Novas exigências, em volume tão significativo, talvez merecessem mais tempo para que o mercado as absorvesse.
Adriana Pallis Romano, especial para o iG
Talvez, nos últimos anos, poucas normas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tenham sido tão polêmicas e discutidas como a Instrução 480, editada em 07 de dezembro de 2009.
Desde a sua edição, em dezembro, a regra tem causado inquietação nas companhias abertas e no mercado. Isso porque a Instrução regulamenta um novo formato para a divulgação das informações periódicas das companhias abertas (Formulário de Referência), em substituição ao formulário de Informações Anuais (IAN) e exige um número maior de informações, não apenas quantitativamente, mas qualitativamente.
A ideia é que o Formulário de Referência sirva como um “prospecto permanente”. Por ocasião de uma emissão, a empresa deverá apresentar apenas informações sobre aquela operação.
As informações até então exigidas no IAN eram mais superficiais e menos detalhadas.
A Instrução 480 tornou obrigatória a divulgação de determinadas informações que até então não eram públicas, como por exemplo, a remuneração dos administradores (divisão entre parcelas fixas e variáveis, valores individuais do maior e do menor salários) e dos auditores independentes. A questão da remuneração causou questionamentos das empresas e até uma ação judicial contra a CVM, que está sendo discutida em juízo pelo Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Rio de Janeiro (IBEF-Rio).
Além desse item, as companhias devem agora divulgar a política de transações com partes relacionadas, incluindo os dados de cada operação e as medidas para evitar conflitos de interesse e demonstrar que as operações foram negociadas de forma justa. Outro item “famoso” é o 10, que exige os comentários dos administradores a itens que não aparecem nas demonstrações financeiras (off-balance sheets items), bem como a descrição da utilização dos recursos resultantes da oferta (para as companhias que realizaram captações públicas nos três últimos exercícios).
Mas novas exigências, em volume tão significativo, talvez merecessem mais tempo para que o mercado as absorvesse e para que as companhias pudessem cumprir a contento, bem como para que a própria CVM pudesse receber as informações com mais calma e de maneira mais ordenada. O próprio sistema eletrônico da CVM para envio dessas informações ainda não foi disponibilizado, o que fez com que a CVM prorrogasse a entrega do Formulário para o próximo dia 30 de junho, visando facilitar o envio das informações e o exame delas pelo mercado e pela própria CVM, já que o formato será padronizado. Por enquanto, as empresas que já entregaram o Formulário, fizeram em formato de texto e seguindo os itens da própria Instrução 480.
Criticam-se as companhias, acusando-as de usarem textos muito parecidos, por fornecerem informações superficiais; por outro lado, as companhias se queixam de serem obrigadas a divulgar publicamente informações que poderiam de alguma forma prejudicá-las ou de a CVM não se contentar com as informações divulgadas.
Fato é que, logo após a edição da Instrução, diversas empresas tiveram de entregar as informações exigidas pela Instrução, antecipando a divulgação por terem emitido valores mobiliários (ações, debêntures, etc.) e, mesmo com as orientações publicadas pela própria CVM, alguns dos itens do Formulário de Referência que tiveram de ser entregues antes da realização das assembléias gerais exigiram um maior grau de transparência que até então não era exigido. Isso tudo, num período já repleto de outros preparativos e preocupações que antecedem esse encontro anual dos acionistas.
A verdade é que não se pode julgar o certo e o errado num momento de adaptação. Tanto as companhias precisam se preparar melhor para divulgar informações mais detalhadas, como a CVM e o mercado precisam se adaptar e adequar suas expectativas em relação a essas informações. É importante analisar os primeiros efeitos e resultados da nova regulamentação para que melhorias possam ser implementadas e até exigidas no próximo ano.
* Adriana Pallis Romano é advogada especialista na área societária e sócia do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice
(iG Economia - http://economia.ig.com.br 31.05.2010)
(Notícia na íntegra)