PPIs do Governo Federal – visão geral

O governo federal anunciou, em março de 2017, o lançamento da nova rodada de concessões do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI). A estimativa é arrecadar em torno de R$ 45 bilhões em investimentos, e os principais alvos são os setores de energia, transporte e saneamento.[1] Ao todo, foram anunciados 35 lotes de transmissão de energia (distribuídos em 17 estados), duas concessões de rodovias, 11 terminais portuários, cinco ferrovias e 14 projetos de saneamento.

Posteriormente, em julho de 2017, o governo anunciou um programa no valor de R$ 11,7 bilhões em linhas de crédito de financiamento e apoio a obras públicas e concessões em estados e municípios na área de infraestrutura. Como no programa anterior, serão considerados prioritários os investimentos em obras nos setores de saneamento, mobilidade urbana, iluminação e gestão de resíduos sólidos.[2] Novamente, em agosto de 2017, o governo anunciou a intenção de vender 14 aeroportos (incluindo o de Congonhas-São Paulo), 11 companhias do setor elétrico (incluindo o sistema Eletrobrás), 15 portos, 2 rodovias, a Casa da Moeda, ente outros ativos importantes.

O principal objetivo do governo com o lançamento desses programas é a superação da crise econômica, que perdurava desde 2014, com redução no PIB brasileiro de 3,8% em 2015 e 3,6% em 2016.[3] A expectativa é financiar as obras por meio de recursos disponibilizados pela Caixa Econômica Federal e pelo Banco do Brasil, valores depositados pelo FGTS e, especialmente, por meio de parcerias firmadas com o setor privado. Por essa razão, ganham destaque os veículos utilizados pelos investidores privados para aportar recursos nesses projetos, sendo o principal deles o Fundo de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE).

O FIP-IE foi criado em 2007 durante o governo Lula, em época de grande incentivo ao desenvolvimento do setor de infraestrutura do país. Dez anos depois, em mais um movimento para desenvolver o setor, a modalidade de FIP voltado para a infraestrutura volta a ganhar relevância, com nova regulamentação pela CVM e vantagens tributárias.

FIP-IE

Os FIPs, veículos utilizados pelos investidores para gerar lucro por meio da compra de valores mobiliários de companhias e sociedades limitadas, são regulamentados de forma geral pela Instrução CVM n° 578, de 30 de agosto de 2016 (ICVM 578). Trata-se de um investimento em renda variável constituído sob a forma de condomínio fechado, cujas cotas somente podem ser resgatadas ao término de sua duração ou se sua liquidação for deliberada em assembleia de cotistas.[4]

Uma das principais exigências da ICVM 578 para que um FIP possa adquirir participação em determinada empresa é que o fundo participe efetivamente do processo decisório da companhia investida, com influência na definição de sua política estratégica e na sua gestão, inclusive por meio da indicação de membros do conselho de administração.

Os critérios de participação no processo decisório da sociedade investida não têm delimitação clara por lei. Ela pode ocorrer de várias formas, como: (i) pela detenção de ações que integrem o respectivo bloco de controle; (ii) pela celebração de acordo de acionistas; ou (iii) pela adoção de procedimento que assegure ao fundo efetiva influência na definição de sua política estratégica e na sua gestão. Não há, portanto, uma regra definida sobre a forma como o FIP deve influenciar no processo decisório da sociedade. Essa verificação é realizada caso a caso.

Além das regras gerais mencionadas, a ICVM 578 refletiu e regulamentou de forma detalhada a criação das diversas categorias específicas de fundo de investimento em participações, como o FIP - Capital Semente, o FIP - Empresas Emergentes, o FIP – Multiestratégia e o FIP-IE. Especificamente em relação ao FIP-IE, a ICVM 578 não inovou, replicando os artigos previstos na antiga Instrução CVM nº 460/2007 (revogada pela ICVM 578) e refletindo as disposições da Lei nº 11.478/2007 (Lei 11.478).

O FIP-IE (juntamente como o FIP - Produção Econômica Intensiva em Pesquisa) foi instituído pela Lei 11.478 e tem como objeto, nos termos da lei, o investimento no território nacional em novos projetos de infraestrutura. Para os fins ali previstos, a lei considera “novos projetos de infraestrutura” aqueles implementados por sociedades especificamente criadas para tal nas áreas de (i) energia; (ii) transporte; (iii) água e saneamento básico; (iv) irrigação e (v) outras áreas tidas como prioritárias pelo Poder Executivo Federal. Os investimentos poderão ser feitos também na expansão de projetos existentes, implantados ou em processo de implantação, desde que os investimentos e os resultados da expansão sejam segregados mediante a constituição de sociedade de propósito específico.

Fica, portanto, evidente a estrita relação entre esse veículo de investimento e o Programa de Parcerias de Investimentos criado pelo governo federal.

Conforme exigência da Lei 11.478, as sociedades de propósito específico ali previstas devem ser necessariamente organizadas como sociedade por ações, de capital aberto ou fechado. Além disso, a lei exige que, no mínimo, 90% do patrimônio do FIP-IE seja aplicado em ações, bônus de subscrição, debêntures, conversíveis ou não em ações, ou outros títulos de emissão das sociedades de propósito específico que investem nos setores mencionados acima. Assim, no máximo 10% da carteira pode ser alocado em outras modalidades de investimento, sempre observados os demais limites previstos na ICVM 578.

O FIP-IE deverá ter um mínimo de cinco cotistas, sendo que cada um deles não poderá deter mais de 40% das cotas emitidas pelo FIP-IE ou auferir rendimento superior a 40% do total de rendimentos do fundo.

Semelhante à ICVM 578, a Lei 11.478 exige que o FIP-IE participe do processo decisório das sociedades investidas com efetiva influência na definição de suas políticas estratégicas e na sua gestão, notadamente por meio da indicação de membros do conselho de administração ou, ainda, pela detenção de ações que integrem o respectivo bloco de controle, pela celebração de acordo de acionistas ou pela celebração de ajuste de natureza diversa ou adoção de procedimento que assegure ao fundo efetiva influência na definição de sua política estratégica e na sua gestão.

Nos termos da mesma lei, os rendimentos auferidos no resgate de cotas do FIP-IE, inclusive quando decorrentes da liquidação do fundo, ficam sujeitos à incidência do imposto sobre a renda na fonte à alíquota de 15% sobre a diferença positiva entre o valor de resgate e o custo de aquisição das cotas. Já no caso da alienação das cotas do FIP-IE, os ganhos auferidos serão tributados: (i) à alíquota 0 (zero), quando auferidos por pessoa física em operações realizadas em bolsa ou fora de bolsa; (ii) como ganho líquido, à alíquota de 15%, quando auferidos por pessoa jurídica em operações realizadas dentro ou fora de bolsa; e (iii) à alíquota 0 (zero), quando pagos a beneficiário residente ou domiciliado no exterior, individual ou coletivo, que realizar operações financeiras no país de acordo com as normas e condições estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional, exceto no caso de residente ou domiciliado em país com tributação favorecida, nos termos do art. 24 da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de 1996. No caso de resgate ou de amortização de cotas por pessoa física, os rendimentos ficam isentos do imposto sobre a renda na fonte e na declaração de ajuste anual das pessoas físicas.

Como se percebe, por meio de vantagens fiscais, o governo federal visa estimular investimentos em projetos de infraestrutura por pessoas físicas (investidores de varejo) e investidores estrangeiros (com a entrada de capital no país).

Até dezembro de 2017 foram registrados apenas 21 FIP-IEs na CVM. Os fundos que ofertaram publicamente suas cotas, no entanto, constituem menos da metade desse número. Apesar da baixa representatividade dos FIPs-IE verificada até então, espera-se um aumento da atividade desse tipo de veículo de investimento em 2018, considerando os relevantes ativos de infraestrutura colocados recentemente no programa de privatização do governo federal. Os FIPs-IE e as debêntures incentivadas de infraestrutura apresentam-se, assim, como alternativas interessantes de captação de recursos privados para a concretização dos programas do governo.


1. http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,temer-diz-que-programa-de-infraestrutura-preve-r-45-bi-em-investimentos,70001690499

2. https://g1.globo.com/economia/noticia/governo-anuncia-programa-de-apoio-as-concessoes-nos-municipios.ghtml

3. Segundo dados do Banco Mundial, disponíveis em: http://databank.worldbank.org/data/reports.aspx?source=2&series=NY.GDP.MKTP.KD.ZG&country=BRA#. Acesso em: 12 de dezembro de 2017.

4. http://www.bmfbovespa.com.br/pt_br/produtos/listados-a-vista-e-derivativos/renda-variavel/fundos-de-investimento-em-participacoes-fip.htm