No último dia de agosto, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) colocou em audiência pública uma proposta para reformular a Instrução 358. A norma, de 2002, já é velha conhecida do mercado e trata de uso indevido de informação privilegiada para negociação de valores mobiliários (insider trading). A alteração considera a aplicação da regra em seu histórico de quase 20 anos, com o propósito de aproximar o novo texto da interpretação já consolidada pelo colegiado da CVM.

A reforma pretende tirar o foco das proibições de negociação relacionadas aos insiders — acionistas controladores, diretores, membros de conselhos de administração e fiscal e de órgãos com funções técnicas ou consultivas — e dar mais importância e clareza aos possíveis usos de informação privilegiada. O novo texto apresenta uma série de situações em que a prática de insider trading pode ser presumida, como o fato de que os insiders necessariamente têm acesso a informações relevantes da companhia.

Logo, se alguém negocia valores mobiliários dispondo de informação relevante ainda não divulgada, a autarquia deve presumir que essa pessoa fez uso da informação na operação.

É importante destacar que as presunções listadas pela CVM permitem prova em contrário — ou seja, cabe ao acusado comprovar sua inocência. Ele é quem deve apresentar ao regulador as provas de que, mesmo em situação privilegiada, não tinha acesso às informações que caracterizam o crime.

Existe ainda uma outra situação, em que o insider negocia, por descuido, em momentos considerados críticos para os papéis da empresa. “Era comum haver casos julgados pela CVM em que se concluía não existir intenção do insider em negociar com informações privilegiadas, se tratava de infração objetiva. O acusado simplesmente se esquecia de que estava em período crítico, antes da divulgação de resultados, e negociava sem estar atento às consequências”, afirma Clarissa Freitas, sócia do escritório Machado Meyer Advogados. Para resolver a questão, a autarquia pretende proibir os insiders de negociar valores imobiliários por certo período antes da divulgação de informações trimestrais e anuais, deixando um sinal claro de que negociações nesse período serão entendidas como ato ilícito.

Freitas destaca também que o regulador se esforçou em apresentar um novo texto que fizesse uma diferenciação entre o uso intencional ou não dessas informações. “Ambos são atos ilícitos, mas eles não podem ser julgados sob a mesma régua. Por isso a CVM estabeleceu sanções diferenciadas para os dois casos, sendo que o uso não intencional tem uma pena mais branda”, argumenta.

Outro ponto previsto na proposta é a flexibilização de prazos para planos de investimento e desinvestimento. O prazo mínimo, que antes era de seis meses, fica reduzido a apenas dois. A CVM também pretende reduzir o custo de observância de companhias abertas por meio da dispensa de obrigações. As empresas que não se encaixarem na categoria A, ou seja, que não tenham ações aptas à negociação em bolsa de valores ou não tenham papéis em circulação, estão liberadas da elaboração de política de divulgação de informações.

Os participantes do mercado podem enviar comentários e sugestões relativas à proposta da CVM colocada em audiência pública até o dia 15 de outubro, no e-mail Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo..

(Capital Aberto - 04.09.2020)