A Superintendência de Seguros Privados (Susep) publicou duas consultas públicas com minutas de resolução, elaboradas pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), que sugerem importantes mudanças para o mercado de seguros.
A Consulta Pública Susep 2/25, publicada em 15 de agosto, trouxe propostas para regulamentar as operações de proteção patrimonial mutualista. Já a Consulta Pública Susep 5/25, publicada em 17 de setembro, apresenta minuta de resolução que visa a modernizar o regime jurídico dos corretores de seguros, de proteção patrimonial mutualista, de capitalização e de previdência complementar aberta.
Resolução sobre as operações de proteção patrimonial mutualista
A minuta de resolução contida na Consulta Pública Susep 2/25 reflete o compromisso regulatório de consolidar as operações de proteção patrimonial mutualista no mercado, ao propor regulamentar parcialmente a Lei Complementar 213/25, que introduziu oficialmente essas atividades no mercado securitário brasileiro, estabelecendo diretrizes e regras para os players do setor.
O normativo proposto visa a proporcionar maior segurança jurídica e prudencial, protegendo os interesses dos participantes e garantindo o equilíbrio econômico-atuarial de operações que, até então, cresciam sem supervisão adequada.
A operação de proteção patrimonial mutualista, com estrutura menos robusta que a de seguros, consiste, de acordo com definição contida na proposta, na associação de pessoas (grupos) para compartilhar riscos patrimoniais definidos. Os associados rateiam despesas, analogamente às indenizações de seguradoras, aplicando a teoria de pulverização de riscos entre participantes (solidariedade) e cobertura de riscos por um fundo comum (mutualismo).
Nesse arranjo, a associação atua no interesse legítimo de seus membros, podendo prestar apoio operacional a sua administradora. Seu papel se assemelha, portanto, ao de um estipulante – o que é expressamente previsto no artigo 58 da proposta, desde que observadas as regras aplicáveis a esse stakeholder.
Os grupos mutualistas que integram a associação deverão ser compostos por, no mínimo, mil participantes ativos, para garantir a pulverização de riscos subscritos e diminuir a exposição a riscos econômico-atuariais.
A norma proposta, entretanto, permite grupos menores, desde que atendam a hipóteses excepcionais previstas (viabilidade técnica, sustentabilidade atuarial e ciência dos participantes sobre oscilações de rateio).
Por sua vez, as administradoras de proteção patrimonial mutualista, contratadas pelas associações para gerenciar as operações, devem ser constituídas como sociedade anônima, com a expressão "administradora de operações de proteção patrimonial mutualista" em sua denominação social. O objeto social deve ser voltado exclusivamente para essa função e a atuação da sociedade está sujeita à autorização prévia da Susep.
Essas administradoras detêm a capacidade legal para firmar contratos de participação, administrar recursos e provisões e assegurar o cumprimento de regras prudenciais, como capital mínimo e investimento com ativos garantidores e ativos livres.
A minuta normativa também abordou o contrato de participação, que serve como instrumento de adesão. Esse contrato, que dá mais objetividade aos elementos da Lei Complementar 213/25, deve conter elementos mínimos obrigatórios (como regras de funcionamento do rateio, prazos e formas de pagamento das contribuições, informações de seguro e resseguro contratados para o grupo). Deverá ser conferido ao corretor de seguros a possibilidade de atuar na angariação de contratos em grupos de proteção patrimonial mutualista.
A minuta estabeleceu ainda o prazo máximo de 90 dias para a regulação e liquidação de eventos, assegurando ao participante acesso a informações completas sobre reparos, salvados e rateios.
É importante ressaltar que o CNSP definiu os ramos que poderão ser explorados nas operações de proteção patrimonial mutualista, restringindo-se taxativamente a:
- danos patrimoniais de casco de veículos automotores de vias terrestres que, de forma isolada ou combinada, garantam diferentes riscos a que esteja sujeito o veículo protegido;
- danos patrimoniais de responsabilidade civil a terceiros, decorrentes de acidentes envolvendo o veículo automotor de via terrestre protegido; e
- assistências, desde que relacionadas diretamente com os danos patrimoniais garantidos.
Destaca-se, ainda, que as administradoras de operações de proteção patrimonial mutualista estarão sujeitas às normas e às instruções dos órgãos regulador e fiscalizador de seguros, inclusive ao regime sancionador.
As sanções, que variam de advertências e multas à inabilitação de administradores, serão aplicadas pela Susep por meio de processo administrativo sancionador e reforçam o controle estatal sobre a integridade e solvência das operações. Com isso, as responsabilidades dos administradores das seguradoras se estendem aos profissionais que desempenham função equivalente nas administradoras.
Resolução sobre os corretores de seguros e entidades autorreguladoras
A minuta de resolução trazida pela Consulta Pública Susep 5/25 moderniza a regulamentação dos corretores de seguros e é resultado das inovações promovidas por duas leis:
- Lei 14.430/22, que atualizou a disciplina legal do corretor; e
- Lei Complementar 213/25, que abriu novos horizontes para os corretores ao disciplinar operações de proteção patrimonial mutualista e cooperativas de seguros.
Assim, em alinhamento à Lei 4.594/64 (que disciplina a profissão dos corretores de seguros), a minuta prevê a possibilidade de haver habilitação segmentada, de acordo com as condições e interesses mercadológicos de cada corretor.
A proposta permite ao profissional atuar em ramos específicos, de acordo com critérios que serão regulamentados pela autarquia. Além disso, o corretor de seguros deverá ter um único registro, que lhe permitirá atuar em todo o território nacional, nos limites de sua habilitação técnico-profissional. O profissional será identificado por um código de registro, fornecido no ato do registro e na forma regulamentada pela Susep.
Ressalta-se que esse registro poderá ser realizado tanto diretamente pela Susep, como por entidades autorreguladoras, de acordo com a Lei 14.430/22 – que reforçou as previsões sobre autorreguladoras já existentes no arcabouço legal e regulatório.
Para cumprir corretamente o exercício regular do corretor de seguros – e de acordo com o artigo 14 da minuta normativa –, os corretores de seguros devem manter seu cadastro atualizado, respeitando os prazos a serem estabelecidos no âmbito regulatório.
A minuta também visa ressaltar a importância das entidades autorreguladoras, reforçando o papel delas como parceiras institucionais da Susep na supervisão do mercado de corretagem.
É importante destacar que, embora tenham sido introduzidas pela Lei Complementar 137/10 e regulamentadas pela Resolução CNSP 233/11 (que será revogada caso aprovada a minuta sob consulta pública), até o momento, apenas uma entidade autorreguladora foi autorizada a operar pela Susep. Trata-se do Instituto Brasileiro de Autorregulação do Mercado (Ibracor).
A proposta normativa também simplifica e unifica a disciplina jurídica do mercado de corretagem de seguros, fortalecendo a governança regulatória e o modelo de autorregulação supervisionada.
Dessa forma, ao consolidar regras esparsas e incorporar recentes inovações legislativas, o novo marco, se aprovado, proporcionará maior segurança jurídica e estímulo à concorrência e profissionalização do setor, favorecendo a modernização do ambiente de negócios em seguros.
Para seguradoras e corretores, será uma oportunidade de adequar suas estruturas de governança a um modelo de supervisão mais transparente e eficiente, que confere previsibilidade e estabilidade ao marco normativo.
A prática de Bancário, Seguros e Financeiro do Machado Meyer pode fornecer mais informações sobre as implicações das duas minutas de resolução, que podem ser encontradas na página do Sistema de Consultas Públicas da Susep.