Iara Ferfoglia Gomes Dias Vilardi
Do escritório Machado, Meyer, Sendacz & Opice
Em 8 de agosto de 2008, entrou em vigor a Lei 11.672, que acresceu ao Código de Processo Civil o artigo 543-C, trazendo regras procedimentais para o julgamento de recursos repetitivos no âmbito do Superior Tribunal de Justiça.
Trata-se de mais uma tentativa de atacar a morosidade judicial, problema que tem sido pauta constante de discussões, podendo-se considerar a Emenda Constitucional nº 45/04 como um marco a esse respeito, vez que essa, além de trazer novos mecanismos que visam a atacar a morosidade excessiva – a súmula vinculante, a repercussão geral, a previsão de aumento do número de magistrados proporcionalmente ao de processos, distribuição imediata dos recursos nos tribunais, determinação de ininterrupção da atividade jurisdicional etc. –, fez inserir novo inciso no artigo 5º da Constituição Federal, garantindo, como direito fundamental aos cidadãos, a razoável duração do processo em âmbito judicial e administrativo.
Na esteira da renovação constitucional, vieram reformas infraconstitucionais com importantes modificações no mesmo intuito: (i) a Lei 11.187/05 que restringiu as hipóteses de cabimento de agravo de instrumento; (ii) a Lei 11.232/05 que acelerou o processo de execução de título judicial; (iii) a Lei 11.419/06 que dispôs sobre a informatização do processo.
Ao lado dessas, também a Lei 11.276/06 que introduziu ‘as súmulas impeditivas de recurso’ por meio da inserção do parágrafo primeiro no artigo 518 do Código de Processo Civil o qual prevê o não recebimento de recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça e a Lei 11.277/06 que inseriu no ordenamento o polêmico artigo 285-A do Código de Processo Civil que prevê a possibilidade de o juiz proferir sentença antes mesmo da citação da parte contrária, em caso de a matéria controvertida ser exclusivamente de direito e já ter sido apreciada anteriormente pelo magistrado.
Essas duas últimas leis, nos mesmos moldes da Lei 11.672/08, têm por escopo atingir o problema da morosidade decorrente das chamadas ações multitudinárias. A proliferação deste tipo de demanda – originado dos malfadados planos de estabilização financeira, de controvérsias administrativas, tributárias e previdenciárias – congestionou, de forma jamais vista, os tribunais, passando a ser considerado um dos grandes ‘emperradores’ do sistema, vez que, a despeito de já se conhecer seu resultado final, em razão dos inúmeros precedentes sobre o mesmo assunto, precisa enfrentar todas as fases processuais previstas para uma lide comum.
Nesta linha de raciocínio, tais tentativas obviamente são válidas e devem trazer algum resultado. Contudo, por conta da falta de sistematização dessas leis, decorrente da inquietude do Legislativo e do próprio Poder Judiciário em transformar, o quanto antes, essas normas em estatísticas, corre-se o risco de desvirtuamento do direito processual.
Não se trata de mero preciosismo. Diante de tantas regras sobre o mesmo assunto e da ausência de ‘diálogo’ entre uma norma e outra, não seria absurdo considerar que nenhuma delas consiga alcançar plenamente seu objetivo. Neste sentido, destaque-se, por exemplo, a possibilidade de que a ‘súmula impeditiva de recursos’ venha a atrapalhar – ou impedir – a ocorrência de reiteradas decisões necessárias para a edição de súmulas vinculantes.
Não bastasse isso, existe a hipótese de que uma dificulte o escopo da outra, havendo, ainda, a chance de efeitos colaterais não previstos. A este respeito, vale citar situação que pode ser criada caso não haja moderação e consciência do magistrado na aplicação do já mencionado artigo 285-A do Código de Processo Civil.
Isso porque se as sentenças proferidas nessas causas – o que ocorrerá antes mesmo da citação da parte contrária – não estiverem em consonância com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, abre-se espaço para a ocorrência de inúmeros problemas de ordem lógico-sistemática, além de novas discussões por meio dos instrumentos processuais disponíveis que terão potencialidade para também abarrotar os tribunais.
Assim, a despeito dos benefícios vislumbrados com novas regras como a Lei 11.672/08 e as demais leis aqui citadas, o melhor remédio nesse momento de recepção de novos institutos é a parcimônia, além de sua compatibilização com os mecanismos já existentes, evitando-se, assim, passos precipitados e, às vezes, atrapalhados.
(Jornal do Commercio, 11.11.2008)
(Notícia na Íntegra)