Por Camila Galvão
Por Diogo Martins Teixeira
A Receita Federal do Brasil publicou a Solução de Consulta COSIT nº 102/2016, na qual foi analisada a caracterização de operação de importação por encomenda.
A importação por encomenda é aquela em que uma pessoa jurídica importa produtos, adquirindo-os com recursos próprios, a fim de revendê-los a uma empresa encomendante previamente determinada, em razão de contrato prévio firmado entre as partes.
Além de reafirmar o conceito geral da importação por encomenda, a Solução de Consulta também esclareceu que tal modalidade de importação não é exclusiva para empresas constituídas na forma de Trading Company e qualquer pessoa jurídica pode executá-la.
Entretanto, a questão mais relevante suscitada se refere à caracterização de importação por encomenda quando determinada empresa brasileira recebe um pedido de compra de determinado produto que não possui em estoque, importando-o para fornecimento ao seu cliente.
Aparentemente a consulente é uma empresa comercial não especializada em operações de comércio exterior, que eventualmente pode receber pedidos de compra em momentos em que não dispõe de estoque para fornecimento imediato. Assim, a empresa pode importar tais produtos para fornecer ao seu cliente.
Nesse caso, a Receita Federal concluiu que a empresa fornecedora se caracteriza como importadora por encomenda por ter importado os produtos para cumprir o contrato previamente estabelecido.
Ou seja, na Solução de Consulta entendeu-se estar diante de uma importação por encomenda numa situação em que a empresa importadora não recebeu exatamente uma encomenda para importar um produto específico, mas simplesmente recebeu uma encomenda para fornecer um produto, sem especificação sobre se ele deveria ser importado ou não, nem especificações sobre as condições da importação.
Entendemos que a interpretação refletida na Solução de Consulta ampliou demasiadamente o conceito de importação por encomenda, atingindo situações não abarcadas pela letra da lei, na nossa visão.
Basicamente, entendemos que a ′′importação por encomenda′′ abarca situações em que de fato há uma encomenda para importar com as especificações para tanto, e não uma simples encomenda de produto, em que a empresa fornecedora pode escolher se vai importar ou não.
E a interpretação extensiva trazida pela Solução de Consulta pode ter reflexos bastante amplos.
Podem ser afetadas, por exemplo, empresas que tenham contratos de fornecimento por prazo determinado, as quais podem tanto importar como adquirir os produtos no mercado interno, a depender das condições de mercado (como câmbio, tarifas de importação, prazos de entrega, etc).
Nesses casos, embora a natureza essencial do contrato entre as empresas no Brasil não envolva propriamente a encomenda para importar, a Receita Federal pode entender que o mero fato de o produto ter sido importado já caracteriza a operação como de importação por encomenda.
Isso pode causar importantes consequências para ambas as empresas, pois as sujeita a todas as obrigações típicas de tal regime de operação, como a obtenção de habilitação no SISCOMEX (RADAR), vinculação de CNPJs, preenchimento específico das Declarações de Importação, entre outras.
Além disso, ainda podem haver efeitos tributários como a equiparação da encomendante a industrial para fins do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Assim, a empresa adquirente deverá apurar o IPI nas suas operações de revenda, aumentando sua carga tributária.
O fiel cumprimento das obrigações típicas às essas operações é muito importante, pois a Receita Federal pode entender que sua inobservância caracteriza ocultação do real adquirente do produto, o que pode ensejar, nos casos mais extremos, no perdimento deste (ou aplicação de multa igual ao valor aduaneiro). Eventualmente, pode-se entender tratar-se apenas de informação inexata, sujeitando a importadora a multa de um por cento sobre o valor aduaneiro da mercadoria.
Ou seja, relevantes as consequências da caracterização da importação por encomenda. Empresas que não estariam sujeitas a tais consequências na interpretação mais estrita da lei, a qual entendemos mais apropriada, estarão na interpretação abrangente trazida na Solução de Consulta em comento.
Além disso, se a empresa adquirente realizar eventuais adiantamentos ao seu fornecedor (importadora), o Fisco pode entender que a natureza da operação é de ´importação por conta e ordem de terceiros´, onde o regime tributário é diferente, as obrigações acessórias são mais complexas e em alguns casos pode haver a imposição de sanções administrativas seríssimas.
Entendemos que a conclusão adotada pela Receita Federal é questionável do ponto de vista técnico/jurídico e é importante que as empresas estejam preparadas para eventuais fiscalizações, pois a observância do conceito estabelecido na Solução de Consulta é vinculante às autoridades fiscais/aduaneiras, o que pode ensejar o aumento autuações sobre a matéria, com impactos bastante expressivos.
(Jota-Br - 06.10.2016)
(Notícia na íntegra)