Tema de audiência pública entre dezembro de 2020 e abril deste ano, o novo marco regulatório dos fundos de investimento no Brasil implementará as inovações trazidas pela Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/19), modernizando a regulação da indústria e aproximando o mercado local das melhores práticas internacionais.

A resolução da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre o tema, que está prestes a ser publicada, traz regras comuns a todos os fundos de investimento e propõe outras específicas a certas categorias de fundos: inicialmente, o fundo de investimento financeiro (nova nomenclatura para fundos focados em investimentos em ações, cambiais, multimercado e em renda fixa) e o fundo de investimento em direitos creditórios (FIDC).

Entre as inovações na regulação do FIDC, destaca-se a possibilidade de rotulá-lo como socioambiental, desde que ele invista preponderantemente em direitos creditórios oriundos de atividades que gerem benefícios socioambientais. A origem desses benefícios também precisa ser verificada por relatório de segunda opinião ou por meio de certificação, em ambos os casos, com base em metodologias reconhecidas internacionalmente para esse fim.

A exigência de uma opinião externa ou certificação sobre a classificação das cotas do FIDC como socioambientais está alinhada com as diretrizes para a emissão de títulos ambientais (green bonds) e sociais (social bonds) emitidas respectivamente pela Climate Bond Initiative e pela International Capital Market Association. Ambos são manuais de boas práticas adotados pelo mercado internacional nessa área e utilizados pelas entidades de segunda opinião e/ou certificação para amparar seus pareceres. O objetivo da inserção dos requisitos para utilização da rotulagem socioambiental é propiciar ao investidor maior segurança com relação a externalidades do seu investimento, por meio da verificação independente atrelada a padrões internacionais.

O requisito é necessário diante do risco de se criarem ativos socioambientais sem critérios claros – o tão temido greenwashing – em razão do crescente interesse dos investidores por ativos relacionados a fatores ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês).

A CVM justificou a rotulagem de um fundo como socioambiental, mirando o fomento do mercado de títulos verdes, para estimular gestores de projetos que ofereçam benefícios socioambientais a procurá-los.

Contudo, essa rotulagem tem potencial de promover também os negócios de impacto – aqueles que visam ao lucro e têm como missão resolver problemas sociais e/ou ambientais, com o compromisso de monitorar seu impacto e performance financeira.

Já os títulos verdes são emitidos no mercado de capitais, cujos recursos são utilizados em projetos com aspectos ambientais positivos, que contribuam substancialmente para a economia de baixo carbono (como usinas eólicas e geração de energia solar), ou projetos atualmente com emissões elevadas, mas que são importantes para migração da economia de alto para baixo carbono, por meio da adoção de práticas mais sustentáveis (setor agrícola ou transportes).

A securitização de direitos creditórios socioambientais é uma grande oportunidade para que os negócios de impacto possam se financiar, proliferar e escalonar sua atuação.

A proposta de regulamentação não deixa claro se seria possível criar FIDCs com foco em créditos exclusivamente ambientais ou exclusivamente sociais. O texto deveria ser mais genérico ao contemplar expressamente a possibilidade de o FIDC Socioambiental adquirir direitos creditórios de cunho exclusivamente social, exclusivamente ambiental ou socioambiental, a fim de abranger todas as atividades desenvolvidas pelos negócios de impacto.

De acordo com recente relatório publicado pela Social Progress Imperative, se continuarmos na tendência atual, os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU – a Agenda 2030 – seriam atingidos apenas em 2082 (2092, considerando os efeitos da pandemia). Os negócios de impacto são importante ferramenta para acelerarmos esse processo.

A maior oferta de produtos financeiros voltados para a economia de baixo carbono e para os negócios de impacto contribui para o crescimento do setor e, consequentemente, para o enfrentamento dos desafios sociais e ambientais do Brasil.