Por Raphael Zono, Renan Granja e Anna Licarião

Emissão de CBIO torna evidente a vontade que o Brasil tem de criar métodos para reduzir a emissão de gases de efeito estufa alterando a matriz energética nacional.

Em adição à Lei nº 13.576, de 26 de dezembro de 2017, que dispõe sobre a Política Nacional de Biocombustíveis (“RenovaBio”), foram emitidas regulamentações suplementares advindas do Ministério de Minas e Energia (“MME”) – Portaria nº 419 (“Portaria MME”), que dispôs sobre o processo de emissão, escrituração, negociação e aposentadoria dos Créditos de Descarbonização (“CBIO”) e da Resolução nº 802 (“Resolução ANP”), publicada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (“ANP”) em 05 de dezembro de 2019, estabelecendo procedimentos para geração de lastro indispensável para que seja realizada a emissão primária de CBIO, de acordo com o disposto no artigo 14 da RenovaBio.

Complementando as regulamentações dispostas acima, em 27 de junho de 2019 foi publicado o Decreto nº 9.888, de 27 de junho de 2019 (“Decreto”), que dispõe sobre a definição das metas compulsórias anuais de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa para a comercialização de combustíveis de que trata a RenovaBio, e institui o Comitê da Política Nacional de Biocombustíveis – Comitê RenovaBio.

O CBIO, criado a partir da lei RenovaBio, tem como objetivo a comprovação de meta individual de cada distribuidor de combustível. Os CBIOs serão emitidos por um emissor primário, uma vez certificado de forma regular pela ANP, lastreado em suas respectivas notas fiscais. Sendo que, uma vez emitida a documentação necessária para a emissão, deverá ser contratado uma instituição financeira para atuar como escriturador, para realizar a emissão do CBIO e introduzi-lo na B3 S.A. – Brasil, Bolsa, Balcão.

Com base no Artigo 4º do Decreto, a meta compulsória será detalhada pela ANP, para cada ano corrente, em metas individuais, aplicadas aos distribuidores de combustíveis, de forma proporcional à sua participação de mercado na comercialização de combustíveis fósseis no ano anterior.

O Decreto estabelece ainda que, na hipótese de não atendimento integral ou parcial da meta individual, o distribuidor de combustíveis ficará sujeito à multa, a ser aplicada pela ANP, multa essa proporcional ao descumprimento, sem prejuízo das sanções administrativas e pecuniárias e de natureza civil e penal cabíveis, sendo que tal multa será equivalente ao valor dos CBIOs não adquiridos, considerada a maior média mensal das cotações do CBIO no exercício do descumprimento, partindo de R$ 100.000,00 (cem mil reais) e podendo chegar a até R$ 50.000,000,00 (cinquenta milhões de reais) de multa aplicada, a depender da situação do distribuidor.

A emissão primária da CBIO será efetuada escrituralmente, nos livros ou registros do escriturador escolhido, desde que solicitado por produtor ou importador de biocombustível, autorizado pela ANP, com habilitação para solicitar a emissão de CBIO em quantidade proporcional ao volume de biocombustível produzido ou importado e comercializado, relativamente à Nota de Eficiência Energético-Ambiental constante do Certificado da Produção Eficiente de Biocombustíveis (“Emissor Primário”), nos termos do artigo 13 da RenovaBio, sendo que esse direito à emissão primária de CBIO poderá ser exercido para operações de venda de biocombustíveis ocorridas a partir de 24 de dezembro de 2019 quando solicitadas pelo Emissor Primário em até 60 (sessenta) dias da respectiva nota fiscal de compra e venda do biocombustível.

Será disponibilizada uma área para registro, negociação e solicitação de aposentadoria do CBIO pela B3, área esta que será acessada por instituições financeiras que representam potenciais adquirentes do CBIO emitido, como pessoa física, investidores, fundos de pensão, fundos verdes e qualquer outro interessado, não se restringindo apenas à companhias que queimam combustível fóssil, ou que representem escrituradores.

Uma vez emitido o CBIO, o título será registrado em entidade registradora autorizada pelo Banco Central do Brasil ou pela Comissão de Valores Mobiliários e, após realizado seu registro, acontecerá a negociação do título, realizada em ambiente que assegure a não identificação das contrapartes.

Os detentores de CBIO devem ser classificados em todos os sistemas eletrônicos de escrituração, negociação e registro dentro das seguintes categorias, de acordo com os incisos I, II e II do Artigo 8º da Portaria MME:

  • I – Emissor Primário;
  • II – Parte Obrigada: distribuidores de combustíveis com obrigação de comprovar o atingimento de metas individuais compulsórias de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa; e
  • III – Parte Não Obrigada: demais detentores de CBIOs, residentes e não residentes, cadastrados de forma prévia a operar em ambiente de negociação. O CBIO representa um título de crédito sui generis, ou seja, único em sua espécie, pois cada unidade de CBIO, de acordo com o parágrafo 2º do Artigo 3º do Decreto nº 9.888/19, corresponde a uma tonelada de gás carbônico equivalente, tendo como base para o seu cálculo a diferença entre as emissões de gases de efeito estufa no ciclo de vida de um biocombustível e as emissões de seu combustível fóssil substituto.

A emissão de CBIO torna evidente, então, a vontade que o Brasil tem de criar métodos para reduzir a emissão de gases de efeito estufa alterando a matriz energética nacional.


Raphael Zono, Renan Granja e Anna Licarião são, respectivamente, sócio e advogados do Machado Meyer Advogados.

(Bonijuris - 24/07/2020)