Paula Dume

País acusa Bombardier de receber subsídios ilegais do governo canadense para produzir jatos comerciais com preços reduzidos

É provável que a Organização Mundial do Comércio (OMC) dê parecer favorável ao Brasil com relação aos subsídios que o governo canadense vem concedendo para a Bombardier, empresa canadense controladora do programa de jatos comerciais C Series Aircraft Limited Partnership (CSALP) que se associou recentemente à Airbus. Na avaliação do Brasil, o apoio financeiro à Bombardier, concorrente direta da Embraer, para produzir aeronaves com preços mais em conta, tem afetado as condições de competitividade no mercado de aviação comercial. 

Anunciado em 17 de outubro, o acordo entre a canadense Bombardier e a francesa Airbus causou turbulências não só na Embraer, como na Boeing. A fabricante norte-americana de aeronaves acusa a canadense de praticar dumping na venda de aviões em território americano, justamente porque recebe subsídios irregulares do governo do Canadá. Com isso, os Estados Unidos impuseram, provisoriamente, tarifas compensatórias extras de 300% sobre os jatos da Bombardier.

Por sua vez, a Embraer questiona os programas de financiamento canadenses para a Bombardier, que produz os jatos C Series, concorrentes de sua família E-2 de aeronaves de pequeno porte. Especialistas ouvidos pelo Lexis 360 acreditam que o órgão internacional tem grandes chances de dar ganho de causa ao governo brasileiro. 

Segundo Fábio Falkenburger, sócio especialista em Direito Aeronáutico e Aeroportuário e head da área de Aviação do Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, se a Embraer conseguir comprovar que o governo canadense subsidia a Bombardier, considerando que a concorrência é muito polarizada para aquele tamanho de aeronave de 100 a 150 assentos, o órgão pode dar ganho de causa à fabricante brasileira. 

“Com a Airbus se juntando e participando desse mercado de jatos de menor porte, a Bombardier vai se beneficiar de toda a capilaridade de vendas que a Airbus tem”, esclarece. No entanto, Fábio ressalta que não dá para afirmar que, por conta dessa associação com a Airbus, houve um aumento de subsídios do governo canadense para a Bombardier.

Esta guerra na OMC entre Brasil e Canadá não é recente. Vera Kanas, sócia responsável pela área de Comércio Internacional do TozziniFreire Advogados, conta que o entrave tem, pelo menos, 10 anos. “Em todos os casos, sempre o reclamante ganhou. A tendência é o Brasil ganhar. Os subsídios que os canadenses deram para a Bombardier são um pouco agressivos”.

A sócia acredita que esses subsídios deixaram a Bombardier mais atraente no mercado. Antes de recebê-los, ela foi colocada à venda e oferecida para Boeing e Airbus. Ambas recusaram. O governo canadense decidiu então injetar dinheiro na Bombardier, e a Airbus acabou adquirindo 50,01% da CSALP. A Bombardier ficará com 31% da companhia, e o governo de Quebec ficará com os 19% restantes. A transação não foi concluída, porque depende da aprovação dos órgãos reguladores do Canadá e da Europa, e tem conclusão prevista para o segundo semestre de 2018. 

“Neste meio tempo, quando o governo canadense resolveu colocar dinheiro na Bombardier, a Boeing pensou que os canadenses iriam invadir o mercado americano e solicitou investigações antidumping e de medidas compensatórias nos EUA. Houve investigação e resultou em 300% de sobretaxa sobre as importações de aviões do Canadá. Para burlar essa medida, a Bombardier decidiu fabricar o C Series dentro dos EUA”, relata a advogada. Tanto que o acordo entre as empresas inclui a abertura de uma segunda linha de produção nos Estados Unidos, assim a Bombardier evita tarifas alfandegárias na venda de seus aviões C Series.

Devido à dependência da Bombardier em relação ao governo norte-americano, a sócia acredita que esses subsídios estejam ligados à exportação e, por si só, seriam contra as regras da OMC e poderiam influenciar o pedido do governo brasileiro na organização. “Se essa joint venture entre Bombardier e Airbus teve o intuito de burlar as taxas cobradas pelo governo americano, pode ser que influencie esse contencioso que está sendo iniciado na OMC”.


Condução na OMC

Sobre o pedido de estabelecimento de painel realizado pelo governo brasileiro na OMC em fevereiro e reapresentado em agosto deste ano, a advogada explica que, na primeira instância, ele será estudado por três panelistas que foram escolhidos para analisar os fatos. Esse processo leva um pouco mais de um ano para ser finalizado. “A dificuldade que vemos hoje em dia é na formação do painel. Ao longo dos anos, os países aprenderam que poderiam bloqueá-los e estamos justamente neste estágio agora”, nota a sócia do TozziniFreire.

De acordo com Vera Kanas, quando sair a decisão do painel, ela poderá ser acertada pela parte que perdeu ou poderá haver uma apelação, que vai para outro órgão de apelação, composta por oito juristas com representatividade global. Eles analisarão os aspectos jurídicos do caso e não mais os fatos. A decisão do órgão de apelação é final. Não há como precisar quanto tempo o trâmite vai durar, mas pode levar mais de 2 anos para ser concluído.

No pedido apresentado à OMC em agosto para abertura de um painel para solução de controvérsias, o Brasil solicitou o exame de mais de 20 programas de subsídios do Canadá ao setor aeronáutico do país, relacionados ao desenvolvimento das novas aeronaves da Bombardier. 

Em nota divulgada à imprensa, a Embraer afirmou que “continuará lutando contra os subsídios que distorcem a concorrência na indústria e que prejudicam as condições equânimes de competição entre os concorrentes”. A fabricante brasileira reforçou seu compromisso em manter a liderança no segmento de jatos de até 150 assentos, especialmente com a nova família dos E-Jets E-2. 

No dia do anúncio do acordo, as ações da Boeing e Embraer fecharam em baixa na bolsa, enquanto as da  Bombardier e Airbus decolaram. A Embraer perdeu cerca de R$ 700 milhões em valor de mercado, após seus papéis despencarem 5,41%. 

Lexis360
https://www.lexisnexis.com.br/lexis360/noticias/138/omc-pode-emitir-parecer-favoravel-ao-brasil-no-cas/

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