Por Victor AguiarA Medida Provisória que aumenta de 20% para até 49% o limite de capital estrangeiro nas empresas aéreas deve facilitar para que grupos internacionais que já possuem participação em companhias brasileiras, como na GOL e na Azul, elevem ainda mais sua fatia. Tal fato, no entanto, pode demorar mais algum tempo, visto que as empresas tendem a esperar que a MP seja convertida em lei antes de fechar negócios que podem atingir bilhões de reais. E apesar do interesse estrangeiro no setor aéreo do País, a limitação em 49% foi vista com ressalvas, uma vez que havia a expectativa de abertura total do setor.A sócia na área de Infraestrutura da TozziniFreire, Ana Cândida, lembra que há outros projetos de lei tramitando que versam sobre esse assunto, visto que esse aumento do limite da participação de estrangeiros em aéreas brasileiras tem sido apontado como essencial. Acrescenta, no entanto, que havia uma expectativa de que o governo excluísse definitivamente com qualquer limitação. "É uma posição mais conservadora do governo de flexibilizar a ponto de aumentar o limite, mas não a ponto de conceder o controle", destaca.Segundo uma fonte consultada pelo Broadcast, o aumento desse limite é um avanço no sentido de auxiliar o setor aéreo, mas o ideal seria se a medida permitisse que companhias estrangeiras pudessem ter uma participação majoritária, com no mínimo de 51%. Apesar dessa questão, a fonte frisa que há interesse das estrangeiras em ingressar no Brasil - ou aumentar a participação - visto que os ativos brasileiros estão em preços depreciados, efeito que é turbinado com a desvalorização do real.Em meio a isso, Ana Cândida pondera que negociações efetivas devem acontecer depois que a MP se transforme em lei, o que acontecerá após aprovação pelo Congresso. A sócio da TozziniFreire afirma ainda que, à princípio, um estrangeiro poderá deter participação de até 49% em mais de uma companhia aérea brasileira, mas essa é uma questão que poderá ser "interpretativa"."Obviamente, quem já é investidor deve ter mais facilidade para aumentar a fatia do investimento, mas a mudança na regra permite a entrada de novos investidores, não só necessariamente companhias aéreas, mas investidores estrangeiros de qualquer natureza", diz o sócio da área de infraestrutura do escritório Machado Meyer, Fabio Falkenburger. "Ainda que 49% não implique no controle propriamente dito, é um porcentual muito mais relevante no capital social, e isso deve servir de incentivo para os investidores estrangeiros".Quanto à possibilidade de uma empresa estrangeira deter participações elevadas em mais de uma companhia aérea brasileira, Falkenburger lembra que os movimentos de aquisição estão sujeitos à aprovação da Anac e de autoridades aeronáuticas. "A compra de fatias em mais de uma empresa depende de análises de mercado e de viabilidade, sob o ponto de vista de concentração econômica".A presidente Dilma Rousseff editou a Medida Provisória 714/2016 para aumentar de 20% para até 49% o limite de participação estrangeira nas concessões do setor aéreo. A medida foi assinada ontem pela presidente e está publicada no Diário Oficial da União (DOU) de hoje.A ampliação do porcentual de capital estrangeiro nas empresas aéreas é uma antiga reivindicação do setor. A MP, assinada em acordo com a Secretaria de Aviação Civil e com o Ministério da Fazenda, segundo o Broadcast informou ontem, chega em momento de grave crise das companhias brasileiras, que vêm sofrendo prejuízos bilionários, principalmente por causa da valorização do dólar frente ao real.Movimentos recentesEmpresas aéreas estrangeiras já haviam adquirido fatias na GOL e na Azul, duas das principais companhias aéreas brasileiras, ao longo de 2015. A Delta Air Lines possui atualmente 9,48% de participação na GOL, parcela obtida após um acordo com a companhia brasileira para o aporte de até US$ 56 milhões por meio da compra de ações, comprometendo-se ainda a garantir um empréstimo de US$ 300 milhões a ser obtido pela GOL junto ao Morgan Stanley.No caso da Azul, a United Airlines adquiriu 5% da aérea brasileira em junho, comprometendo-se a realizar um investimento de US$ 100 milhões na companhia. Além disso, a aérea também recebeu, em novembro, um aporte de R$ 1,7 bilhão do grupo chinês HNA, em troca de 23,7% na companhia - a legislação brasileira proibia que sócios estrangeiros tivessem mais de 20% das ações ordinárias, mas o grupo HNA recebeu ações preferenciais da Azul, sem direito a voto. O empresário David Neeleman, fundador da Azul, é o controlador da companhia, com 67% das ações ordinárias.Em coletiva de imprensa realizada nesta manhã, o ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Guilherme Ramalho, disse que, se o aumento do limite para o capital estrangeiro nas companhias aéreas de 20% para 49% der bons resultados, o governo pode propor uma nova ampliação no futuro.Ajuda A maior participação de estrangeiros nas companhias aéreas brasileiras poderá aliviar a situação financeira de algumas empresas do País, que atravessam um cenário delicado, combinando demanda em queda e dólar em alta. "A MP abre uma nova porta de dinheiro, tanto para a GOL quanto para as outras empresas. É mais uma fonte de financiamento, mas depende do apetite dos investidores e do quanto eles querem investir", diz o sócio do Machado Meyer. "Mas é melhor ter uma nova opção, e, por isso, acho que a medida é positiva".A GOL, por exemplo, acumulou, entre janeiro e setembro do ano passado, um prejuízo líquido de R$ 3,16 bilhões. Apenas no terceiro trimestre de 2015, o prejuízo foi de R$ 2,14 bilhões."Eu diria que para as empresas que estão passando por dificuldades econômico-financeiras neste momento, é uma tremenda oportunidade", disse o coordenador do Núcleo de Logística, Supply Chain e Infraestrutura da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende. "Mas essa reestruturação vai além do socorro às empresas em dificuldades, ela tem um contexto maior, de inovação na gestão e na composição acionária das empresas".InteressePara Resende, o cenário de retração na demanda por passagens aéreas no País não deve ser suficiente para diminuir o interesse de investidores estrangeiros. "O setor aéreo brasileiro tem o que chamamos de demanda reprimida", diz Resende. "A retomada do crescimento traz a tona imediatamente essa demanda reprimida, e essas empresas têm planos para o longo prazo".Falkenburger trabalha com uma visão semelhante, ressaltando que, apesar da situação pouco favorável, o potencial do setor aéreo brasileiro ainda é muito grande. "No curto prazo, as previsões não são muito otimistas, mas acho que um investidor não pensa no curto prazo. Espera-se a atração de investidores apostando na subida da demanda aérea".Reciprocidade

A MP também abre a possibilidade de negociação de acordos de reciprocidade que permitam que empresas estrangeiras tenham até 100% do capital de uma aérea brasileira, desde que uma companhia brasileira possa também adquirir 100% de uma aérea naquele país. Para Falkenburger, a cláusula abre as portas para investimentos ainda maiores no futuro. "Isso depende de um acordo entre o Brasil e outro país, teria que haver uma pressão dos dois lados, para um acordo bilateral", afirma. "Mas o fato de existir essa possibilidade é um avanço". (Victor Aguiar - Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.)

(Agência Estado - 02.03.2016)(Notícia na íntegra)