terminal Investment
Limited (TIL) e APM Terminals.
(Silvana Mautone - Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.)
Especial: legislação continua com
brechas para novos incentivos fiscais
São Paulo, 23/07/2012 - O fim da
guerra dos portos é questionado por alguns especialistas em direito tributário.
Devido à complexidade da legislação brasileira, alguns acreditam que a medida
aprovada pelo Senado em abril não será suficiente para eliminar de vez os
benefícios fiscais oferecidos por alguns Estados para a importação de
mercadorias.
Como a mudança proposta pela
resolução número 13/2012 se refere apenas ao Imposto Sobre Circulação de
Mercadorias (ICMS) cobrado nas operações interestaduais, alguns advogados
acreditam que continuam brechas para a oferta de outras vantagens tributárias.
A nova lei passa a valer a partir de janeiro de 2013.
′Na entrada do produto
importado, os Estados cobram geralmente 17% ou 18% de ICMS. Pode ser que passem
a oferecer redução na cobrança desse imposto′, diz a advogada Fernanda Sá
Freire Figlioulo, do escritório Machado Meyer Sendacz Opice.
Outra questão é o acúmulo de
créditos. Como a legislação do ICMS impede a tributação ′em cascata′, no caso
de uma empresa que importe um produto e o venda a uma companhia em outro
Estado, na maioria dos casos ela acumulará um crédito de ICMS de 14%, já que
pagará 18% na entrada da mercadoria no País e outros 4% na venda interestadual.
′O problema é que hoje já é difícil
conseguir usar esses créditos de acordo com a legislação de cada Estado. Se
mais empresas acumularem crédito com a nova norma, a situação só tende a
piorar′, diz Carlos Eduardo Garcia Ashikaga, sócio do escritório De Goeye
Advogados Associados, especializado em direito tributário e comércio exterior.
Ele ressalta ainda que, ao contrário
do que o governo espera, mesmo que acabem ou sejam reduzidos os benefícios
fiscais de ICMS, algumas empresas podem considerar mais vantajoso continuar
importando por intermédio de tradings estabelecidas em outros Estados, não
realizando importações diretas.
A explicação: se o produto chegar por
São Paulo, por exemplo, a cobrança do ICMS na importação é, em regra, de 18% e,
atualmente, se a venda for feita para uma outra empresa localizada em um outro
Estado, a tributação do ICMS é de 12%, ou seja, o importador fica com crédito
de 6%. A partir de janeiro, não haverá mudança no ICMS de 18% incidente na
importação, mas, pela nova legislação, quando a mercadoria for vendida para uma
empresa situada em outro Estado, a tributação será de 4%, ou seja, o importador
ficará com um crédito maior, de 14%.
′Por isso não é possível dizer que a
resolução do Senado acaba com a guerra dos portos. Cada caso é um caso. Os importadores
têm de refazer seus cálculos, porque pagar mais caro pode deixá-los fora do
mercado′, diz. (Silvana Mautone - Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.)
(Agência Estado 23.07.2012)
(Notícia na Íntegra)