A nova onda de migrações de empresas para o Novo Mercado é positiva tanto para controladores, como para minoritários, avaliam especialistas ouvidos pelo Valor.

Mesmo quando a migração parece ser feita por controladores em busca de uma porta de saída - caso do BNDES e da AES na Eletropaulo -, ou com uma proporção de conversão de preferenciais em ordinárias considerada desfavorável - a exemplo da Alpargatas, que propõe converter PN em ON à proporção de 1,3 para 1 - a melhora de governança é tida sempre como favorável para os acionistas e a companhia no longo prazo.

"É uma movimentação benéfica para todo mundo, para as companhias têm duas questões: podem melhorar governança, o que é importante nessa época em que estamos vivendo, em que o público exige transparência", avalia Adriana Pallis, sócia da área societária do escritório de advocacia Machado Meyer.

"Outra vantagem para as empresas é que essa transparência dá uma condição melhor para obter recursos no mercado de capitais", completa. Segundo a advogada, o atual momento do mercado, com o retorno das emissões de ações e de dívida, é um dos fatores que explicam o movimento de migrações.

A visão é compartilhada por Joaquim Oliveira, sócio do Souza, Cescon, Barrieu & Flesch Advogados. "Tínhamos uma situação curiosa nos últimos anos, com a grande maioria das novas ofertas de ações, principalmente a partir de 2007, feitas no Novo Mercado. Ainda assim, grandes empresas abertas, por terem estruturas originalmente divididas em ON e PN, estavam foram desse movimento", observa o advogado.

Conforme Oliveira, a unificação de ações em ordinárias, por ocasião da migração ao Novo Mercado, dá aos detentores de ON uma opção de liquidez via bolsa, daí muitas vezes o interesse de migrar do controlador, em busca de uma porta de saída. "Mas o aumento de liquidez e a geração de valor têm efeito positivo também para minoritários preferencialistas", pondera.

Marcelo Mesquita, sócio da gestora Leblon Equities, gostaria que todas as empresas da bolsa tivessem uma única classe de ações. "Hoje você tem o controlador, o minoritário de ON, o minoritário de PN, são três bolsões de liquidez", diz o investidor.
Segundo Mesquita, está cada vez mais difícil para as empresas justificarem estar fora do Novo Mercado. "Tenho a impressão que, com o tempo, mais e mais pessoas e gestores têm percebido que o custo de capital é muito mais baixo se a empresa esta no Novo Mercado", afirma.

O professor Dalton Sardenberg, da Fundação Dom Cabral, acredita, no entanto, que a migração ao segmento deve ser a consequência de um processo e não um fim em si. "A empresa não deveria ver os requisitos e cumprir, o importante é adotar as principais práticas de governança porque acredita que são diferenciais, daí estar pronta para ir ao Novo Mercado", diz.

Proposta de reforma do Novo Mercado está em andamento na B3, atualmente em fase de audiência restrita

Constatadas as diversas vantagens propiciadas pela criação do segmento especial de listagem, o estudo inédito do CFA, obtido em primeira mão pelo Valor, analisa a proposta de reforma do Novo Mercado. O processo está em andamento na B3, atualmente em fase de audiência restrita, com votação pelas companhias prevista para junho e entrada em vigor esperada para 2018.

"Parece não haver um objetivo de continuar a melhorar, não há ambição de elevar a governança ao próximo patamar, em termos de regras mais justas para o investidor brasileiro sentir-se um investidor que tem direitos e que sua opinião interessa", afirma Pedro Matos, autor da pesquisa, que será lançada em 9 de maio, em evento em São Paulo.

A reforma atual traz como principais propostas de mudança o estabelecimento de um quórum mínimo de um terço dos minoritários para saída do Novo Mercado; a realização de oferta pública (OPA) a todos os acionistas caso um comprador adquira 30% -ou possivelmente 20% - da empresa; pelos menos 20% ou dois conselheiros independentes; a divulgação de remuneração mínima, média e máxima dos administradores, entre outras.

O pesquisador vê como positivo o fato da reforma atual não aliviar o princípio de "uma ação, um voto" do Novo Mercado, apesar das pressões no Brasil e no mundo. Por outro lado, avalia que as propostas não fecham lacunas que têm permitido uma multiplicação na prática das classes de ações - ele cita, como exemplo, a criação das "super preferenciais" pelas aéreas Gol e Azul.

Outros pontos não endereçados pela reforma, na visão de Matos, são a ampla adoção de cláusulas de "poison pill" (mecanismo de proteção à dispersão acionária, que dificulta a aquisição hostil de uma companhia) por empresas do Novo Mercado; o reduzido número de membros do conselho de administração e de conselheiros independentes, em relação aos padrões internacionais; e a limitada divulgação da remuneração da administração.

A bolsa responde às críticas argumentando que as propostas atuais trazem sim avanços, mas que outros itens ainda precisam de maior discussão para avançar. "Sabemos que não é a última vez que vamos fazer isso, não tínhamos a ilusão de que conseguiríamos esgotar toda a discussão num único processo de revisão", afirma Flavia Mouta, diretora de regulação de emissores da B3.

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