Se malandro soubesse como é bom ser honesto, seria honesto só por malandragem Leonardo Machado   Corrupção nunca deixou de ser o tema do momento. Bem que o jornalista e escritor Eduardo Bueno alertou: "Povo que desconhece sua história está condenado a repeti-la". Segundo Bueno, a corrupção teria desembarcado no Brasil, nos idos de 1549, com a nau de Pero Borges, matuto português que foi condenado pela coroa por desvio de dinheiro público, antes mesmo de ser escolhido para o posto de primeiro-ouvidor-mor da antiga colônia portuguesa (que, na atual República Federativa, equivale ao cargo de ministro da Justiça). Passados quase cinco séculos, a luta contra a corrupção nunca foi tão importante na história deste país. Nos Estados Unidos, Chile, Reino Unido e até mesmo em outros países do BRICS, como Índia e China, leis de combate à corrupção existem para punir não apenas os indivíduos envolvidos em tais crimes. Na verdade, leis como a FCPA - que é a lei americana de combate à corrupção que nasceu em meio às investigações do escândalo que levou à renúncia do ex-presidente Richard Nixon - introduziram mecanismos que permitem, de forma objetiva e simples, a punição da pessoa jurídica que tiver seus interesses vinculados a negociatas com autoridades públicas, ainda que por intermédio de terceiros. Em breve, espera-se, este tipo de responsabilização para pessoas jurídicas também passe a valer o Brasil. O Projeto de Lei n. 6826/10, em trâmite no Congresso Nacional desde abril de 2009, prevê punições severas para as empresas que praticarem atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Isto significa que, quando aprovada, a nova lei permitirá que as autoridades investiguem e responsabilizem, na esfera civil e administrativa, companhias de pequeno, médio e grande porte, que, direta ou indiretamente, atentarem contra o patrimônio público, notadamente através de atos de corrupção e esquemas fraudulentos. As penas previstas são variadas e não terão apenas o condão de atingir o patrimônio da empresa com multas pesadíssimas, que poderão chegar a 30% do faturamento bruto. O texto legal também terá o objetivo de reparar integralmente o dano causado e de proibir as empresas infratoras de contratar com entes governamentais e de receber ou manter qualquer vínculo com a administração pública. E vai mais longe: a nova lei ainda prevê, através dos mecanismos próprios, a responsabilização judicial da empresa visando o perdimento de bens, direitos e valores envolvidos com a infração, bem como a possibilidade de suspensão ou interdição de suas atividades, podendo chegar à dissolução compulsória da pessoa jurídica. O mais interessante deste ambicioso projeto, está no envolvimento da opinião pública no desfecho do caso, já que a empresa condenada poderá ser obrigada a disponibilizar em sua página na Internet o teor da condenação a que foi submetida, e seu nome poderá ser incluído no cadastro nacional de empresas punidas pela administração pública. E não é só: a empresa poderá, também, ser compelida a arcar com as despesas da publicação extraordinária da decisão condenatória em meios de comunicação de grande circulação nacional. Se considerarmos que não há corrupção sem que haja corruptor, faz muito sentido que esta nova legislação brasileira seja firme o bastante contra as empresas desonestas para demovê-las das práticas atuais e impedir que outras sejam incentivadas a adotar os mesmos expedientes. Agora, o que realmente esta lei trará de relevante, de legado para as novas gerações, será o incentivo às empresas e aos empresários que fazem um esforço hercúleo para manter seus negócios dentro da honestidade, ética e integridade corporativa. Esse compromisso deve unir a sociedade civil organizada, as instituições democráticas e o povo brasileiro, para deixarmos de ser, de uma vez por todas, o eterno país do futuro para nos transformarmos em uma nação forte e séria do presente. Não há como negar, integridade é igual a uma moeda de ouro: tem valor em qualquer lugar. No momento atual em que, finalmente, o Brasil está sendo descoberto pelo mundo, é chegada a hora de nos reinventarmos. Não podemos repetir aquilo que sabemos que dá errado. O Brasil está no caminho certo, mas ainda precisamos mudar pequenas atitudes. Mais do que uma nova lei para punir empresas corruptas, é preciso inventar um novo jeitinho brasileiro que crie a malandragem do bem, na qual este novo malandro não se vanglorie - nem seja adulado pelos outros - por seus golpes e trapaças. Se malandro soubesse como é bom ser honesto, seria honesto só por malandragem.   Leonardo Machado é advogado do escritório Machado Meyer Sendacz Opice (DCI 17.02.2012/Caderno A2) (Notícia na Íntegra)