Especialistas acreditam que segunda onda deve vir com a extensão da prorrogação já dada e instituição de Refis

Flávia Maia

Com a crescente de infecções pelo novo coronavírus em todo o país e a dificuldade de prever quando será a retomada efetiva das atividades econômicas, o empresariado brasileiro clama por mais medidas do governo federal de auxílio ao combate à crise, em especial em relação aos tributos. A preocupação se dá porque muitos dos diferimentos tributários oferecidos pelo governo federal a empresas estão com datas próximas do fim e, ao mesmo tempo, não há previsão de mudança no cenário econômico. Por isso, tributaristas ouvidos pelo JOTA acreditam em uma segunda onda de medidas tributárias para tentar conter a crise.

Pesa no cenário o fato de que o Judiciário tem se manifestado contrário à maioria dos pedidos dos contribuintes por desonerações ou diferimentos dos mais diversos tributos.“Os contribuintes não estão conseguindo liminares. No começo tiveram algumas, mas depois muita coisa foi revogada. A pressão política do governo está muito grande em cima do Judiciário. Quando chega pedido de moratória os juízes já dizem que é matéria do Legislativo”, analisa Roberto Duque Estrada, sócio do Brigagão Duque Estrada Advogados.

Segundo estimativa da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), 80% das ações tributárias relacionados ao coronavírus têm tido desfecho favorável à Fazenda Nacional.

Como as desonerações já realizadas pelo governo federal começaram a impactar a arrecadação, os advogados não acreditam em novas dispensas fiscais. Para eles, mais renúncias de receita pelo Estado serão difíceis de ocorrer. Por isso, os especialistas apostam em novas prorrogações e em alterações administrativas e legislativas mais pontuais, mas que podem melhorar o fluxo de caixa das empresas.

Eles sugerem, por exemplo, tornar todas as despesas das empresas com Covid-19 dedutíveis em tributos como o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); promover anistias e programas de refinanciamento das dívida – os chamados Refis -; suspender temporariamente a trava de 30% para a compensação de prejuízos fiscais de IRPJ e base negativa de CSLL e não tributar o valor a renegociação das empresas em recuperação judicial com os credores como “ganho”.

Segundo dados de abril apresentados pelo Ministério da Economia, a previsão de arrecadação para o mês era de R$ 136 bilhões, no entanto, apenas R$ 93 bilhões foram realizados. Da receita frustrada de R$ 43 bilhões, o governo aponta que quase R$ 39 bilhões são relativos a diferimentos tributários de impostos e contribuições, além de antecipação de compensações. Os outros 4 bilhões seriam o reflexo da retração da atividade econômica.

Durante a apresentação dos dados, o chefe do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros da Receita Federal, Claudemir Malaquias, afirmou que as medidas fiscais para conter a crise causada pela pandemia estão em constante revisão. “Toda a equipe e todo Ministério da Economia estão em constante revisão e acompanhamento dessas medidas e dos efeitos que elas estão provocando e o seu grau de efetividade”, afirmou.

Por conta da pandemia, o governo federal prorrogou os pagamentos de tributos relativos às empresas do Simples Nacional, contribuição previdenciária patronal, PIS e Cofins. Além disso, postergou a entrega da declaração do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). O governo também zerou as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) por três meses.

A prorrogação do recolhimento de PIS, Cofins e as contribuições previdenciárias refere-se aos meses de março e abril. Já a alteração no IOF vai até 3 de julho de 2020.

Sugestões de medidas

Os tributaristas acreditam que o governo federal deve prorrogar os diferimentos já aplicados a alguns tributos, mas não deve aumentar o rol de tributos diferidos. “Não vejo espaço para novas concessões de desonerações, sejam elas tributárias ou de qualquer ordem, ainda mais porque os governos também estão apertados, gastando o que tem e o que não tem na contenção da pandemia. O mais provável de ocorrer é que o governos fiquem prorrogando os benefícios”, acredita Leonardo Martins, sócio da área tributária do escritório Machado Meyer.

Para ele, neste segundo momento da crise, os governos federais, estaduais e municipais podem estender a validade de certidões fiscais, o que seria uma opção sem impacto direto na arrecadação, mas que pode ajudar as empresas a se manterem ativas e participando, por exemplo, de licitações. Martins acredita também que os entes federativos poderão conceder anistias de juros e multas fiscais em programas nos moldes dos chamados Refis. Esses programas podem estimular os devedores a quitarem as dívidas e, ao mesmo tempo, podem trazer caixa para União, municípios e estados.

“Uma novidade que vai acontecer em um futuro próximo são as anistias fiscais. A anistia fiscal é um perdão de juros e multa. E é uma forma de a União, estados e municípios fazerem caixa rápido dando desconto para os contribuintes pagarem a sua dívida”.

O tributarista Roberto Duque Estrada aponta uma série de medidas fiscais que podem ser tomadas por via administrativa, por Medida Provisória ou pelo Legislativo para auxiliar a saúde financeira das empresas. Para ele, uma das alterações mais importantes para o futuro das atividades empresariais é a não tributação dos valores que empresas em recuperação judicial conseguirem com a redução de dívidas negociadas com os credores. Segundo ele, já há entendimento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) neste sentido para o PIS e a Cofins porque, no entendimento do tribunal, o valor não é uma receita.

No entanto, segundo Duque Estrada, em relação ao IRPJ e à CSLL, seria necessária uma mudança legislativa, pois o valor negociado é entendido como ganho patrimonial para a empresa devedora que conseguiu diminuir a sua dívida. “Muita empresa vai entrar em recuperação judicial, por isso é importante a alteração legislativa. O que não pode é o devedor, que é o mais sacrificado nessa situação, ter que pagar imposto quando ele está na pior situação da vida dele”, opina.

Outra medida apontada pelo tributarista seria a restituição e ressarcimento mais célere de créditos tributários. Duque Estrada propõe também a suspensão da vedação de compensação de débitos de recolhimento mensal por estimativa do IRPJ e da CSLL, introduzida pelo artigo 6º da Lei 13.670/18. “A nossa sugestão é a volta da regra anterior, de forma que as estimativas sejam pagas com créditos que a empresa tenha. Dessa maneira, a empresa não está tirando do caixa quando ela tem crédito com o governo para usar”, explica.

Além disso, para os tributaristas, seria necessária a redução e suspensão, ainda que temporária, da trava de 30% de compensação de prejuízos fiscais de IRPJ e CSLL. “Acho que neste momento se justifica a suspensão dessa trava para que as empresas possam, efetivamente, compensar 100% do prejuízo fiscal das bases negativas, ainda que por um período determinado”, analisa Gláucia Lauletta, sócia do escritório Mattos Filho. “Essa é uma medida interessante. O governo não estaria abrindo mão de receita, só estaria permitindo a compensação desse prejuízo antecipadamente”, complementa.

Gláucia sugere ainda que o governo torne todas as despesas das companhia com a pandemia dedutíveis do IRPJ e da CSLL, como, por exemplo, despesas com itens de higiene e proteção como máscaras e álcool em gel. A tributarista sugere ainda a criação de um crédito presumido para as empresas sobre o pagamento da contribuição previdenciária sobre a folha de salários. “De modo que aquele contribuinte que mantém os empregos e mantém os empregados tenha um crédito maior. A ideia é estimular a empregabilidade e a manutenção dos empregos”, afirma.

FLÁVIA MAIA – Repórter

(JOTA – 01.06.2020)

(Notícia na íntegra)