Por Paulo Silvestre de Oliveira Junior
Dentre tantas considerações fundamentais que foram evidenciadas em decorrência do novo normal e que foram provocadas pela pandemia, está a importância da inovação e da aplicação prática da tecnologia no setor jurídico. Fatores que se mostraram essenciais nos dias de hoje para sobrevivência dos negócios e para o futuro das atividades jurídicas.
A crise atual deixou clara a extrema importância de nos apoiarmos na tecnologia para que as operações se mantenham em pleno funcionamento. Antes mesmo disso tudo acontecer, o setor jurídico já estava em transformação, em virtude das demandas econômicas, demográficas, tecnológicas e competitivas. E essas demandas continuarão a influenciar o setor, talvez até com mais força, em virtude do resultado da crise. Apesar disso, pesquisas recentes demonstram que advocacias e departamentos jurídicos ainda estão longe de uma realidade satisfatória. Neste artigo, vou abordar algumas considerações sobre o atual cenário da tecnologia no setor jurídico.Qual a percepção do setor jurídico sobre uso da tecnologia no momento atual?
De acordo com a pesquisa realizada pela Wolter Kluwer, de fato, o setor jurídico tem percebido cada vez mais a importância de inovar os seus processos internos e da aplicação da tecnologia na execução de suas atividades para prestar um serviço que atenda às expectativas dos clientes.
O objetivo dessa pesquisa foi reunir informações, a partir de dados obtidos com advocacias e departamentos jurídicos, para entender como será o futuro do trabalho dos profissionais do Direito, uma vez que o setor, assim como tantos outros, tem passado por mudanças importantes nos últimos tempos.
Veja a seguir, alguns dos resultados mais relevantes evidenciados pela pesquisa 2020 Future Ready Lawyer | Wolter Kluwer:
53% das advocacias e 65% dos departamentos jurídicos disseram que a maior barreira para avançar com as transformações está na resistência às mudanças por parte da liderança;
76% dos profissionais do setor acreditam que a tecnologia terá um papel cada vez mais relevante, apenas 28% disseram estar preparados;
81% dos departamentos jurídicos pretendem exigir que as advocacias apontem como estão aplicando a tecnologia para aumentarem a eficiência e eficácia até 2022 - isso é o dobro do percebido atualmente;
75% das advocacias darão maior ênfase em inovação;
62% dos sócios de advocacias indicaram que a lucratividade aumentou ao aplicar a tecnologia nas atividades jurídicas.
Com isso, podemos concluir que nos próximos anos as advocacias deverão acelerar as iniciativas de inovação. Além disso, fica evidente, já no momento atual, que uma das maneiras mais eficientes para que os profissionais consigam se adaptar em tempo hábil à essa transformação, é crucial ter um plano para abordar e superar questões organizacionais e as lacunas de habilidades para garantir que qualquer iniciativa seja implementada com sucesso. À medida que essas transformações avançam no setor jurídico, o foco deve estar nas pessoas para que estejam habilitadas para apoiar a organização a prosperar nesse novo cenário. Afinal, a capacidade de usar a tecnologia para otimizar as atividades jurídicas nunca foi tão importante.
Quais aprendizados podemos extrair da crise?
A pandemia causada pelo novo coronavírus forçou muitos profissionais a encararem uma nova realidade. E nesse sentido, vale observar outro ponto bastante importante: muitos profissionais resistem ao novo.
Como observamos na pesquisa, há uma parcela significativa que reconhece a importância do papel da tecnologia no setor jurídico. Porém, a outra parcela ainda resiste às mudanças que essas transformações impõem, ou seja, nem sempre conseguem olhar o escritório como parte de algo maior e integrado, isso ainda representa um grande obstáculo.
Essa crise serviu como alerta para muitos, demonstrando a urgência de se atualizar em relação ao uso das ferramentas tecnológicas. Aliás, é isso que percebemos com a pandemia: aqueles profissionais que tendem a avaliar o todo e procuram se manter atualizados sobre as inovações que acontecem no setor, estão se sobressaindo neste cenário de crise.
Por isso, deve-se sempre ter em mente a necessidade de abandonar a ideia de tratar questões tecnológicas com superficialidade ou como se não fosse algo próprio para o setor.
Para ser capaz de aplicar mudanças positivas, que proporcionem mais eficiência, eficácia, segurança e uma melhor gestão é preciso se dedicar a adquirir um conhecimento substancial sobre o assunto.
Afinal, mudanças precisam de comprometimento e principalmente capacidade de agir estrategicamente.
Como a tecnologia interage com o setor jurídico?
É necessário reconhecer que a tecnologia e as práticas do Direito estão cada vez mais íntimas. Inclusive, tem crescido o número de advocacias que já surgem como "nativos digitais".
Não é somente dentro das advocacias que podemos perceber resultados positivos: o judiciário também está colhendo os benefícios da transformação digital. Como resultado, eu, você e todos os envolvidos contribuímos para tornar a justiça mais célere em nosso país.
Há algumas décadas, quando existiam poucos recursos tecnológicos e os que estavam disponíveis eram extremamente caros, era mais fácil de compreender os motivos pelos quais muitas organizações não procuravam promover algum tipo de inovação.
Entretanto, atualmente temos um aparato tecnológico imenso à nossa disposição. Todos os dias surge algo novo e esse desenvolvimento aprimorado permite que qualquer organização possa usufruir dos benefícios. E sem ter gastos elevados, graças a possibilidade de personalização. Mas para obter resultados, é preciso parar de adiar decisões e negligenciar a importância da tecnologia no setor jurídico.
O momento pelo qual o mundo está passando é extremamente complicado, mas pode ser usado como oportunidade para ações na prática. Relembrando a pesquisa acima, não faz nenhum sentido pertencer aos 78% que reconhecem o papel da tecnologia e nunca chegar a integrar os 28% que estão prontos e, por consequência, os que conseguem obter os melhores resultados.
Todo profissional deve se dedicar a acompanhar as mudanças que estão acontecendo em sua área. Quanto mais inteirado dos processos, mais vantagens e menos dificuldades ele terá com a inserção da tecnologia em sua rotina.
Com disposição, não vai demorar para que os seus benefícios sejam percebidos, como ter seu trabalho potencializado pela tecnologia, maior eficiência e gerar ainda mais valor para os seus clientes.
Portanto, quando eu passo a considerar a inovação como um fator estratégico em minha advocacia, estou direcionando minhas ações para um futuro mais ágil e mais sólido em um mercado cada vez mais competitivo. A tecnologia é uma grande aliada, para não dizer à única que pode alavancar qualquer organização e nunca podemos nos esquecer disso.
Acredito que muitas das adaptações que o setor jurídico teve que enfrentar em resposta imediata à crise desencadearam mudanças que reconfigurarão permanentemente o cenário jurídico. Além disso, e sem querer minimizar a dor e o sofrimento que essa crise causou para muitos, acredito que muitas das mudanças que surgirão serão para o aprimoramento do sistema jurídico e, principalmente, para aqueles a quem se destina servir.
*Paulo Silvestre de Oliveira Junior é consultor de Inovação e Desenvolvimento no escritório Machado Meyer Advogados. Especialista em Inovação Estratégica e Transformação organizacional.
(Migalhas - 02.07.2020)