A arbitragem tem se consolidado como um método alternativo eficaz para a resolução de conflitos, especialmente em contratos de trabalho de executivos e profissionais com remuneração alta. Esse mecanismo oferece agilidade, confidencialidade e segurança jurídica para as empresas, desde que seja implementado de maneira adequada.

A adoção da arbitragem, porém, requer uma atenção especial à legislação trabalhista, pois sua aplicação inadequada pode resultar em grandes passivos e prejudicar a reputação da organização.

Quando a arbitragem é permitida e como aplicá-la corretamente

A arbitragem é um método alternativo de resolução de conflitos, regulado pela Lei 9.307/96, que permite às partes submeterem litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis à decisão de um ou mais árbitros, em vez de usar a jurisdição estatal.

No contexto trabalhista, a arbitragem era restrita aos dissídios coletivos (artigo 114, parágrafo 2º, da Constituição Federal). Entretanto, com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/17), foi inserido o artigo 507-A na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que permitiu incluir cláusula compromissória de arbitragem em contratos individuais de trabalho, desde que observados requisitos específicos:

  • Remuneração. A cláusula compromissória de arbitragem só pode ser pactuada em contratos individuais de trabalho de profissionais cuja remuneração seja superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Em valores atuais, isso significa salários acima de aproximadamente R$ 16 mil. O valor deve ser atualizado com base em duas vezes o teto do benefício do INSS em vigor.[1]
  • Iniciativa ou concordância expressa do empregado. A inclusão da cláusula compromissória deve ser feita por iniciativa do empregado ou com sua concordância expressa, registrada por escrito, com assinatura específica para essa cláusula. Não se admite a imposição unilateral pelo empregador.
  • Direitos patrimoniais disponíveis. Apenas questões relativas a direitos patrimoniais disponíveis podem ser submetidas à arbitragem. Direitos indisponíveis, como aqueles de natureza alimentar ou de proteção mínima ao trabalhador, não podem ser objeto de arbitragem.
  • Capacidade civil plena. Apenas trabalhadores plenamente capazes podem optar pela arbitragem.

Esses requisitos visam garantir que apenas profissionais com maior poder de negociação e capacidade de compreensão dos efeitos da arbitragem possam optar por esse meio. Dessa forma, reduz-se o risco de abuso devido à hipossuficiência do trabalhador.

Recomenda-se que a cláusula compromissória seja redigida em documento anexo ou em negrito, com assinatura ou visto específico, para garantir a transparência e a manifestação inequívoca da vontade do empregado.

Importância da credibilidade e qualificação da câmara arbitral

Ao optar pela arbitragem em contratos de trabalho, é fundamental que as partes escolham uma câmara arbitral de reconhecida credibilidade e qualificação. Muitas entidades se autodenominam “juízo arbitral”, o que é incorreto, pois a arbitragem não substitui o Poder Judiciário. Ela, na verdade, oferece um meio alternativo de resolução de conflitos para direitos patrimoniais disponíveis, desde que respeitados os requisitos legais.

A escolha de uma câmara idônea é essencial para garantir a imparcialidade, a observância dos princípios do contraditório e da igualdade entre as partes, além de assegurar que o procedimento será conduzido por árbitros qualificados e experientes.

A reputação da câmara arbitral exerce um impacto direto na segurança jurídica do procedimento e na validade da sentença arbitral.

Câmaras que carecem de credibilidade ou que não observam rigorosamente a legislação podem expor as partes a riscos de nulidade do procedimento, anulação da sentença arbitral e até mesmo condenações judiciais, como já reconhecido pela Justiça do Trabalho em casos de arbitragem irregular.

Por isso, é altamente recomendado que empregadores e empregados verifiquem o histórico, a transparência, a qualificação dos árbitros e a conformidade da câmara com as normas legais, antes de firmar qualquer compromisso arbitral. A escolha criteriosa da instituição é um passo indispensável para garantir a efetividade, a lisura e a segurança do processo arbitral nas relações de trabalho.

Vantagens da cláusula arbitral nos contratos de trabalho

A inclusão da cláusula compromissória de arbitragem em contratos de trabalho, quando observados rigorosamente os requisitos legais, pode trazer benefícios relevantes tanto para empregadores quanto para empregados. Entre as principais vantagens, destacam-se:

  • Celeridade na resolução de conflitos. A arbitragem é reconhecida por proporcionar uma solução mais rápida para controvérsias decorrentes da relação de trabalho ou de emprego, em comparação com o trâmite tradicional na Justiça do Trabalho. O procedimento arbitral tende a ser menos burocrático, permitindo que as partes obtenham uma decisão definitiva em prazo reduzido, o que é especialmente vantajoso em disputas que envolvem valores elevados ou questões complexas.
  • Especialização dos árbitros. As partes podem escolher árbitros com conhecimento técnico e experiência específica na matéria em discussão, o que contribui para decisões mais qualificadas e adequadas à realidade do setor ou da relação de trabalho ou de emprego em questão. Essa especialização pode ser determinante para a correta apreciação de temas sensíveis, aumentando a confiança na imparcialidade e a qualidade da decisão arbitral. Com isso, reduz-se a sensação de injustiça que, por vezes, é associada a decisões proferidas pela Justiça do Trabalho, especialmente em casos envolvendo altos executivos e relações contratuais complexas.
  • Confidencialidade. Diferentemente dos processos judiciais que, em geral, são públicos, a arbitragem permite que as partes mantenham a confidencialidade sobre o conflito, os termos do acordo e a decisão final. Essa característica é especialmente importante para empresas e profissionais que desejam preservar sua imagem, estratégias de negócio e informações sensíveis.
  • Autonomia das partes. A arbitragem valoriza a autonomia da vontade das partes, permitindo que elas definam, de comum acordo, regras procedimentais, local da arbitragem, idioma e até mesmo o perfil dos árbitros. Essa flexibilidade contribui para um ambiente de maior cooperação e para soluções mais alinhadas aos interesses de ambas.
  • Decisão com força de título executivo. A sentença arbitral tem força de título executivo judicial, o que significa que pode ser executada diretamente, conferindo efetividade à decisão e reduzindo o risco de prolongamento do litígio.
  • Redução de passivos e insegurança jurídica. Quando utilizada de forma regular e em conformidade com a legislação, a arbitragem pode contribuir para a redução de passivos trabalhistas e para a previsibilidade dos custos e riscos envolvidos em eventuais disputas, favorecendo a gestão estratégica de recursos humanos e a sustentabilidade do negócio.

A arbitragem, portanto, quando utilizada dentro dos limites legais, pode ser uma ferramenta valiosa para a resolução eficiente e qualificada de conflitos trabalhistas em contratos individuais de trabalho.

O que acontece quando a arbitragem é aplicada de forma incorreta?

A experiência recente dos tribunais trabalhistas revela que a adoção da arbitragem sem a devida cautela pode acarretar consequências indesejáveis para as empresas.

Desconsiderar os requisitos legais pode levar as empresas a serem condenadas a pagar indenizações por danos morais coletivos e proibidas de usar a arbitragem, além de haver o risco de as cláusulas de arbitragem serem declaradas nulas.

O entendimento predominante na Justiça do Trabalho é que a arbitragem só é válida quando todos os requisitos legais são rigorosamente respeitados, sob pena de ser considerada fraude à legislação trabalhista e violação do direito de acesso à Justiça.[2]

Esses precedentes mostram que a tentativa de aplicar a arbitragem de forma indiscriminada, especialmente em contratos de trabalhadores que não se enquadram nos critérios legais, pode gerar um passivo trabalhista significativo, capaz, inclusive, de afetar a imagem da empresa no mercado.

O fundamento dessas decisões está na proteção do trabalhador – em geral, a parte hipossuficiente na relação de emprego – e na garantia do acesso à jurisdição estatal (artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal).

A tentativa de afastar a competência da Justiça do Trabalho por meio de arbitragem compulsória é considerada fraude à legislação trabalhista e afronta ao princípio da inafastabilidade da jurisdição.

Além disso, a Lei de Arbitragem prevê que a sentença arbitral só é válida se respeitados os princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e da livre manifestação de vontade. Caso contrário, a sentença arbitral pode ser anulada judicialmente (parágrafo 2º do artigo 21 e artigo 32 da Lei 9.307/96).

A importância de um contrato bem elaborado

A elaboração cuidadosa do contrato de trabalho é o primeiro passo para garantir a segurança jurídica da empresa. Um contrato bem estruturado, com cláusulas claras e em conformidade com a legislação, não apenas previne litígios, mas também maximiza os benefícios da arbitragem.

Para as empresas que desejam adotar esse mecanismo, é essencial contar com assessoria especializada, capaz de analisar o perfil dos profissionais, redigir cláusulas personalizadas e orientar sobre os procedimentos adequados.

Além disso, a assessoria jurídica pode sugerir alternativas seguras para situações em que a arbitragem não é recomendada, como, por exemplo, o acordo extrajudicial homologado pela Justiça do Trabalho. Essa opção também proporciona segurança e quitação geral do contrato, desde que os requisitos legais sejam rigorosamente observados.

Ao considerar essas estratégias, a empresa não apenas se resguarda de possíveis passivos, mas também se prepara para explorar soluções eficazes e vantajosas.

Conclusão

A implementação da arbitragem em contratos de trabalho é uma decisão estratégica que pode trazer vantagens para a empresa, mas exige conhecimento técnico e atenção aos detalhes. Erros na redação da cláusula ou a escolha inadequada do perfil dos profissionais pode transformar uma oportunidade em um grande problema.

A correta compreensão e aplicação dos institutos da arbitragem, portanto, são indispensáveis para a conformidade legal, a boa-fé nas relações laborais e a construção de um ambiente empresarial mais seguro. Investir em assessoria especializada e em práticas alinhadas à legislação é o caminho para evitar passivos trabalhistas e fortalecer a reputação da empresa no mercado.


[1] O valor do teto do INSS em vigor em 1º de julho de 2025 é R$ 8.157,41.

[2] TST - RR: 10000462120215020271, relator: José Roberto Freire Pimenta; data de julgamento: 30/04/2025; 3ª Turma; data de publicação: 13/05/2025.

TST - RRAg: 1000849-64.2015.5 .02.0610, relator.: Augusto César Leite De Carvalho; data de julgamento: 08/05/2024; 6ª Turma; data de publicação: 10/05/2024.

TRT-3 - RO: 00100293320205030024 MG 0010029-33 .2020.5.03.0024; relator: Paula Oliveira Cantelli; data de julgamento: 08/09/2021; 4ª Turma; data de publicação: 10/09/2021.