Quando os proprietários de imóveis decidem ajuizar uma ação de despejo em face dos locatários, em geral já foram esgotados todos os meios de reaver o bem de forma consensual. Isso indica a urgência que os locadores têm em obter decisão judicial em caráter liminar determinando que o imóvel seja devolvido.
Contudo, essa prestação jurisdicional pode, por vezes, demorar mais do que o esperado, frustrando as expectativas do proprietário do imóvel e expondo-o, eventualmente, a prejuízos irreparáveis, sobretudo nos casos em que o contrato de locação não conta com uma das garantias (caução, fiança, seguro-fiança, por exemplo) previstas no artigo 37 da Lei de Locações (Lei nº 8.245/91).
Atenta a essa situação, a Lei de Locações, alterada principalmente pelas leis 12.112/09 e 12.744/12, passou a permitir que os proprietários de imóveis possam obter liminares para desocupação dos imóveis em 15 dias, independentemente da manifestação do locatário no processo e desde que prestada caução no valor equivalente a três meses de aluguel. Tal prerrogativa se aplica às ações de despejo que tiverem por fundamento exclusivo a falta de pagamento de aluguéis e acessórios da locação, em contratos de locação desprovidos de quaisquer garantias, nos termos do artigo 59, inciso IX, da Lei de Locações.
Apesar de, em um primeiro momento, a jurisprudência não ter firmado uma posição incisiva quanto à aplicabilidade de tal disposição legal, o Poder Judiciário pareceu ter entendido o espírito da inovação pretendida pela Lei de Locações, tendo em visa a notória evolução do tema ao longo do tempo.
Ao analisar a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), por exemplo, verifica-se que muitas decisões judiciais usam esse dispositivo legal como fundamento para conceder a liminar pleiteada pelo locador e determinar a desocupação do imóvel pelo locatário em 15 dias.[1] O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) vem seguindo o mesmo entendimento.[2]
Em apenas um dos diversos julgados sobre o assunto nos últimos anos, o TJ-SP reconheceu estarem presentes os requisitos previstos no artigo 59, inciso IX, da Lei de Locações, mas manteve a decisão de primeira instância que havia indeferido a liminar de despejo em 15 dias, argumentando que “diante da situação concreta, a concessão da liminar de despejo resultaria prematura, sem a viabilização da oitiva/defesa da parte contrária” (Agravo de Instrumento nº 2078843-81.2019.8.26.0000, 32ª Câmara de Direito Privado, julgado em 25/04/2019).
Ou seja, a posição jurisprudencial dominante é no sentido de que, presentes os requisitos legais autorizadores, a liminar prevista no artigo 59, inciso IX, da Lei de Locações deve ser concedida e o imóvel deve ser desocupado pelo locatário em 15 dias. Em outras palavras, a jurisprudência foi evoluindo ao longo do tempo para refletir a alteração promovida na Lei de Locações e assegurar sua aplicação e a efetividade de suas disposições. Nesse aspecto, ela protege menos os locatários e é mais direcionada a atender aos direitos e interesses dos locadores prejudicados pelo inadimplemento dos aluguéis que não contam com a pactuação de garantias em seu favor.
Assim, é possível afirmar que o avanço da jurisprudência sobre a efetiva aplicação do disposto no artigo 59, inciso IX, da Lei de Locações é positivo para os locadores e gera maior oferta de imóveis para locação, com impacto nos preços médios de mercado. Indiretamente, portanto, beneficia também os locatários, uma vez que os proprietários de imóveis têm mais segurança em alugá-los para quem não tenha condições de oferecer uma garantia no momento da celebração do contrato de locação, ou em manter o negócio já celebrado caso a garantia venha a ser extinta no decorrer da vigência do contrato.
[1] TJ-SP: Agravo de Instrumento nº 2273636-54.2018.8.26.0000, 25° Câmara de Direito Privado, julgado em 28/05/2019; Agravo de Instrumento nº 2064553-61.2019.8.26.0000, 32ª Câmara de Direito Privado, julgado em 10/05/2019; Agravo de Instrumento nº 2053445-35.2019.8.26.0000, 31ª Câmara de Direito Privado, julgado em 25/07/2017 e Agravo de Instrumento nº 2267446-75.2018.8.26.0000, 32ª Câmara de Direito Privado, julgado em 11/04/2019.
[2] TJ-RJ, Agravo de Instrumento nº 0026990-62.2019.8.19.0000, 22° Câmara Cível, julgado em 10/09/2019; Agravo de Instrumento nº 0051387-88.2019.8.19.0000, 6ª Câmara Cível, julgado em 28/06/2019; Agravo de Instrumento nº 0067138-52.2018.8.19.0000, 15ª Câmara Cível, julgado em 21/05/2019 e Agravo de Instrumento nº 0023138-30.2019.8.19.0000, 19ª Câmara Cível, julgado em 06/08/2019.