A emissão de bônus feita ontem pela Petrobras abre espaço para que outras companhias tomem o mesmo caminho e levantem recursos no exterior. No entanto, empresas e coordenadores dessas operações terão que ficar mais atentos aos bons momentos do mercado, uma vez que o humor muda a cada dia. "O mercado de renda fixa está aberto, mas é preciso calibrar o dia exato de fazer a colocação para conseguir uma taxa melhor", afirma o superintendente de Mercado de Capitais do Santander, Ricardo Leoni.
Leoni acrescenta que algumas empresas já mantêm a política de deixar a documentação exigida em uma operação desse porte preparada, o que dá maior agilidade ao processo de emissão. Com isso, elas poderão aproveitar as janelas que surgem no mercado. Na avaliação do executivo, os mercados continuarão voláteis no curto prazo e saber aproveitar pontualmente os momentos de melhora faz diferença. Foi isso que aconteceu com a Petrobras. "Hoje o mercado já não está tão bom como ontem", diz.
Na captação feita pela petrolífera brasileira a demanda foi de quatro vezes a oferta. O Santander foi um dos bancos que participaram da operação, junto com HSBC e JPMorgan. O retorno ao investidor (yield) ficou em 8,125% ao ano. Em dezembro de 2007, a estatal emitiu US$ 750 milhões pelo mesmo prazo e um yield de 5,86% ao ano.
A demanda é facilitada pelo maior apetite de investidores por títulos privados de empresas, desde que os volumes ofertados sejam de no mínimo US$ 500 milhões. O responsável pela área de Corporate Bank do Société Générale no País, Paulo César Souza, destaca que no mercado financeiro, de maneira geral, há falta de confiança nos bancos. "Ainda há muitas pessoas com o dinheiro parado e quem costumava aplicar em títulos do Tesouro norte-americano, que agora rendem zero, ou aplicava nos bancos, está buscando outras opções de investimentos" diz. O receio com o risco das empresas, segundo ele, é menor do que com o dos bancos. "No preço certo, os bônus corporativos têm demanda, porque o dinheiro não evaporou", enfatiza.
Mas se existe demanda há também a exigência de um bom retorno, o que faz com que mesmo empresas grau de investimento paguem taxas de juros mais elevadas do que no passado, a exemplo do que aconteceu com a Petrobras. Leoni, do Santander, acredita que apenas aquelas que têm dívidas a vencer ou que precisam manter os planos de investimentos irão ao mercado externo. "Elas não têm opção. As que têm caixa vão esperar mais um pouco."
A exigência de retorno mais elevado e por prazo de dez anos fazem com que poucas empresas no curto prazo estejam aptas a acessar esse mercado, segundo avaliação do diretor-executivo da Área Internacional do Bradesco, José Guilherme Lembi. "É difícil fazer um hedge interno por um prazo tão longo. Não há liquidez para isso na Bolsa de Mercadorias & Futuros", lembra. O executivo citou que os contratos de dez anos na BM&F somam apenas US$ 150 milhões.
A dificuldade em fazer hedge interno faz com que apenas as empresas grau de investimento e que tenham receitas em dólar busquem levantar recursos com a emissão de bônus. Prazos menores no mercado externo, de cinco anos, estão com um custo de 120% do CDI, sem incluir Imposto de Renda, segundo Lembi. Por essa razão o executivo acredita que a maior parte das empresas irá utilizar os recursos do Banco Central para rolar dívidas que vencem nesse ano e esperar uma melhora nas condições de mercado.
Outros profissionais do mercado financeiro lembram que não só o mercado de capitais - via emissão de bônus no exterior, debêntures ou notas promissórias - é procurado pelas empresas. Outra fonte de recursos está no mercado bancário, por meio de empréstimos sindicalizados e adiantamento sobre contrato de câmbio (ACC), por exemplo. "Acho que a Petrobras não deve ter nenhuma dificuldade para executar seu plano de investimentos, apesar da crise que existe na liquidez global. O dinheiro existe, mas está parado", afirma o responsável pela área de operações estruturadas do Sumitomo Mitsui no Brasil, Carlos Eduardo Moraes Barros.
Ele lista empresas como Vale, Gerdau, Braskem e Usiminas como candidatas naturais à obtenção de recursos no mercado internacional. Atualmente, o Sumitomo Mitsui está finalizando a estruturação de um empréstimo sindicalizado para a Usiminas, que tem a japonesa Nippon Steel no bloco de controle.
Flavio Meyer, sócio do escritório de advocacia Machado, Meyer, Sendacz e Opice, lembra que a demanda muito acima do valor ofertado ontem pela Petrobras mostra que há apetite por parte dos investidores. No entanto, as companhias que tenham a intenção de buscar essa fonte de recursos terão que se submeter ao pagamento de taxas maiores do que a emissão feita pela petrolífera brasileira. "Se a empresa tem um perfil de risco maior, o investidor vai exigir uma remuneração maior", diz. Algumas devem esperar para emitir bônus ou buscar outras alternativas.
Visão parecida tem Souza, do Société Générale, que acredita que os 8,125% do bônus da Petrobras não chega a ser um piso para emissões de títulos de dívida por outras empresas brasileiras no exterior, embora seja uma "referência muito forte". "Se a Petrobras emitiu a esse preço, acho pouco provável qualquer outra empresa emitir a 7,5%", exemplifica. E enquanto no mercado de capitais, segundo o executivo, é mandatório ter grau de investimento para se emitir, as demais alternativas são mais flexíveis. "No mercado bancário a situação é diferente, nós mesmos estamos trabalhando com uma companhia sem grau de investimento", afirma, sem dar detalhes.
(Ana Paula Ribeiro e Cesar Bianconi)
(Agência Estado 05.12.2008)
(Notícia na íntegra)