O governo federal introduziu recentemente mudanças significativas nas alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) aplicáveis às operações de crédito, câmbio e seguro. Essas alterações, anunciadas pelo ministro da Fazenda como uma medida para aumentar a arrecadação, trazem à tona um debate sobre a função real desse tributo, cuja principal finalidade, historicamente, é a regulação dos mercados financeiros e a condução da política econômica, e não a simples arrecadação de recursos.

Elevar as alíquotas para solucionar desafios fiscais e orçamentários evidencia uma mudança questionável de paradigma. De ferramenta de controle e estímulo à estabilidade do sistema financeiro, como previsto na Constituição, o IOF passa a ser um instrumento ostensivamente arrecadatório.

Essa transformação claramente se desvia da essência extrafiscal do IOF, que sempre teve o papel de auxiliar na regulação de operações financeiras, e influenciar comportamentos de agentes econômicos. Gerar receitas nunca foi seu objetivo principal.

Ao se centrar exclusivamente no aspecto arrecadatório, o governo mina a função regulatória que historicamente caracterizou o IOF.

Tradicionalmente, o imposto tinha como objetivo moderar os fluxos financeiros e agir como um termostato para a economia, ajustando os impulsos de crédito e consumo, de acordo com as necessidades do cenário macroeconômico.

Transformar um instrumento que operava com base em diretrizes de política monetária em um mecanismo de arrecadação cria uma tensão entre os objetivos de estabilidade e as demandas por receita imediata.

Uma das consequências mais importantes desse desvio são os impactos na previsibilidade e segurança jurídica. A alteração abrupta das alíquotas é uma quebra do princípio da anterioridade tributária, um pilar que garante ao contribuinte conhecer previamente mudanças importantes na cobrança dos tributos. Pela Constituição Federal, o IOF está dispensado de se submeter ao princípio da anterioridade, mas apenas e nos limites de sua função extrafiscal.

Essa situação levanta sérias preocupações sobre a constitucionalidade da medida. Alterações de natureza tão marcante demandam observância rigorosa dos princípios constitucionais, entre os quais se destaca justamente o da anterioridade tributária, essencial para a previsibilidade e transparência na cobrança de tributos.

Vale ressaltar que, embora a Constituição Federal dispense o IOF de seguir o princípio geral da anterioridade, essa dispensa se restringe aos limites que garantem sua função regulatória, preservando o equilíbrio entre intervenção econômica e respeito ao ordenamento constitucional.

Portanto, a decisão de elevar as alíquotas do IOF na forma e sob a justificativa apresentada pelo governo representa mais do que uma simples falha técnica: trata-se de uma desvirtuação da função do tributo, que, ao priorizar a arrecadação, pode prejudicar seu caráter regulatório e extrafiscal e acaba por violar a Constituição Federal por vício de motivação.

Não se nega que os ajustes fiscais almejados pelo governo federal são importantes e necessários, mas é preciso respeitar a Constituição Federal e buscar soluções que, sem comprometer a estabilidade do mercado e do sistema jurídico, atendam às demandas de ajustes orçamentários do Estado.