O Governo Federal anunciou recentemente o Programa de Investimentos em Logística, que prevê investimentos privados em rodovias e ferrovias da ordem de R$ 133 bilhões nos próximos 25 anos. A iniciativa é louvável e foi recebida com entusiasmo pelo setor empresarial e pela sociedade civil em geral, que reconhecem na precariedade da infraestrutura do país um dos principais elementos que contribuem para o “custo Brasil”.O Programa anunciado ainda pende de regulamentação, mas já se antecipou que o objetivo é estruturar significativa parcela dos projetos por meio das Parcerias Público-Privadas (PPPs). Ao fazê-lo, o Governo Federal afasta-se de modelo baseado exclusivamente nas privatizações e passa a repartir com o setor privado a tarefa de desatar o nó logístico, valendo-se de modelo que já vem sendo adotado no Brasil em outros setores nos quais as tarifas cobradas do usuário não se mostram suficientes para a cobertura dos investimentos necessários. Delineadas inicialmente no direito inglês e adotadas em grande escala em toda a Europa, as PPPs são acertos contratuais nos quais Poder Público e particular distribuem responsabilidades, direitos e obrigações visando ao desenvolvimento de atividades de interesse público. Na Europa, o êxito das PPPs tem como maior símbolo a construção do túnel sob o Canal da Mancha, em projeto de cerca de 6 bilhões de dólares.Diferentemente dos modelos de privatização e concessão, em que o Poder Público transfere integralmente os direitos e deveres relativos à exploração da atividade ao interessado que oferecer o maior ágio na concessão ou se comprometer quanto à menor tarifa ao usuário final, nas PPPs o Poder Público participa do risco de implementação do projeto, por meio das chamadas contraprestações públicas, que podem envolver a entrega de dinheiro ou outros ativos ao particular, como forma de equalizar os altos custos de implementação do projeto frente às receitas tarifárias auferidas a partir da exploração da atividade. No Brasil, as PPPs foram inseridas em 2004 pela Lei nº 11.079. Desde então, um considerável número de projetos foi e é desenvolvido com base em PPPs. Porém, o interesse do setor privado por esta ferramenta poderá ser muito maior caso o Estado adote medidas para garantir segurança jurídica quanto ao tratamento tributário aplicável à contraprestação entregue pelo Poder Público ao particular.É certo que a parcela da atividade lucrativa desenvolvida pelo parceiro privado no contexto das PPPs deve ser tributada de maneira compatível com os demais setores da economia, mas deve-se buscar uma neutralidade tributária em relação à contraprestação entregue pelo Poder Público para o desenvolvimento do projeto. A incidência de tributos sobre a parcela do investimento transmitida pelo Poder Público ao parceiro privado desvirtuaria os objetivos das PPPs, já que resultaria em considerável aumento dos custos do projeto, que seriam em última análise repassados à população por meio das tarifas.Um importante passo nesse sentido foi dado com a publicação recente da Medida Provisória nº 575 (MP), que inseriu mais uma alternativa para a estruturação jurídica da participação pública nas PPPs ao criar a figura do aporte de recursos.Até a edição da MP, havia incerteza quanto à forma de reconhecimento das receitas relativas à contraprestação pública em PPPs para fins fiscais. Como grande parcela da contraprestação era entregue ao parceiro logo depois de concluída a obra de infraestrutura, havia um descasamento entre o reconhecimento dessas receitas para fins fiscais em contraposição às respectivas despesas, que eram levadas a resultado de forma diferida no prazo do contrato de PPP.A MP alterou esse cenário ao permitir que o aporte seja inicialmente excluído da base de cálculo do IRPJ, da CSLL, do PIS e da COFINS, determinando-se que esse valor seja tributado na medida em que os custos forem realizados. De acordo com a exposição de motivos da MP, o objetivo é mitigar os efeitos da impossibilidade contábil de compatibilizar o momento de recebimento das receitas oriundas da contraprestação pelo particular e o reconhecimento dos custos incorridos no projeto.Trata-se de inegável avanço do Governo Federal, mas há melhorias que podem ser introduzidas na MP e que devem ser debatidas com a sociedade civil durante o seu trâmite no Congresso Nacional. As principais questões estão relacionadas aos impactos para PIS e COFINS, já que não há indicação quanto à natureza jurídica do aporte para a determinação do regime de apuração aplicável (cumulativo ou não cumulativo), o que é especialmente importante em projetos de transporte, nem quanto à forma de apropriação dos respectivos créditos dessas contribuições.O desafio de se compatibilizar a arrecadação de tributos com o necessário incentivo do Poder Público ao setor privado para a assunção de riscos no contexto do Pacote de Logística é grande. A edição da MP, porém, indica que os primeiros passos foram tomados para enfrentar tal desafio.Fernando Colucci e Fernando Tonanni, sócios do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados (Britcham Brasil - Resenha Legal | Outubro de 2012)(Notícia na Íntegra)