Roberto DumkeSão Paulo - Mesmo com a globalização acelerada de ramos do direito como o tributário e o de compliance, escritórios de advocacia estrangeiros que desejam entrar no Brasil têm se deparado com muitas limitações.
Enquanto ao redor do mundo muitas bancas têm se estruturado como corporações, espalhando filiais em dezenas de países, no Brasil isso não ocorre. Advogados ouvidos pelo DCI contam que os poucos escritórios globais com presença firme no País têm recorrido a associações ou acordos de cooperação com os brasileiros.Essa é a aposta, por exemplo, do Mayer Brown, escritório com sedes na Ásia, na Europa e nas Américas, e que no Brasil é associado à banca carioca Tauil & Chequer Advogados. O sócio-fundador Ivan Tauil acredita que a globalização reforça a importância das parcerias. "As companhias são entes globalizados, que transcendem fronteiras. E hoje, os departamentos jurídicos também estão atuando em escala global."
Seja pela globalização ou por outras razões, a vontade dos grupos estrangeiros de entrar na advocacia nacional também tem sido revelada na negociação de acordos comerciais. Na troca de ofertas para um acordo de livre-comércio entre União Europeia e Mercosul, que está ocorrendo esta semana, uma das reivindicações seria a abertura do ramo jurídico brasileiro.
"O mundo caminhou de maneira inexorável e irreversível para globalização. Precisamos nos capacitar para poder competir globalmente. Os clientes hoje são globais", comenta o sócio do Campos Mello Advogados, Leonardo Rzezinski. O escritório, também carioca, é outro que mantém parceria com uma banca global, o DLA Piper.
Segundo ele, trata-se de um acordo de cooperação não exclusivo. "São duas entidades autônomas, independentes, que unem forças em beneficio dos clientes. Mas somos 100% brasileiros. Só temos advogados brasileiros no escritório."
Há ainda uma terceira parceria entre escritórios de porte grande: a do Trench, Rossi e Watanabe Advogados com o Baker & McKenzie. Essa parceria, contudo, já teria algumas décadas de existência.
De modo geral os escritórios costumam ser bastante discretos sobre os acordos de cooperação. O único que exibe o logo do parceiro estrangeiro ao lado da marca própria é o Tauil & Chequer. Nos bastidores, todavia, sabe-se que o escritório enfrenta processos, que correm sob sigilo, em diferentes seccionais da Ordem dos Advogados Brasileiros (OAB) por supostamente ter desrespeitado os limites da associação.
Oposição A entidade que tem protagonizado o combate à entrada de estrangeiras é o Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), cuja diretoria é composta por vários escritórios de grande porte. "Temos conhecimento de uma pequena minoria [de escritórios] que realmente está atuando além do que deveria", diz o presidente do Cesa e sócio do Machado Meyer, Carlos José Santos da Silva.
Entre 2009 e 2010, quando Mayer & Brown e DLA Piper vieram ao Brasil, o Cesa fez uma consulta à OAB, com questionamentos às associações. A resposta dada pelo Conselho Federal da OAB, em 2012, não fez com que as duas bancas encerrassem as parcerias, mas levou ao rompimento de outra dupla: o brasileiro Lefosse e o britânico Linklaters, este no Brasil desde 2001.
Segundo o presidente do Cesa, conhecido como Cajé, hoje ainda existem escritórios que agem como "barriga de aluguel", permitindo que as bancas estrangeiras atuem no Brasil por meio de pessoa interposta. Só existe, contudo, notícia de uma condenação por prática desse tipo, em 2011, contra um escritório de iniciais S. R. O. Outra banca teria feito acordo de ajuste de conduta, mas os termos dos acordos são sigilosos.
Do outro lado, entretanto, a argumentação é outra. Não seriam brigas jurídicas, envolvendo o descumprimento de regras legais, mas sim uma batalha por espaço no mercado. "Entendo que a mensagem [do Cesa] não teve como objetivo acabar com associações existentes, mas sim impedir que o fenômeno se alastre, para que outros que não se estimulem a fazê-lo", afirma Ivan Tauil.
Ele também não vê necessidade de maior abertura do País para serviços jurídicos. "O Brasil possui leis muito sólidas, absolutamente suficientes para o cenário da advocacia internacional. A fórmula para isso é a associação, que permite que o advogado brasileiro seja protagonista", diz. Para ele, maior abertura poderia comprometer esse protagonismo. "Nesse ponto, estou totalmente alinhado com o Cesa."
(DCI - Diário Comércio Indústria e Serviço – 13.05.2016)