Sócio da área de Infraestrutura do Machado Meyer Advogados e especialista em aviação, Fabio Falkenburger trabalha com fusões e aquisições de empresas aéreas e compra de aeronaves. Ele avalia que a associação entre Embraer e Boeing para criar uma nova empresa no Brasil é lógica e fará bem às duas companhias, respondendo a um movimento semelhante ao das principais competidoras no segmento de aviação regional.

O acordo entre a Boeing e a Embraer é o melhor para a empresa brasileira?

É um acordo que faz todo o sentido do ponto de vista mercadológico. O mercado sempre teve um duopólio dentro das faixas de aeronaves, com Boeing e Airbus nas aeronaves maiores, e Embraer e Bombardier nas de médio porte e, na medida em que se tem uma associação entre Airbus e Bombardier, faz sentido manter este racional mercadológico, até porque, caso contrario, a Embraer estaria em desvantagem competitiva em relação à Bombardier, que se beneficia de toda a infraestrutura de serviços, compras e vendas da Airbus. Então, do ponto de vista de como é dividido o mercado, faz sentido.

O que a Embraer ganha?

Primeiro, o acesso a todos os fornecedores da Boeing, que beneficia na escala de compras e preços. Dependendo de como forem amarrados os contratos de tecnologia, também de alguma tecnologia da Boeing. E também financeiramente. Está sendo pago um valor relevante e ela ainda terá dividendos, partindo do pressuposto do aumento de participação do mercado. É preciso lembrar que a Embraer ainda mantém os negócios de aviação executiva e de defesa, que podem de certa forma também se beneficiar da escala da Boeing, ainda que indiretamente.

O que a Boeing ganha?

Acesso a este mercado de aeronaves de médio porte, que não tinha. Ganha, também dependendo de como forem amarrados os contratos, com o acesso à tecnologia da Embraer, e muito com o corpo técnico da Embraer, que é de excelência reconhecida.

O acordo entre Airbus e Bombardier deu um empurrão ao negócio?

Acredito que sim. O timing casou bastante.

Quais são os pontos que ainda precisam ser melhor esclarecidos?

Está tudo bem divulgado no mercado. A transferência de tecnologia é um ponto sensível e imagino que deve ter sido muito debatido, inclusive pelo governo brasileiro, que criou um grupo de trabalho de várias áreas para analisar os diversos pontos, até permitir ao governo, com segurança, aprovar o negócio, observando as questões estratégicas e de soberania.

Como avalia o fato de a área de defesa da Embraer ter ficado fora do negócio?

Imagino que tenha sido uma das condições do governo para aprovar. Acesso à tecnologia estratégica de defesa é um ponto de preocupação. Portanto, isso deve ter sido colocado como uma condicionante. E faz sentido.

E em relação à área de jatos executivos?

Me parece que não é um nicho que a Boeing atue de forma relevante. Creio que a ideia é mesmo focar na aviação comercial, onde ambas atuavam, sem competir uma com a outra.

O argumento de que elas são complementares é valido, então?

Sim, elas não concorriam nos mesmos produtos. A menor aeronave da Boeing não compete com a maior da Embraer. Pensando como companhia aérea, faz sentido ter aeronaves para voos de grandes distâncias e de aviação regional. Isso ajuda nas negociações. Oferecer solução conjunta, com custos menores e frota homogênea.

O governo, que tinha o poder de veto, autorizou o negócio. No futuro, a Embraer pode vender os seus 20% restantes. Necessitaria de um novo aval?

Estamos falando de uma nova empresa. A golden share (ação especial que dá poder de veto) faz referência à Embraer, que continua existindo. A nova empresa não vai ter a participação do governo. Creio que não terá a figura da golden share.

Como está o nicho de aviação regional?

É um mercado muito relevante, porque você tem aeronaves menores, com custos menores, e demanda reprimida em algumas regiões, onde pode crescer muito, como o próprio Brasil. Pode ter um mercado mais promissor em pontos que hoje não são atendidos. O mercado americano é bastante forte. No europeu também existem distâncias menores, assim como na Ásia e na Rússia. Há espaço para a aviação regional crescer.

Se não fosse feito o acordo, a Embraer teria o seu futuro ameaçado?

Não acho que teria o futuro ameaçado, até pelo mercado que a Embraer tem e a excelência dos produtos e profissionais. Mas, sim, teria mais dificuldades de competir no mercado, que além da Bombardier tem outros entrantes, como a Mitsubishi e a Honda, produzindo aviões que poderiam competir com algumas aeronaves da Embraer. Não que ela fosse acabar se não houvesse a associação. Tem nome forte no mercado e base de clientes consolidada.

Zero Hora
https://gauchazh.clicrbs.com.br/colunistas/marta-sfredo/noticia/2019/01/ha-espaco-para-aviacao-regional-crescer-cjr5f071m003101nxzz3zlh1h.html
(Notícia na Íntegra)