Na esteira da recente publicação do Decreto 11.129/22, que alterou a regulamentação da Lei Anticorrupção, em 25 de julho, a Corregedoria Geral da União (CGU) publicou a Portaria Normativa CGU 19/22, que trouxe regras específicas sobre o julgamento antecipado no âmbito de processos administrativos de responsabilização (PAR) apurados ou avocados pela CGU.

De acordo com a CGU, o julgamento antecipado é um instrumento sancionador negocial, que tem como principal objetivo estimular a cultura de integridade no setor privado, promovendo a célere responsabilização pelos atos lesivos praticados contra a Administração Pública.

O julgamento antecipado tem determinados requisitos e, se aceito pela autoridade, pode conceder benefícios à pessoa jurídica que propõe seu acionamento.

No pedido para julgamento antecipado elaborado pela pessoa jurídica deve constar a admissão da responsabilidade objetiva pela prática dos atos lesivos investigados, acompanhada de provas e relato detalhado do que for de conhecimento.

Além disso, o pedido de antecipação deve conter os compromissos de:

  • ressarcir os danos que tenha dado causa;
  • perder a vantagem auferida (quando for possível estimar);
  • pagar a multa do art. 6º da Lei Anticorrupção;
  • atender a pedidos de informações;
  • não interpor recursos administrativos;
  • dispensar a apresentação de peça de defesa;
  • desistir de ações judiciais relativas ao PAR; e
  • incluir sugestão sobre forma e modo de pagamento das obrigações financeiras (há possibilidade de propor o pagamento parcelado).

No âmbito federal, a CGU, de forma discricionária, pode rejeitar ou concordar com o pedido formulado pela pessoa jurídica. Caso o retorno seja positivo, a autoridade irá elaborar um relatório final, recomendando o julgamento antecipado, que seguirá para julgamento do ministro da CGU, precedido de manifestação jurídica da consultoria jurídica da CGU.

O julgamento antecipado só pode ser utilizado para PARs já instaurados e ainda pendentes de julgamento. Os graus de benefício no valor aplicado da multa variam conforme o momento em que a pessoa jurídica envia sua proposta.

Desse modo, as seguintes atenuações no cálculo da multa podem ser aplicadas:

  • Antes do PAR ser instaurado (no contexto de investigação preliminar) – atenuação de 4,5%
  • Antes da apresentação da defesa escrita – atenuação de 3,5%
  • Antes das alegações finais – atenuação de 2,5%
  • Após as alegações finais – atenuação de 1,5%

O julgamento antecipado tem características muito similares às previstas no acordo de leniência – como admissão da responsabilidade objetiva, entrega de provas e relato detalhado do que for de conhecimento da empresa, além de algumas diferenças destacadas abaixo:

ASSUNTO JULGAMENTO ANTECIPADO ACORDO DE LENIÊNCIA
Disponibilidade Qualquer pessoa jurídica com PAR instaurado e pendente de julgamento Apenas a primeira pessoa jurídica a manifestar seu interesse em cooperar
Assunção de responsabilidade e fornecimento de evidências A pessoa jurídica deve assumir a responsabilidade objetiva e fornecer as informações disponíveis A pessoa jurídica deve assumir a responsabilidade objetiva e tem a obrigação de contribuir com a apuração dos fatos
Benefícios Redução de até 4,5% no cálculo da multa Redução de até 2/3 no cálculo da multa
Impedimento de contratar com o Poder Público Possibilidade de atenuação Possibilidade de não aplicação
Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP) Haverá inscrição no CNEP Não haverá inscrição no CNEP


Diante dessas duas possibilidades, é importante que a pessoa jurídica objeto de alguma investigação preliminar ou de um PAR examine, de acordo com o caso concreto, qual é o caminho mais vantajoso: acordo de leniência, julgamento antecipado ou seguir o fluxo procedimental do PAR.

Essa reflexão se faz necessária pois, considerando que o art. 25, II, a do Decreto 11.129/22 impõe um limite de três vezes o valor da vantagem auferida à multa imposta, em um cenário hipotético de PAR no qual a multa calculada extrapolar esse limite, a atenuação do julgamento antecipado pode ser tornar inócua. Isso porque mesmo sem a incidência da redução do julgamento antecipado, a multa já teria atingido um limite máximo. Nessa hipótese, optando por julgamento antecipado ou por fluxo normal, a multa imposta seria a mesma – o valor de três vezes a vantagem auferida.

Nesse cenário, além da não aplicação de atenuantes, o julgamento antecipado impediria a pessoa jurídica de, na esfera administrativa do PAR e em potencial esfera judicial, discutir os fatos e apresentar sua defesa, já que o julgamento antecipado impõe o compromisso de não interpor recursos e desistir de ações judiciais relacionadas.

Essas ponderações e reflexões são extremamente relevantes para pessoas jurídicas envolvidas em PARs em andamento, pois a portaria normativa estabeleceu prazo de 60 dias para que pessoas jurídicas façam propostas de julgamentos antecipados em PARs já instaurados e ainda não julgados. Considerando que a portaria normativa entre em vigor em 1º de agosto de 2022, o prazo para a propositura, nesses casos específicos, expira em 30 de setembro de 2022.