Empresas não precisam pagar contribuição previdenciária sobre boas ideias de funcionários. O entendimento é do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), que analisou a tributação de um prêmio pago pela Samarco Mineração a funcionários que apresentaram projetos sobre meio ambiente, processos de trabalho e afins. Ainda cabe recurso à Câmara Superior.O prêmio "Campo de Ideias" foi oferecido entre 1999 e 2006. A autuação, que cobra também contribuição previdenciária sobre participação nos lucros e resultados (PLR), é de R$ 736 mil (valor histórico).No processo (nº 15504.000487/ 200710), a companhia alega que o prêmio foi uma forma de estímulo, reconhecimento e recompensa às ideias dos empregados, estagiários e funcionários de empresas contratadas. As ideias eram cadastradas em um sistema interno, avaliadas e classificadas.Depois dessa etapa, de acordo com a companhia, realizava-se um evento anual, chamado "Campo de Ideias", em que as melhores propostas implementadas eram recompensadas. Para a empresa, "em hipótese alguma" os valores poderiam ser considerados parcela do salário de contribuição, como pretende a Receita.Para a fiscalização, porém, entre 1999 e 2006 o pagamento de valores pelo prêmio foi constante e até se repetiu em períodos seguidos para os mesmos funcionários. "Os valores remunerados a título do prêmio Ideias não podem ser entendidos como eventuais tanto para a empresa quanto para os empregados", afirma a Receita no processo.Ao analisar o caso, porém, a 1ª Turma da 2ª Câmara da 2ª Seção do Carf decidiu em sentido contrário, de forma unânime. Para os conselheiros, valores pagos como recompensa a ideias sobre ambiente de trabalho, meios de produção e formas de evitar desperdício não podem ser tributados."Não se pode admitir que um valor pago quando o trabalhador tiver uma ideia, qualquer ideia, seja ela sobre seu trabalho ou não, tenha natureza remuneratória", afirmou em seu voto o relator, conselheiro Carlos Henrique de Oliveira, representante da Fazenda.Os conselheiros consideraram que os pagamentos teriam "nítido" caráter de prêmio e de fomento criativo. "Não é pagamento pelos serviços prestados por força do contrato de trabalho", disse o relator.Em seu voto, Oliveira definiu o conceito de remuneração, tanto por causa do prêmio como para delimitar o caráter da PLR. Segundo ele, observa-se natureza remuneratória na verba paga quando presentes os seguintes itens: caráter contraprestacional, pagamento pelo tempo à disposição do empregador e o caráter de interrupção do contrato de trabalho ou o dever legal ou contratual do pagamento. Somente nesses casos, acrescentou, a verba recebida diretamente do empregador terá natureza salarial.Além de afastar a cobrança de contribuição previdenciária sobre o prêmio, a turma também decidiu que os valores de PLR pagos não integram o salário de contribuição quando são observados os requisitos da legislação. Em seu voto, o relator considerou que há decadência (autuação feita fora do prazo) dos valores cobrados pelo Fisco relativos à PLR.Segundo o advogado Fabio Calcini, do Brasil Salomão e Matthes Advocacia, o Carf já julgou a tributação de outros tipos de premiação, mas ligadas ao alcance de metas ou faturamento, por exemplo. Nesse casos, diz, a tributação foi mantida por haver relação com a atividade exercida no trabalho. "São situações diferentes do caso concreto, em que o pagamento não decorre da atividade do funcionário dentro da empresa", diz.A partir da reforma trabalhista, de 2017, o parágrafo 2 do artigo 457 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) passou a determinar que o pagamento de prêmios, mesmo que habitual, não integra a remuneração do empregado e não é base de incidência de encargos trabalhistas ou previdenciários. Porém, Calcini considera que esse prêmio deve ter natureza de surpresa, ou seja, ser pago sem ser combinado previamente ou previsto.Porém, para o advogado Leandro Cabral, do escritório Velloza Advogados, a partir da reforma trabalhista, o caráter de surpresa não seria totalmente obrigatório. "A exposição de motivos da reforma trabalhista deixa claro que essa previsão de prêmio é uma forma de incentivar o empregador a premiar em função da produtividade", diz. Cabral destaca que, no caso julgado pelo Carf, a turma considerou que os trabalhadores não estavam à disposição do empregador para ter ideias sobre o tema do prêmio e, por isso, afastou a tributação.A decisão não é um precedente para premiações em geral, mas para o caso específico, a depender de particularidades do prêmio oferecido pela empresa, segundo a advogada Diana Piatti Lobo, do escritório Machado Meyer Advogados. A advogada cita outro caso analisado pelo conselho. Porém, naquele processo, a autuação foi cancelada por causa de um erro na formalidade da cobrança, sem análise do mérito.Com relação a PLR, o cenário está difícil para os contribuintes no conselho, de acordo com a advogada. "A Câmara Superior já analisou diversos casos, demonstrando uma postura restritiva na análise dos critérios fixados pela Lei 10.101, de 2000", afirma.Procurada pelo Valor, a Samarco informou que não foi notificada sobre a decisão. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), por sua vez, analisa o cabimento de recurso.Valor Econômico
http://www.valor.com.br/legislacao/5377431/boa-ideia-de-funcionario-nao-pode-ser-tributada(Notícia na íntegra)
http://www.valor.com.br/legislacao/5377431/boa-ideia-de-funcionario-nao-pode-ser-tributada(Notícia na íntegra)